Mudanças sutis de atitude também são um selo de bem-estar para o cotidiano. Reparar no verde ao seu redor, por exemplo, pode ampliar horizontes. Um estudo da Universidade do Texas (EUA) revelou que escritórios com janelas com vista para áreas verdes e o hábito de ter plantas no ambiente de trabalho garantem mais satisfação aos funcionários. Outra pesquisa mostrou que os alunos que desfrutam da natureza dos campi universitários têm melhor rendimento em sala de aula. Curtir o verde em uma cidade como São Paulo parece impossível. Não é o que o advogado André Gabriel Hatoun Filho, 38 anos, pensa. “Tenho sorte, pois o belo me acompanha no caminho”, diz ele, sobre as árvores e praças com as quais se depara no trajeto de casa para o trabalho, feito de bicicleta, onde cabem, inclusive, cadeiras próprias para levar os filhos para a escola. Para completar o banho de natureza, sempre que dá, ele estica a pedalada em cinco quilômetros até o parque do Ibirapuera. “Lá, caminho, medito, cochilo, faço flexões na barra. É um tempo para mim e sem peso na consciência.” O contato com o verde logo pela manhã faz com que seu dia flua com mais alegria, garante.

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SENSAÇÕES
Daniela busca nas artes e na arquitetura a paz e a energia necessárias para o dia a dia

Arte
1. Sensibilize sua atenção. Quando assistir a um filme ou ouvir uma música, esteja atento aos detalhes
2. Dedique-se às artes que lhe interessam mais e reserve tempo para elas
3. Experimente: ouça, leia, veja ou assista a algo novo, com alguma regularidade
4. Transforme arte em hobby – pinte, dance, cante, borde, crie

Obter prazer no trabalho talvez seja a mais difícil de todas as buscas. Especialmente para os que não fazem o que gostam. E, mesmo entre os que escolheram seu ofício com vocação e convicção, a sobrecarga de tarefas, o clima hostil e as horas extras fazem com que qualquer pessoa sinta um imenso desprazer ao cruzar as portas da empresa. “O ambiente profissional no mundo atual é, por natureza, estressante, competitivo e gerador de poucos momentos de prazer e muitos de frustração e ansiedade”, afirma a socióloga Silvana Barolo, que, após se dedicar durante anos aos departamentos de recursos humanos de grandes empresas, montou a ONG Saber, que tem como objetivo ensinar como ter mais bem-estar em todos os aspectos da vida. “Realizar-se e sentir satisfação na atividade é resultado de exercício interno de cada um, mas as empresas devem ajudar a tornar o clima mais harmonioso.”

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Um estudo recém-publicado no “European Heart Journal” mostrou que pessoas que trabalhavam até três horas a mais por dia além do normal tinham mais problemas de saúde e, portanto, se sentiam mais infelizes. Outra pesquisa apontou que os que recebem por hora se sentem mais recompensados do que aqueles que ganham por mês. Para os autores do trabalho, da Universidade de Toronto, no Canadá, e da Universidade de Stanford (EUA), isso significa que quem recebe imediatamente sente que seu trabalho é mais valorizado.

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CURA
Enquanto tira a dor do paciente, Ricardo gosta
de ouvir as histórias que eles contam

Trabalho
1. Não faça nada no piloto automático Esteja realmente presente em cada atividade
2. Tente mensurar os resultados: pergunte o que você está de fato produzindo e quem está se beneficiando com seu trabalho
3. Cuide do seu espaço profissional e das suas relações com os colegas. Deixe sua mesa mais bonita, seja gentil com os colegas, zele por seus instrumentos de trabalho
4. Não deixe que a atividade profissional se torne uma obsessão. A vida é composta de muitas coisas. O trabalho é só uma delas
5. Todo mundo tem um papel na sociedade – descubra o seu e se dê o devido valor

O fisioterapeuta Ricardo Suman sabe na prática o que essas pesquisas querem dizer. Aos 28 anos, tem muito mais prazer em seu ofício que no começo de carreira. “Antes, eu trabalhava até 14 horas por dia, atendia cinco pessoas ao mesmo tempo e ganhava mal”, lembra. “Hoje, trabalho no máximo seis horas por dia e consigo atender uma pessoa por vez, com qualidade”, compara. Detalhe importante: agora ele também ganha mais. O que mais dá prazer a Suman em sua lida não é nem o tempo nem o dinheiro, mas ajudar cada paciente a sair sem dor. O fisioterapeuta é o típico caso de quem busca extrair prazer dos detalhes. Afinal, passar uma hora com uma pessoa deitada em sua frente, durante longas sessões de RPG, é um tanto maçante. Para tornar tudo mais divertido, cada paciente é visto com grande curiosidade pelo fisioterapeuta. “Adoro as histórias que eles me contam, fora que isso sempre me ajuda no diagnóstico.” A exemplo de Suman, extrair prazer das coisas mais prosaicas e acessíveis faz com que essa sensação seja uma constante na vida. Mas sem o peso de ser uma obrigação.

