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As imagens do ginasta brasileiro Diego Hypólito, bicampeão mundial, aos prantos em Pequim após cair na disputa final no solo correram o mundo. Mais do que ilustrar o gosto amargo da derrota, elas evidenciam o erro de menosprezar os aspectos emocionais em uma disputa olímpica. "Nunca houve tanto investimento. Tivemos estrutura, condições de treinamento adequadas e oportunidades para disputar as melhores competições do mundo. A ausência de bons resultados está ligada a fatores psicológicos", disse à ISTOÉ a chefe da equipe de ginástica do Brasil, Eliane Martins. Na China, sob seu comando, estiveram nove atletas, três favoritos ao pódio: o próprio Diego, Jade Barbosa e Daiane dos Santos. Nas finais, eles se apresentaram nervosos e fracassaram. "São atletas experientes, estavam tecnicamente preparados e mostraram desequilíbrio emocional na hora da disputa e na reação à derrota", diz Eliane.

Diego derramou lágrimas antes mesmo de deixar o tablado. Balbuciando diante da imprensa, pediu desculpas. "Foi uma reação anormal para um atleta acostumado a estádios lotados. Em ginástica se ganha ou se perde. Nem sequer existe empate. E errar um movimento faz parte do jogo", disse Eliane. Como sempre, também na China favoritos de diversas modalidades e nacionalidades não chegaram aos pódios. Expressaram tristeza e decepção. Muitos até choraram, mas não de forma compulsiva e implorando perdão.

Campeã de salto na copa do mundo na Rússia e medalha de bronze no Pan do Rio de Janeiro, Jade Barbosa mostrou nervosismo antes mesmo de a Olimpíada começar. Ao desembarcar na China, chorou diante do assédio dos jornalistas. "A Jade sentiu o peso da responsabilidade e ficou abalada", afirmou Eliane. "Preciso trabalhar melhor minha cabeça para enfrentar a pressão de disputar como favorita. Fiquei muito nervosa e isso atrapalhou", admitiu ela. Mesmo a experiente Daiane dos Santos se apresentou tensa e ultrapassou os limites do tablado, como em Atenas em 2004.

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"Ainda não concluímos a análise sobre os Jogos de Pequim, mas é evidente que nas próximas disputas precisamos considerar a possibilidade de trazer psicólogos", diz o chefe da delegação brasileira na China, Marcus Vinícius Freire. Equipes de ponta como a chinesa, a americana e a alemã não abrem mão de psicólogos em suas seleções. No Brasil, durante a preparação, praticamente todos os atletas contaram com orientação psicológica, mas não em Pequim. No caso da ginástica, Eliane admite que foi um erro deixar a psicóloga Ruth Paula no Brasil. Em Curitiba, principal centro de treinamento dos ginastas, ela faz um acompanhamento sistemático dos atletas. "Achamos que seria dispensável a presença da Ruth nos Jogos, mas erramos", disse.

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O desequilíbrio emocional de atletas brasileiros na China não se restringe aos ginastas. A saltadora Fabiana Murer ficou muito abalada quando uma de suas varas não foi encontrada na hora da final. Decidiu saltar com uma vara inapropriada, errou, perdeu o pódio e chorou. Terminada a disputa disse: "Não volto mais para a China." Também Renata, da dupla de vôlei de praia com Talita, mostrou descontrole após a derrota para as chinesas, que lhe tirou a chance do bronze.
 

"A gente não jogou bem, poderia ter sido muito melhor", lamentou, aos prantos. Jadel Gregório, do salto triplo, caiu em lágrimas ao fracassar e mostrou- se decepcionado por ter conseguido apenas o sexto lugar na prova realizada na quinta-feira 21. "Não sei o que deu errado. Trabalhei o ano todo, me sacrifiquei, mas o resultado não veio", disse Jadel. Quinto colocado em Atenas, não imaginava que sua participação em Pequim, onde também era favorito, poderia ser pior. Até no hipismo o Brasil fracassou. Desde 1996, o cavaleiro Rodrigo Pessoa obtinha medalhas. Desta vez, ficou sem pódio.

A única psicóloga brasileira em Pequim era Samia Hallage, do vôlei feminino. Mesmo assim, sua presença se deveu ao empenho das jogadoras. O presidente da Confederação Brasileira de Vôlei, Ary Graça, resistiu até o limite. "O fato de a psicóloga estar presente durante a Olimpíada não altera nada. O trabalho dela já foi feito", disse Graça dois dias antes de a delegação embarcar para a China. Ele só cedeu porque Fabiana, Paula Pequeno e Mari insistiram e ganharam o apoio do técnico José Roberto Guimarães. "Ela (Samia) tem sido decisiva. Orienta as meninas, é amiga delas e ainda me instrui sobre a melhor maneira de lidar com cada uma", disse Guimarães à ISTOÉ. "Acredito que nossa presença na China foi importante para mantê-las unidas e focadas no objetivo principal", disse Samia. Mesmo com o sucesso do vôlei feminino em Pequim, o chefe da equipe brasileira, José Elias, tratava a presença da psicóloga com certo descaso. "A vinda dela não era prioridade, mas sobrou um lugar e resolvemos trazê-la", disse.

É evidente que o Brasil não conquistou todas as medalhas esperadas pelo Comitê Olímpico. O importante é que nas próximas competições o resultado de Pequim seja considerado e provoque mudanças. "Agora já temos dinheiro suficiente, mas o Brasil precisa efetivamente elaborar uma política para os esportes, o que não se resume em distribuir recursos", sugere Eliane, que promete levar a psicóloga nas próximas competições.
 


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