A queda do avião da companhia Metrojet, que levava 224 pessoas com destino a São Petersburgo, na Rússia, no sábado 31, deixou de ser tratada como um acidente. Baseadas na intercepção de mensagens trocadas por terroristas, autoridades britânicas e americanas acreditam que os responsáveis sejam militantes do Estado Islâmico (EI) que atuam na Península do Sinai, no Egito, onde a aeronave foi encontrada 23 minutos após o início do voo 9268. Informações extraoficiais indicam que uma bomba teria sido colocada no bagageiro, provavelmente com a conivência de algum funcionário do Aeroporto de Sharm-el-Sheik. A real causa do acidente pode demorar meses para aparecer (e a hipótese de falha técnica não foi descartada), mas até lá a comunidade internacional seguirá questionando se o EI teria capacidade militar para uma ação terrorista tão eficaz. O EI já se mostrou hábil em dominar porções de território entre a Síria, o Iraque e a Turquia e até redefinir as fronteiras pós-Primeira Guerra Mundial. Numa área equivalente à Grã-Bretanha, instaurou um Califado, onde impõe com violência a lei islâmica.

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224 VÍTIMAS
Militares egípcios se aproximam de destroço do avião no Sinai.
Abaixo, militantes do Estado Islâmico, grupo terrorista
que reivindicou a derrubada da aeronave

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“Embora ainda não existam evidências sólidas, o EI pode ter realizado esse ataque e essa é uma ameaça significante para nós”, disse à ISTOÉ Fred Fleitz, vice-presidente do Centro de Política de Segurança, de Washington. “O EI está numa guerra contra a sociedade ocidental e os russos também são alvos.” O ex-funcionário da CIA e do Departamento de Estado americano alerta que a pressa de Washington em apontar o EI como responsável mostra que os americanos querem os russos lutando do seu lado. Desde que Moscou iniciou ataques na Síria para defender o regime de Bashar Al-Assad, há um mês, porta-vozes do Pentágono diziam que o alvo eram rebeldes treinados pela CIA, e não o EI. Agora essa narrativa sofreu um revés. Um vídeo divulgado pelos jihadistas mostra um soldado parabenizando os “irmãos do Sinai” por derrubar o avião russo e ameaça matar mais pessoas em retaliação à intervenção da Rússia na Guerra da Síria. “Estamos diante de uma organização que tem capacidade para construir bombas e não tem nenhum problema em matar civis”, afirma Patricia DeGennaro, especialista em segurança internacional da Universidade de Nova York e do World Policy Institute.

Ainda que a reivindicação do ataque pelos radicais tenha sido vaga se comparada ao histórico do grupo, que costuma divulgar nomes, métodos e tipos de explosivos, há motivos para acreditar nela. Durante a tomada de Ramadi, em maio, o EI realizou cerca de 30 atentados suicidas usando carros carregados de explosivos. Entre eles, tanques Humvees, fornecidos pelos Estados Unidos ao exército iraquiano. Segundo relatório da ONG britânica Action on Armed Violence, o EI é atualmente o maior responsável pelas mortes de civis em atentados suicidas. Até julho, quase 2 mil pessoas foram mortas ou feridas nessa situação. “Os homens-bombas têm tido papel-chave nas táticas militares do EI, sobretudo no Iraque”, diz o texto. Ainda que as informações não possam ser confirmadas, dados divulgados pela agência de notícias Amaq, ligada aos terroristas, mostram que o número de ataques suicidas mais do que dobrou em outubro. Em setembro, o EI realizou 29. No mês seguinte, 65.

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Por trás da intenção de espalhar terror e expandir o território do Califado, os homens-bombas carregam a ideologia do martírio. Para eles, essa violência seria uma “transgressão menor se comparada às crueldades que o inimigo inflige sobre eles”, segundo o escritor Mohammed Hafez. O argumento é tão forte que há relatos de filas de espera para ser um homem-bomba. Em entrevista à revista americana “Foreign Policy”, um pregador pró-EI disse que um potencial suicida se mudou da Síria para o Iraque porque lá a lista de espera era menor. Não bastasse a procura de homens dispostos ao martírio, a maioria entre 20 e 30 anos, crianças também estariam no radar do EI. A Comissão Independente do Iraque para Direitos Humanos estima que, entre novembro de 2014 e maio de 2015, mais de mil foram recrutadas para se transformar em homens-bombas.

Para o presidente do Egito, o militar Abdul Fattah Al-Sisi, qualquer conclusão sobre o desfecho do voo 9268 é precipitada. Afinal, o fortalecimento do braço do EI no país afetaria diretamente uma de suas principais fontes de renda: o turismo. Neste ano, o governo esperava que as pirâmides e os resorts do Mar Vermelho atraíssem 10 milhões de visitantes, bem abaixo dos 14,7 milhões de 2010, antes do início das manifestações da Primavera Árabe. Agora essa meta está mais longe de ser alcançada.

Foto: Maxim Grigoriev/ap, 


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