Nos 100 primeiros dias de pontificado, o papa Bento XVI ainda não conquistou a simpatia da mídia. Ao contrário do calor humano de João Paulo II, o novo pontífice alemão transmite um certo distanciamento, uma espécie de desprezo metafísico pela vida mundana. Embora desafie o perigo, desfilando em carro aberto pela praça de São Pedro, em meio a multidões – coisa que João Paulo II deixou de fazer depois do atentado de 1981 –, falta a Bento XVI o carisma de seu antecessor. Em compensação, as virtudes – digamos, estéticas – de seu secretário particular, o padre alemão Georg Gänswein, chamam tanta atenção que ele já mereceu capa da revista dominical do Corriere della Sera. Os especialistas são unânimes: se o comportamento de Bento XVI é frio, a presença física do belo Georg tende a esquentar o noticiário. “Eles são como avô e neto. Mostram um diálogo de gerações que emociona e funciona bem. Na hierarquia do Vaticano, a imagem de Georg é como um produto novo numa empresa antiga”, diz Klaus Davi, um dos mais respeitados comunicólogos da Itália.

Pela diferença marcante de personalidades entre Bento XVI e João Paulo II, já se previam mudanças de estilo no comando da Igreja Católica. O papa polonês era extrovertido e naturalmente direcionado a conquistar multidões, valendo-se para isso de sua experiência teatral. Já o pontífice alemão é reservado, mais preocupado com a qualidade dos católicos do que com a quantidade de fiéis. O estilo de Bento XVI é sóbrio. Ele aprecia os cantos gregorianos, tem planos para ressuscitar o latim entre os fiéis e usa símbolos religiosos ligados à Idade Média, quando a Igreja cristã era unida. Até porque um dos principais objetivos de seu pontificado é o diálogo ecumênico, principalmente com os cristãos ortodoxos da Rússia, primeiro passo para a sonhada reunificação do rebanho cristão.

No aspecto estético, Bento XVI despertou curiosidade ao usar óculos, claros e escuros, depois de um longo “embargo ótico” do último papado. Joseph Ratzinger prefere o ray-ban da luxuosa marca americana Serengeti, que custa cerca de 300 euros. As vestes, os sapatos mocassins vermelhos e as abotoaduras de ouro nos pulsos da camisa são italianos, fornecidos pela tradicional loja Gammarelli, que desde o século XVIII se encarrega das roupas e dos acessórios papais. O Vaticano já encomendou os novos modelos de calções de banho (todos sóbrios e nas cores azul-marinho, preto e cinza-escuro) para os mergulhos na piscina do Castel Gandolfo, a residência de verão, atualmente em reforma. Em relação ao carro, Ratzinger confia mesmo na eficiência alemã da Mercedes.

Como talentoso teólogo, Bento XVI passa muitas horas em silêncio, lendo e escrevendo. Ele prefere escrever à mão e só as duas secretárias, Ingrid Stampa e Birgit Wansing, conseguem decifrar sua minúscula caligrafia. Elas são simpatizantes do movimento espiritual alemão Schoenstatt, e trabalham há muitos anos com Ratzinger. O papa relaxa tocando piano, com destaque para a música erudita – o austríaco Wofgang Amadeus Mozart (1756-1791) é um de seus compositores prediletos. Ele não aprecia muito os fartos banquetes; almoça e janta em companhia de poucas pessoas ou sozinho.

Exposição – Se a privacidade de um pontífice costuma ser respeitada nos mínimos detalhes, essa regra parece não valer para o seu secretário particular, caçado pelos paparazzi famintos de mais informações sobre a sua vida íntima. Georg Gänswein é impecável. O elegante loiro, 48 anos, 1,80 m de altura, olhos azuis, joga tênis e esquia muito bem. A sua biografia é límpida como as vestes papais. Ele nasceu em bom berço na cidadezinha alemã de Waldshut, na Floresta Negra da Bavária. Tem um curriculum-vitae brilhante: ordenado padre em 1984, formado em direito canônico em Munique, onde se revelou um bravo teólogo, mérito que lhe abriu as portas da Cúria. Foi professor da universidade Santa Croce, da Opus Dei, encarregado de examinar a doutrina à luz da ortodoxia. Estas qualidades foram notadas por Ratzinger, que chamou o jovem alemão para trabalhar a seu lado na Congregação pela Doutrina da Fé e, nos últimos dois anos, como seu secretário particular. Sua fidelidade ao papa é tal que ele se negou a dar o número do telefone celular do papa para o antigo secretário de Ratzinger, monsenhor Clemens.

Longe dessas questões terrenas, Bento XVI descansa num chalé nos Alpes italianos – afinal, ninguém é de ferro. Antes que algum maledicente apóstata criticasse o fato de Sua Santidade ter saído em férias tão pouco tempo depois de ser entronizado, ele fez uma inusitada defesa do, digamos, ócio: “As férias são necessárias para a recuperação do corpo e do espírito, especialmente para aqueles que levam uma vida frenética e sem muito tempo para o silêncio e para a reflexão. Em contato com a natureza, as pessoas podem reencontrar sua verdadeira dimensão”, pontificou. Soa pouco germânico? Talvez. Mas não podemos nos esquecer de que Ratzinger é bávaro, povo muito ligado às suas origens camponesas. Além disso, o pensador alemão J. W. Goethe (1792-1832), expoente do romantismo, acreditava que a natureza era plena de espíritos.

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