Uma guerra de lances vai tirar do marasmo o mercado de arte internacional. No dia 7 de novembro estará à venda aquela que talvez tenha sido a última tela feita pelo pintor holandês Vincent van Gogh, antes de ele se suicidar no dia 29 de julho de 1890, aos 37 anos. Essa preciosidade, pertencente a um colecionador privado, chama-se The fields (wheat fields) e será leiloada pela Sotheby’s de Nova York. Antes disso, a estonteante vista de um campo de trigo varrido pelo vento e dominado por um vasto céu azul poderá ser apreciada, do dia 7 ao dia 12, no escritório londrino dessa casa de leilões. Depois, só em reproduções de livros. O preço estimado da pintura é de US$ 35 milhões. Esse valor, no entanto, deve se multiplicar. “Aqui está um artista literalmente prestes a tirar a vida, atravessado por um profundo desespero, mas ainda pintando com amarelos vibrantes, azuis esplêndidos e verde-esmeraldas”, diz David Norman, vice-presidente executivo da Sotheby’s.

Especialistas acreditam que Van Gogh pintou The fields 19 dias antes de se matar, quando morava na pousada Ravoux Inn, na região de Auvers-sur- Oise, na França – local ensolarado que atraiu artistas como Camille Pissaro e Paul Cézanne. The fields era uma das telas que estavam dependuradas em seu quarto na ocasião da tragédia. Uma das provas é que, numa carta ao irmão Theo, datada de 10 de julho de 1890, o artista afirma ter finalizado uma paisagem cuja descrição coincide com uma das três telas feitas naquela semana. “Essa região é dominada por vastos campos de trigo sob céus carregados e são o correspondente para a minha tristeza e extrema solidão”, escreveu Van Gogh. “Essas telas vão dizer a você tudo o que eu não consigo expressar em palavras.” Não por acaso, o irmão Theo criou uma relação tão forte com a obra que a guardou em sua coleção por quase 20 anos. Depois que morreu, sua mulher a vendeu em 1907. Daí em diante, a pintura foi passando pelas mãos de diferentes colecionadores – aquele que a está colocando em leilão manteve-se anônimo.

A Sotheby’s de Nova York anuncia a venda da tela The fields, avaliada em US$ 35 milhões

De 2001 para cá, The field esteve sob a guarda do Museu Van Gogh, em Amsterdã. Estudiosos da obra do holandês, que possui alguns dos recordes no mercado de arte (sua tela mais cara é O retrato do Dr. Gachet, avaliada em US$ 82,5 milhões), costumam incluí-la no período em que o pintor encontrou no esplendor da paisagem francesa forças para tentar superar a depressão. Nas primeiras semanas de sua estada em Auvers, Van Gogh pintou casarios e ruas. No mês de junho, sob o impacto da intensa luz do verão, mudou subitamente de tema e passou a explorar o vasto horizonte diante do qual já não se viam as figuras de agricultores de suas primeiras telas rurais. Os campos aparecem vazios da presença humana, assim como de casas ou qualquer elemento narrativo – há apenas o silêncio dos trigais e o infinito azul do céu. “Sinto-me absorvido pela imensa planície com suas plantações, sem limites como o mar.” Foi no meio de um trigal como esse que Van Gogh tirou a vida com um tiro no peito.