Estudar o prazer é tarefa antiga. “O homem pensa sobre isso desde que existe”, ressalta o professor de ética Clóvis de Barros Filho, autor do livro recém-lançado “A Vida Que Vale a Pena Ser Vivida” (Ed. Vozes). A noção do mundo clássico que sobreviveu é a platônica, de que o prazer é uma redução provisória da dor e do sofrimento. E o hedonismo, hoje associado ao prazer egoísta, na verdade foi concebido pelo filósofo Epicuro como uma vida espartana, de pouca satisfação. “É tudo o que a nossa sociedade atual vê como restritivo”, diz Barros Filho. Anos mais tarde, com o peso da Igreja na vida das pessoas, o prazer virou sinônimo de culpa. Do ponto de vista da ciência, Charles Darwin foi um dos primeiros a levantar a bandeira de que ele nada mais é que uma artimanha da natureza para garantir a perpetuação da espécie.

Fonte de angústia e culpa para os religiosos, sinônimo de felicidade, sentimento instintivo e irracional, habilidade aprendida ao longo da vida. No final das contas, o prazer é um pouco disso tudo. “Não sabemos de onde vem, mas é gostoso”, brinca Kringelbach. O melhor é que ele pode ser sensivelmente expandido, à medida que nos conhecemos. “Não nascemos prontos. Precisamos aprender o que traz prazer ou não”, diz o filósofo Mario Sérgio Cortella. “A sensação de doce ou salgado é automática. Mas degustar e ter prazer com a comida é aprendizado.” Assim como apreciar o belo. Daniela Grumbach, designer, 32 anos, tem plena consciência disso. Aprendeu desde cedo a ter prazer com as artes. Sempre que viaja, põe no roteiro uma visita a museu. “Sou completamente apaixonada por arte e arquitetura”, afirma. Com a mãe artista plástica, ela aprendeu que o mais importante não é gostar ou não do que vê ou ouve, mas perceber que a arte comunica sensações. “Ela oferece confortos e desconfortos para viver a realidade”, diz Daniela, dando créditos à mãe e mentora.

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COMPANHIA
Felipe Simões (de preto) vê Karen, Felipe, Eduardo
e Alan como uma segunda família

Amigo
1. Cuide dos seus: família e amigos próximos também devem ser cativados sempre
2. Aprenda a ouvir o outro
3. Expanda seus horizontes, permita-se conhecer gente nova
4. Valorize cada contato do cotidiano – seja com um amigo, seja com o porteiro do seu prédio
5. Acredite: tudo que já é bom pode ser ainda melhor se você está bem acompanhado. Não cultue a solidão

O aprendizado do prazer também serve para atividades que nem sempre despertam paixão à primeira vista, como os exercícios físicos. O que parece tedioso e repetitivo em um primeiro momento pode se tornar uma fonte inesgotável de endorfinas, as substâncias produzidas pelo cérebro que provocam sensação de relaxamento e bem-estar. A grande maioria das pessoas começa a se mexer por razões pontuais e objetivas, como emagrecer ou ficar mais saudável. E, quando se dá conta, estabelece uma relação de cumplicidade e fidelidade com o suor de cada dia. Foi o que aconteceu com a analista de comércio exterior Renata Loureiro, 31 anos. “Eu era sedentária e pesava 15 quilos a mais. Além disso, só vivia em função do trabalho”, conta. Baiana radicada no Rio de Janeiro, ela entrou para a academia para perder peso. Depois, comprou uma bicicleta, para se movimentar também nos fins de semana. Quando se deu conta, a obrigação tinha virado diversão. Hoje ela pratica ciclismo, corrida e começou a nadar recentemente. A reboque, vêm os prazeres de curtir o mundo ao seu redor e conhecer gente diferente, graças às competições de bicicleta pelo Brasil. “Acordei outro dia às 4h da manhã para treinar. Ver o sol nascendo na avenida Niemeyer valeu todo o esforço”, afirma. No caso de Renata, essa recompensa virou um vício do bem. Mas, quando há exagero ao atender a um desejo, a obsessão toma conta e o que era um prazer vira martírio. Caso dos alcoólatras, por exemplo.

O vício é o extremo a que uma pessoa pode chegar na busca desenfreada para atender aos seus desejos. Os estudiosos do tema concordam que a sociedade contemporânea sofre ao apostar nos prazeres externos e inatingíveis. “Depositar a realização pessoal em coisas transitórias e bens materiais é fugaz e só gera frustração”, afirma o monge zen-budista Enjo. “Nossa cultura nos chama o tempo todo a realizar os desejos imediatos, de forma que passamos a ter que ter prazer”, critica Márcia de Almeida Batista, psicóloga e professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Pesquisas mostram que quem busca a felicidade basicamente nos prazeres imediatos torna-se infeliz. Estudo feito por um grupo de universidades americanas demonstrou que as pessoas que se acostumam com muitos eventos felizes e positivos sofrem muito mais quando se defrontam com algo ruim. Como resumiu um dos autores do estudo, Shigehiro Oishi, da Universidade de Virgínia, não tentar ser tão feliz é a chave para a felicidade.


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