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MARMELADA
Alonso e Massa após a corrida do domingo 25: o piloto brasileiro
decepcionou os fãs ao abrir passagem para o companheiro de equipe

Paulista de 29 anos, o piloto de Fórmula 1 Felipe Massa possui em seu currículo 11 vitórias, 30 pódios e um vice-campeonato, em 2008. Naquele ano, guiando uma possante Ferrari, perdeu o título na última curva de Interlagos, apesar de vencer a prova para delírio dos fãs na arquibancada. Perdeu disputando, fazendo bonito, como se diz no automobilismo. A derrota, porém, nunca lhe caiu bem. Demonstrava a garra de campeão e por isso alimentava o espírito patriota plantado no coração do povo com competência por Ayrton Senna. Massa parecia trilhar o caminho vitorioso de campeões como Senna, Nelson Piquet e Emerson Fittipaldi. Mas, no domingo 25, calou a alma dos milhares de brasileiros que acordaram cedo para ver o Grande Prêmio de Hockenheim, na Alemanha. Na 49ª volta, ele desacelerou em uma reta a Ferrari com a qual liderava a prova, para permitir que Fernando Alonso, seu companheiro de equipe, o ultrapassasse com facilidade rumo à bandeirada final. Ali, ao vivo, diante de todos, feriu de morte o orgulho nacional. Chegou em segundo, escoltando o concorrente. Havia cumprido uma ordem do chefe. Pior, ouvida alto e bom som durante a transmissão. Sua máscara caiu ali, naquela reta. Massa não era um discípulo dos nossos antigos campeões. Era como Rubens Barrichello, que, em 2002, abriu passagem para Michael Schumacher vencer o GP da Áustria, e Nelsinho Piquet, que jogou o carro contra um muro no GP de Cingapura, em 2008, para beneficiar o mesmo Alonso, na época seu parceiro na Renault. Curioso é que o próprio Massa criticou Nelsinho na ocasião. “Foi uma atitude muito feia. Jovem, errou”, disse. Em roda de amigos, sabe-se que Massa e seu pai, Titônio, também batiam duro em Barrichello. Quando agiu como eles e facilitou a vitória do concorrente, quem perdeu foi o País. “Em vez de patrocinar uma mudança de mentalidade nos brasileiros, de abolir o jeitinho, o esporte exaltou o lado sujo, sombrio, por causa desse episódio do Felipe Massa”, diz o sociólogo Maurício Murad, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e da Universidade Salgado de Oliveira. “Foi um tiro no pé.”

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NA ALEMANHA
Francisco levou o filho para ver a corrida: “Fui enganado”, disse após a prova

Para um país que vive uma era de pujança econômica, avanços sociais e que conquistou o direito de sediar os dois maiores eventos esportivos do planeta, a Copa do Mundo, em 2014, e a Olimpíada, em 2016, a subjugação pública de um ídolo foi como uma bofetada. Deixou a população estarrecida, indignada e furiosa. “A autoestima do brasileiro vem aumentando com o passar dos anos, ele está fugindo daquela síndrome do vira-lata, que considera tudo de fora melhor”, afirma o psicólogo do esporte João Ricardo Cozac, presidente da Associação Paulista da Psicologia do Esporte. “Esse episódio não favorece esse processo, foi péssimo para o Brasil.”

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ARMAÇÃO
Em 2002, Barrichello, na Ferrari, deu o primeiro lugar ao companheiro Schumacher no GP da Áustria

Os fãs de esportes se sentiram enganados pelo piloto brasileiro por quem sofreram e rezaram há exatamente um ano, quando um grave acidente o afastou das pistas e quase lhe custou a visão do olho esquerdo. Massa renasceu para a Fórmula 1 nesta temporada, e prometia ir com tudo em busca de um título mundial que o Brasil não saboreia há quase 20 anos. Mas, ao participar de uma trapaça, cometeu a maior barbeiragem da sua vida. “Lamento dizer que Massa perdeu aquela imagem de piloto aguerrido”, afirma Reginaldo Leme, comentarista de F-1 há 38 anos. Até a família de Massa se espantou. “Eles ficaram pasmos com o que viram, não imaginavam que pudesse acontecer com ele”, diz uma pessoa que trabalha para o piloto, no Brasil. “Felipe sofreu um abalo sério em sua imagem, não há dúvida.”

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VERGONHA
Piquet, da Renault, bateu no GP de Cingapura de 2008 para garantir a vitória de companheiro Alonso

Depois de três casos de armação de resultados envolvendo brasileiros, não é mais possível enxergar a F-1 como um esporte que promove o orgulho nacional. “Por trás de um herói tem de haver uma trajetória de glórias que são divididas com a comunidade de onde ele veio”, diz Ronaldo George Helal, doutor em sociologia pela New York ­University. E isso foi tirado do público brasileiro no GP de Hockenheim. “Até domingo, eu torcia bastante pelo Felipe”, diz o estudante paulistano Raphael Marqueti Correa, 24 anos, que possui uma camisa da Ferrari e uma réplica em miniatura do bólido de Massa em casa. Ele sabia que o piloto estava mal na temporada, mas torcia para ele ganhar. Assim, ouviria o “Hino Nacional” e todos falariam do Brasil. Decepcionado, Correa setencia: “Me senti traído e não quero mais acordar cedo para assistir a essa porcaria.”

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Para o psicólogo Cozac, a manipulação ocorrida no GP da Alemanha ofereceu um exemplo negativo de valores morais para crianças e jovens atletas. “Muitos pais ficaram com a tarefa, depois da corrida, de explicar para seus filhos que aquilo que eles viram não deve ser adotado como norma de conduta na vida deles”, completa ele. Consultor de recursos humanos, Francisco Menezes, 43 anos, que há três mora em Munique, levou o filho mais velho, Luís Felipe, 11, a Hockenheim, no domingo 25. Após quatro horas de viagem de carro, estavam lá ele e o filho, com bandeiras, bonés e camisetas do Brasil na arquibancada, vibrando com Massa a cada volta.

PARTE 2


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