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Um jogo com dois tempos bastante distintos marcou, na sexta-feira 3, a despedida da Seleção Brasileira da Copa do Mundo da África do Sul. A primeira etapa da partida contra a Holanda, em Porth Elizabeth, foi uma espécie de sonho – o Brasil venceu por 1 a 0, com atuações impecáveis até mesmo dos criticados Felipe Melo e Michel Bastos. A segunda foi a dura volta à realidade. Os holandeses viraram o placar explorando todas as deficiências brasileiras cantadas desde a convocação pelo técnico Dunga. Sem criatividade e comando dentro de campo, os brasileiros sentiram a falha da defesa que originou o gol de empate do adversário. A partir de então, viu-se um time descontrolado e sem opções. E Felipe Melo, alçado ao papel de vilão ao ser expulso por uma entrada desleal no atacante holandês Roben. Com o apito final, não foi só a Copa que acabou para o Brasil. A derrota decreta o fim da polêmica era Dunga na Seleção. Iniciada com outra derrota, em 1990, parcialmente reabilitada em 1994, com o título de campeão mundial (ambas como jogador), teve seu desfecho com uma passagem que ficará mais lembrada pela teimosia e pela agressividade mostrada pelo agora treinador do que pelos lampejos de futebol apresentados por seus comandados.

Não há como ser diferente. Como sempre acontece – e não apenas no Brasil – todo o peso do fracasso recairá com força sobre os ombros do treinador brasileiro. Dunga levou para dentro da seleção uma guerra particular que trava com seus críticos – e de certa forma com si mesmo – há 20 anos. Em todas as poucas entrevistas que concedeu na África do Sul, mostrava-se obcecado em vencer esse Mundial para calar de vez aqueles que há duas décadas o tornaram símbolo do futebol sem brilho. Com isso, transferiu para o time uma tensão que só pertencia a ele, não aos jogadores. Kaká e Robinho, dois jogadores normalmente tranqüilos em campo, sob o comando de Dunga mostravam-se irritadiços e impacientes.

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APITO FINAL
Cabisbaixos, Lúcio e Daniel Alves deixam o campo,
enquanto o juiz encerra o sonho de Dunga

No aspecto tático, Dunga montou um time pragmático, quase previsível. Tentou implantar um esquema muito similar ao jogado na Europa hoje, com muita força, marcação forte e foco nos contra-ataques. Saiu-se bem ao longo das eliminatórias e nos quatro primeiros jogos desse Mundial, contra equipes que estão longe das grandes potências do futebol. Acabou perdendo para uma equipe que não apresenta o brilhantismo dos tempos de Cruyff, mas é cirúrgica e sabe aproveitar as falhas do adversário. E as do Brasil não foram poucas. Foi a primeira virada sofrida pelo time do capitão do tetra, que, ao ouvir o apito final, desceu para o túnel sem se preocupar em consolar seus soldados, visivelmente feridos em campo.

Se a vitória poderia calar seus críticos, a derrota certamente deve dar ainda mais volume aos que condenaram sua convocação. O treinador brasileiro optou por abrir mão de jogadores talentosos, diferenciados, com características típicas da tradição brasileira, para montar um grupo à sua semelhança. Deixou de fora o indisciplinado e arredio Ronaldinho Gaúcho, que nos últimos anos tem mostrado mais apreço pelos bares do que pelos campos. Mas Ronaldinho, mesmo trilhando um caminho que não pode ser exatamente chamado de comprometido com sua carreira, ainda é um jogador capaz de transformar uma partida com um toque, com um passe ou um drible. Dunga também preferiu não levar Ganso, talvez a maior revelação do futebol brasileiro na última década depois do também santista Robinho, para dar lugar a jogadores que lhe mostraram uma fidelidade canina, como Júlio Baptista. No jogo de sexta-feira, ficou claro que tinha poucas alternativas no banco para reverter a derrota que se aproximava. Mesmo com o time perdendo, fez apenas duas substituições, abrindo mão, por falta de opção, de uma terceira tentativa para reverter o placar.

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FALHA
O goleiro Júlio César e Felipe Melo
se confundem no gol da Holanda

Dunga montou um exército disposto a utilizar de todos os meios para vencer uma guerra. Não foi por acaso que a concentração brasileira pouco diferenciava-se da caserna em tempos de batalha. Ao todo, os jogadores e a comissão técnica ficaram quase quarenta dias trancafiados em bunker de luxo em Johannesburgo. Ao longo desse período, a equipe teve apenas dois dias de folga. Apesar dos excessos e das idiossincrasias, Dunga trouxe de volta a seriedade à equipe brasileira, algo que havia se perdido por completo no ciclo anterior, encerrado por uma derrota contra a França. Sua passagem pela Seleção teve conquistas, como a Copa América, a Copa das Confederações e a primeira colocação nas Eliminatórias. Mas os dois fracassos foram mais retumbantes: a eliminação na Olimpíada para a arquirrival Argentina e a saída prematura da Copa.

Ao final da partida contra a Holanda, Dunga anunciou que encerra seu período à frente da seleção. Parte sem deixar um legado para as futuras convocações. Por conta de sua obsessão em vencer esse Mundial, trouxe para a África a seleção brasileira mais velha da história das Copas. Com uma média de 29,3 anos de idade, poucos serão os jogadores desse grupo que estarão no novo ciclo que se inicia no próximo mês. Já de olho no Brasil, em 2014.

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