brasil_sanguessuga_01.jpgO governo e a oposição disputaram ao longo da semana qual dos dois é menos corrupto. Ao final, porém, os dois lados perderam. A estratégia
de jogar a responsabilidade pelo esquema dos sanguessugas para o terreno do vizinho iniciou-se no Congresso com a força oposicionista na CPI que investiga a atuação da máfia das ambulâncias. Numa lista de novos parlamentares notificados para prestar esclarecimentos, foi incluído o ex-ministro da Saúde Saraiva Felipe, deputado pelo PMDB. Penúltimo ministro na gestão Lula, ele somava-se ao primeiro da fila, o hoje candidato do PT ao governo de Pernambuco, Humberto Costa. O empresário Luiz Antônio Vedoim, dono da Planan, empresa que superfaturava as ambulâncias, envolveu Humberto Costa no depoimento que deu à Polícia Federal, numa estratégia de delação premiada. O aparecimento do nome de Costa, o segundo ministro de Lula envolvido no escândalo, gerou uma imediata reação do governo. Temendo respingos na reeleição, o Palácio do Planalto escalou os ministros da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, e o controlador-geral da União, Jorge Hage, para virar o canhão para o alvo da oposição.

De acordo com o levantamento que mostraram, os partidos de oposição têm 52% das prefeituras beneficiadas com emendas da Planam. “Estamos
impedindo a manipulação eleitoral”, disse Bastos, ao mostrar os números. Segundo as planilhas do governo, é o PSDB do candidato Geraldo Alckmin, o principal adversário do presidente Lula na disputa eleitoral, que tem o maior número de prefeituras envolvidas com o esquema: 128. O PFL, parceiro de chapa do tucano, tem 107. O PT, 19.

A máfia vem atuando desde 1998. “Eu não tenho a menor idéia de quem seja esse senhor”, tratou de esquivar-se o ministro da época, o candidato do PSDB ao governo de São Paulo, José Serra. Em depoimento à PF, Vedoim afirmou que o governo de Fernando Henrique pagava em dia. Serra podia até não saber o que havia por trás do ato, mas a verdade é que em 2001 ele esteve pessoalmente numa solenidade em Cuiabá para entrega de ambulâncias de deputados hoje acusados de envolvimento com a máfia. Um dos anfitriões era Ricarte de Freitas, do PTB-MT, um dos nomes que estão sendo investigados na lista dos sanguessugas. Também estavam ali dois outros supostos integrantes do esquema, Lino Rossi e Pedro Henry, ambos do PP de Mato Grosso.

Também foi antes da posse de Lula que a Planam começou a registrar a propina em seu livro-caixa. Foi assim em 11 de abril de 2002, quando o ministro da Saúde era Barjas Negri, ex-secretário-executivo da Pasta de Serra. Está escrito no livro-caixa: “Acerto Ministério”, no valor de R$ 10 mil. Quem fez o acerto no Ministério foi Marco Antônio Lopes, um ex-funcionário da Planam que foi trabalhar com a deputada-sanguessuga Elaine Costa, do PTB do Rio de Janeiro. A infiltração da Planam na esfera federal foi recorde em 2002. A empresa foi responsável por 51,5% dos contratos do Ministério da Saúde para aquisição de ambulâncias. Em 2003, primeiro ano da administração Lula, a parcela da Planam ficou com 24,3% dos contratos. Em 2004, abocanhou 16,7%, segundo o governo.

brasil_sanguessuga_04.jpgAs evidências de que o esquema se iniciou no governo FHC, porém, não eximem o atual governo da responsabilidade pela manutenção intacta das operações. A infiltração da máfia continua a todo vapor. ISTOÉ fez um levantamento sobre uma lista de nomeações do PMDB junto à Casa Civil da Presidência da República. E encontrou diretores de órgãos estratégicos indicados por parlamentares hoje investigados por envolvimento com os sanguessugas. Exemplo disso é o diretor do Departamento de Administração da Fundação Nacional de Saúde, Wagner de Barros Campos, nomeado por sugestão de uma lista de parlamentares, que inclui entre eles os supostos sanguessugas cariocas Josias Quintal, do PSB, e José Divino e Vieira Reis, ambos do PRB. Este último é o responsável pela infiltração de Maria da Penha Lino no Ministério da Saúde em 2005. Ela foi operadora da máfia em Brasília. Josias e Divino também são responsáveis pela indicação de Leslie de Albuquerque para a direção do Hospital dos Servidores no Rio de Janeiro.

No Legislativo, já são 94 os parlamentares investigados por receber propinas, grande parcela com depósitos em conta bancária. A CPI deve enviar este ano os nomes para os Conselhos de Ética da Câmara e do Senado, mas os parlamentares acreditam que ninguém será cassado este ano. Ricarte de Freitas diz que vai se reeleger. “Vou para o pau”, avisa o deputado.

A investigação feita pela Polícia Federal e pela CPI demonstra ainda o quão lucrativo era o esquema dos sanguessugas. Depois de subornar 591 prefeitos, de 20 partidos políticos, Luiz Vedoim começou a expandir seus negócios para o Nordeste. Seu grupo anunciou a construção da empresa Vedobus, para fabricar microônibus, miniônibus e ônibus urbanos. Com investimentos iniciais de R$ 30 milhões, a fábrica construiria oito unidades por dia. Vedoim fez a terraplanagem do terreno, no município de Dias D’Ávila. Quem ia financiar o negócio, claro, era o governo.