TURISMO O Great Brazil Express tem capacidade para 22 passageiros por vagão. O pacote inclui passeios e pernoite em hotéis. O mais barato custa R$ 5.753

Viajar de trem no Brasil já pode ser uma experiência de luxo. Na semana passada, o único trajeto requintado sobre trilhos na América do Sul fez seu début. Um percurso inaugural com convidados seletos, na verdade. A partir de 2008 a rota estará disponível a turistas endinheirados, principalmente os estrangeiros, ou programas empresarias de incentivo. Batizado como Great Brazil Express, o trem de luxo nacional foi criado com inspiração no lendário Orient Express, linha inaugurada em 1883 ligando a Europa à Ásia. Como o País não é pródigo em roteiros para passageiros – por aqui a maior parte dos trens faz transporte de carga –, o pacote se limita a regiões turísticas do Estado do Paraná. São mais de 500 quilômetros de viagem em vagões elegantemente decorados e com serviço de primeira classe.

O trem de luxo é para poucos. Pouquíssimos, aliás. Há apenas 22 lugares, todos numerados, por vagão. Por enquanto, somente um está pronto. Mas até a primeira partida da operação comercial, marcada para abril, o segundo já estará à disposição. A composição é assim mesmo: pequena e exclusiva. Ela é automotriz. Ou seja, os dois carros do Great Brazil Express são equipados com motor, semelhantes aos usados no famoso passeio ferroviário conhecido como Serra do Mar, no Paraná, entre Curitiba e Paranaguá. A comparação não é à toa. À frente do projeto está o empresário Adonai Aires de Arruda, fundador da Serra Verde Express, que administra o trem turístico da Serra do Mar. Quando colocou na cabeça que lançaria o roteiro luxuoso sobre trilhos, Arruda estudou reativar a antiga linha chamada de Trem de Prata, que fazia a rota São Paulo–Rio de Janeiro e fez sua última viagem em novembro de 1998. “Recuperar esses vagões seria muito complicado. Eles estão em péssimas condições”, conta. Os carros-leito da velha composição prateada (que fazia percurso noturno na fase turística implantada em 1994) estão abandonados em Juiz de Fora (MG). “Como eu tenho os carros da Serra e domino a logística dessa operação turística, ficou mais fácil criar o trem de luxo no Paraná”, completa Arruda.

Disponibilizar um passeio desses no Brasil é um projeto alimentado desde 1998, mas que só começou a virar realidade há cerca de três anos. Um impulsionador do plano é o belga Thierry Nicolas, diretor- presidente da Transnico International Group, uma das maiores operadoras de turismo ferroviário de luxo no mundo. A empresa atua na Índia, na África, na Europa e em Cuba (onde transporta 25 mil passageiros por ano, em composições normais – o projeto de luxo está no papel). Apaixonado por trens desde criança, Nicolas fez diversos trajetos ao redor do planeta, como as múltiplas rotas do Orient Express e a longa viagem do Trans-Siberiano. E conhece de perto os trilhos do Brasil, um destino visitado por ele mais de 20 vezes. “O País recebe cinco milhões de turistas por ano, mas os europeus são menos de um milhão. São eles os principais clientes dos trens de turismo”, diz. Nicolas, dono de 25% do Great Brazil Express, acredita que a oferta da viagem de luxo terá um impacto importante. “Queria oferecer essa alternativa aqui antes, mas tive de esperar a situação ficar mais adequada ao investimento. O momento chegou, o Brasil está se desenvolvendo e pode atrair mais turistas”, explica. O outro sócio do empreendimento, também com 25% das ações, é o sueco Thomas Glendahl, um investidor ligado a empresas como Euro Pacific Investment Capital e Merchant Venture Investments.


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DECORAÇÃO A atmosfera do interior do trem remete ao Brasil colonial. Há móveis de antiquário, peças exclusivas, gravuras tropicais e reproduções de Debret

Por ora, o investimento está em R$ 2,5 milhões. Isso porque parte da estrutura já estava montada. Os recursos foram usados basicamente na reforma de vagões e no lançamento do Great Brazil Express na Europa, que ocorreu em setembro, na França. Para adequar os carros da Serra Verde Express ao gosto do consumidor europeu e do viajante brasileiro de primeira classe, os sócios contrataram o designer Paulo Peruzzo. Foram seis meses de preparativos. O trem ganhou decoração que evoca o Brasil colonial, com madeira nobre, sofás adquiridos em antiquários e reproduções de Debret e Rugendas. O teto foi pintado à mão com imagens da flora brasileira. Gravuras de pássaros típicos do Brasil foram escolhidas para enfeitar as divisórias montadas para dar mais privacidade aos passageiros. “A decoração representa nossa cultura. Quando você viaja no Orient Express ou no trem de luxo africano que vai até as cataratas Victoria, o design é internacional. Não se ressalta o estilo local”, afirma Arruda.


BAR Os viajantes degustarão, à vontade, bebidas finas como uísque 12 anos e champanhe

Além disso, o trem dispõe de conforto e modernidade para atender os cerca de dois mil viajantes esperados para o primeiro ano de funcionamento. O Great Brazil Express terá guias poliglotas e três comissários de bordo por carro. As bebidas incluirão vinhos finos, uísque 12 anos e champanhe. Uma tela de plasma foi instalada ao lado do bar para mostrar ao viajante o caminho que ficou para trás enquanto ele degusta aperitivos e drinques. E poltronas foram encomendadas ao estilo Ralph Lauren: com revestimento de couro e forro de penas de ganso.

Quem quiser apreciar os requintes do trem de luxo brasileiro terá de adquirir um pacote com, no mínimo, seis dias de viagem, com bebidas, refeições, passeios e hospedagens incluídos. O mais barato dos quatro programas oferecidos pela companhia, na baixa temporada, em outubro, sairá por R$ 5.753. Os valores envolvem ainda outros deslocamentos. Como o trecho de trem não pode ser estendido por mais cidades devido à complexa organização da malha ferroviária brasileira – que tem diferentes trilhos por regiões e que exige uma parceria entre concessionárias de transporte de carga, operadoras de trens de turismo e governos –, o roteiro do Great Brazil Express foi montado com viagens por ônibus e avião. Os pontos de partida são Rio de Janeiro ou Foz do Iguaçu, dois fortes atrativos para os estrangeiros. Ou Curitiba, largada do passeio de seis dias. O pacote mais caro, de dez dias, com saída entre julho e agosto, custa R$ 9.597. Parece salgado? “Um trecho de 30 horas entre Paris e Veneza pelo Orient Express equivale a aproximadamente R$ 4.500. E sem as bebidas”, diz o belga Nicolas. De qualquer modo, uma viagem já está com todas as passagens vendidas. Em agosto, o trem de luxo receberá um grupo de médicos que tem convenção marcada para Foz do Iguaçu.

 

Os sócios já estão com outro projeto de turismo ferroviário com direito a charme e elegância. Em abril de 2009, deverá entrar em operação o Trem do Pantanal. Não terá o mesmo luxo do roteiro pelo Paraná, até porque a composição será bem maior e receberá 250 passageiros por viagem. Porém tem a seu favor o apelo ecológico, cada vez mais em alta entre os viajantes daqui e os de fora. Estão previstas três categorias de vagões, uma delas executiva. O primeiro trecho será Aquidauana e Miranda, em Mato Grosso do Sul. Planeja-se depois acrescentar Campo Grande e Corumbá ao pacote. Mas isso fica para o futuro. No momento, a menina-dos-olhos é mesmo o luxuoso passeio pela Serra do Mar e pelos campos paranaenses.


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