A Dinamarca é um país com 43 mil quilômetros quadrados – área similar à do Estado do Rio de Janeiro – onde 5,4 milhões de pessoas compartilham um Produto Interno Bruto de US$ 187 bilhões. No Brasil, uma população 35 vezes superior colhe as migalhas de um
PIB três vezes maior. Dona de um sistema educacional irrepreensível e de um eficiente modelo de saúde, a Dinamarca lidera o ranking mundial da felicidade criado pelo psicólogo Adrian White, da Universidade de Leicester, na Grã-Bretanha. O Brasil é o 81º. Para estabelecer essa lista, ele avaliou 100 estudos de 178 nações. “A saúde foi apontada como o fator mais importante para a felicidade, seguida por prosperidade e acesso à educação”, diz.

Atrelar a felicidade ao desenvolvimento do país ou à renda per capita, porém, é uma prática que não dá conta da complexidade do tema. É a conclusão de muitos especialistas, como o economista alemão Johannes Hirata. Ele comparou a renda e o índice de bem-estar de diversas populações para a tese Felicidade como um objetivo político, apresentada recentemente na Universidade de St. Gallen (Suíça), e afirma que a economia pouco interfere na felicidade. No Japão, apesar de a renda média ter passado de US$ 880 para US$ 25 mil anuais em 50 anos, o grau de satisfação com a vida permaneceu estável.

Mas o que, afinal, gera a felicidade? Essa pergunta tem chamado a atenção de especialistas de um movimento da psicologia que tem se fortalecido na última década. É a psicologia positiva. Análises sobre o conceito de bem-estar subjetivo
– ou pessoal – se tornaram o objeto principal de estudos desse grupo. Entre
seus representantes está Martin Seligman, que defende que os psicólogos não devem apenas se preocupar com as doenças, e sim tornar ainda melhor a vida de gente saudável. Desde o lançamento de Felicidade autêntica, suas idéias se espalham pelo mundo.

No Brasil, a psicologia positiva conquista adeptos. Um dos primeiros trabalhos acadêmicos do gênero é a tese de doutorado de Lilian Graziano, da Universidade
de São Paulo. Em A felicidade revisitada, ela constata a relação entre o estado de satisfação e a capacidade de se sentir no controle da vida. Segundo Lilian, há
dois tipos de pessoas: aquelas para as quais as coisas só mudam por influências externas e as que se sentem responsáveis pelas mudanças. Na escola, o primeiro grupo seria formado por alunos que agradecem à professora pela nota e o
segundo pelos que se sentem responsáveis por ela. “O primeiro perfil é menos
feliz do que o segundo. Costuma adiar a felicidade para quando o trânsito ou o
chefe melhorarem”, diz.

Receitas para a felicidade há muitas. Mesmo porque até hoje não há consenso quanto ao que traz mais alegria. Pesquisas feitas em diversos países oferecem elementos que podem nortear essa busca. Confira a seguir alguns caminhos.

Invista nas relações

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

Professor da Universidade da Virgínia (EUA), Jonathan Haidt escreveu em seu
livro The happiness hypothesis que a família e os amigos são mais relevantes
do que o dinheiro e a beleza. “Uma condição que nos torna felizes é a capacidade de nos relacionarmos e estabelecermos laços com os demais”, afirma. Todo ser humano necessita do outro para compartilhar sensações, experiências e objetivos. Sentir-se responsável por uma pessoa pode ser a chave da realização. Isso vale para o casamento e para as amizades. Um estudo do Centro de Pesquisa em Opinião Pública da Universidade de Chicago mostrou que pessoas com pelo
menos cinco amigos próximos se dizem 50% mais felizes do que as que têm um círculo social menor.

Tenha um projeto

Postergar a felicidade é um erro grave, segundo o psicólogo Ari Rehfeld, da PUC de São Paulo. Quem faz isso nunca será feliz porque o mundo jamais será o país das maravilhas. Rehfeld considera fundamental conciliar projeto de vida e satisfação com o presente. “Projeto é algo que exige tempo. Não deve ser confundido com desejo, que é efêmero”, compara. Para a filósofa Dulce Critelli, confundir felicidade com desejo é um escorregão herdado do estoicismo e do epicurismo, as primeiras escolas filosóficas a pensar a moral de forma individual. Desde então, muitas pessoas acreditam que a felicidade está na satisfação do prazer. “Por isso, a roupa de grife, a cirurgia plástica e o carro do ano são tão valorizados. Antes, admirávamos pessoas honradas e generosas.”

Cuide de saúde

Estar de bem com o corpo e a mente é outro elemento comum às pessoas felizes.
É difícil estabelecer uma relação de causa e efeito. Não se sabe se a boa saúde ajuda as pessoas a se sentirem plenas ou se é a felicidade que traz saúde às pessoas. “Os mais felizes tendem a se cuidar mais, a comer melhor e a se exercitar”, diz o estatístico Jorge Orishi, que criou na Universidade Federal de São Carlos o primeiro mapa da felicidade em São Paulo. Com seis mil entrevistas, ele descobriu que os paulistas não se queixam da vida como parece: 59% se dizem felizes e 25% muito felizes.

Trabalhe com prazer

De acordo com o psicólogo Wanderley Codo, da Universidade de Brasília, o trabalho toma a maior parte do dia e influencia nos relacionamentos. “Não existe limite entre vida profissional e vida pessoal. Ninguém briga com o chefe e chega sorrindo em casa nem discute com a esposa e vai feliz ao escritório”, afirma. Para ele, ter uma atividade profissional que dê sentido à vida ajuda na busca pela realização. Se a atividade principal não cumprir essa lacuna, melhor tentar um trabalho voluntário ou manter alguma produção paralela.

Não perca a fé

Dar um sentido para a vida é importante, mesmo que seja em um plano superior. Pessoas que têm alguma religião não apenas vivem por mais tempo como se sentem mais felizes do que os agnósticos e ateus. O motivo pode estar no fato
de pertencer a um grupo, na serenidade experimentada nos momentos de oração
e também na crença de que os obstáculos vividos são etapas no caminho para
a realização. “A religião dá a esperança de que tudo vai melhorar, mesmo que
seja após a morte. Ela conforta”, explica o cientista da religião Frank Usarski, da PUC de São Paulo.

Não exija tanto

Autor do best-seller Sucesso é ser feliz, o psiquiatra Roberto Shinyashiki sabe o quanto a eterna busca representa para as pessoas, mas se preocupa com o que ele chama de ditadura da felicidade. “O mundo exige que as pessoas estejam permanentemente alegres e, por isso, ele se tornou o paraíso das drogas e do Prozac”, observa. Para Shinyashiki, está mais satisfeito quem entende os altos e baixos da vida. “Ninguém é plenamente feliz com o trabalho nem tem orgasmos múltiplos todos os dias. O importante é ouvir a própria consciência em vez de buscar os aplausos dos outros”, ensina. Ele, por exemplo, se sente feliz quando chega em casa e os filhos pulam em seu pescoço e quando toca guitarra com os amigos. Valorizar as pequenas coisas pode ser um bom começo, assim como ser coerente com o projeto de futuro. Vale a pena tentar.



Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias