É triste de ver. Nos sinais, nas calçadas, debaixo dos viadutos, na periferia ou nos grandes centros, ela volta a se mostrar com uma crueza desconcertante. A miséria tem mil faces e com a crise que assola o País ganha cada vez mais força e destaque na paisagem cotidiana das cidades brasileiras. Ela está estampada nos rostos de flanelinhas, carroceiros, meros pedintes, vendedores de balas, basqueteiros de cadeira de roda, ferramenteiros, mães com filho de colo, ambulantes diversos, desempregados sem teto, um contingente crescente e variado de necessitados que toma as ruas. Institutos atestam que há, hoje, cerca de 90 milhões de brasileiros classificados como miseráveis ou na linha da pobreza extrema – estatisticamente, cidadãos que sobrevivem com uma renda familiar inferior ao salário mínimo. Isso é mais de um terço da população total. Em meados dos anos 70 o numero não passava de 30 milhões e estava concentrado basicamente no campo. Os miseráveis migraram para as metrópoles. Montaram favelas e moradias improvisadas por onde podiam. Na virada do século já somavam perto de 60 milhões de excluídos e, de lá para cá, não pararam de crescer, a um ritmo de 3% ao ano. Nem mesmo os programas sociais implementados por seguidos governos foram capazes de barrar esse avanço e, com o atual corte de despesas na área, o universo tende a explodir.

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NECESSIDADE
Vivendo com oito filhos e o marido em um três cômodos numa
uma favela de São Paulo, Sandra Cezarina tenta sustentar
a família com menos de R$ 200 por mês

Um trabalho recém-concluído pelo pesquisador Samuel Franco, do Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade (Iets), com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), aponta que em quase 20% dos lares brasileiros nenhum morador tem atualmente emprego. Em um ano a alta foi de 770 mil famílias sem qualquer membro com rendimento de trabalho formal ou informal e – por tabela – com baixíssimas condições de bancar seus dependentes. A falta de trabalho é a maior chaga que pode acometer uma sociedade. Por trás dela vem o gradual empobrecimento da população. Percentualmente, a parcela dos lares onde ninguém está ocupado passou de 18,6% ao longo de 2014 para 19,3% no primeiro semestre deste ano. No período, quase um milhão de vagas foram sumariamente extintas. E muitos dos dispensados passaram a engrossar o mafuá dos cruzamentos, montando um verdadeiro pit stop de comércio persa nas esquinas, praças e avenidas. A pobreza fora de controle, com milhares de indivíduos sem perspectiva ou condições de sustento, retrata o Brasil desses dias, que mergulha na maior recessão dos últimos 25 anos.

Há dez meses Adilson de Souza Catarino, 39 anos, perdeu seu emprego como jardineiro na paróquia de Embu das Artes, cidade na Grande São Paulo. Continuou procurando vaga na área, mas só ouviu negativas. Depois que parou de receber o seguro-desemprego, e sem perspectiva de trabalho, não teve como bancar o aluguel e foi para as ruas do Centro de São Paulo. A mulher e os dois filhos estão em Minas Gerais, estado natal de Catarino. Sem perspectiva, ele faz um curso gratuito de pedreiro para conseguir uma colocação. “Quero retomar minha vida. Mas sem trabalho nem dinheiro, faz como?”, diz. Viver na rua e dormir em albergue tem sido uma experiência arrasadora para Catarino. Ele descobriu um mundo assustador, deprimente e corrosivo para a sua auto-estima. O aluguel que golpeou o jardineiro tem feito outras vítimas, justamente nas localidades mais pobres. Nas favelas, há registros de aumento de mais de 70% no último ano. Em Paraisópolis, por exemplo, na Zona Sul de São Paulo, um imóvel de dois cômodos custava no ano passado entre R$ 300 e R$ 380. Este ano, varia entre R$ 500 a R$ 700. Desempregado há um ano, William da Silva, 42 anos, viu as dívidas se acumularem neste período. Foi removido da casa onde vivia e hoje mora no barraco de três cômodos da sogra, numa favela de São Paulo, com a mulher e os cinco filhos. “Hoje, a principal dificuldade é que tudo está mais caro. Ver seu filho pedir um leite, um pão, uma bolacha e não poder dar marca muito”, diz William.

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Entre 2015 e 2016 os brasileiros devem perder cerca de R$ 280 bilhões de sua capacidade de compra, segundo estudo da Consultoria Tendências. É a primeira vez, desde 2004, que se registra recuo do poder aquisitivo após anos ininterruptos de crescimento do consumo. “A última coisa que comprei foi essa geladeira, há um ano e quatro meses”, aponta a alagoana Monica Maria Calixto, 41 anos, em São Paulo há 30, mostrando o eletrônico, desajeitadamente organizado em seu barraco de três cômodos. Desempregada há um ano e três meses e mãe de cinco filhos, ela não consegue mais pagar as contas de luz e de água. “Se for pagar, como vou dar de comer aos meus filhos? Fiz o cadastramento para receber o Bolsa Família em fevereiro e não recebi ainda”, diz a ex-auxiliar de limpeza que estudou até a quinta série do Ensino Fundamental, estava no mesmo emprego, com carteira assinada, há sete anos, e não consegue se recolocar. A queda de renda e de possibilidades, que atinge todas as camadas sociais, ganha contornos dramáticos na base da pirâmide onde se situam principalmente aqueles brasileiros com baixa escolaridade. Nesse universo, os demitidos da crise em vigor, com limitadas chances de recolocação, partem para fazer bicos aqui e ali. Das mais variadas maneiras. De preferência tomando as ruas, onde não é preciso esperar pela oferta de chefes e patrões, que desapareceram por esses dias. Catadores de papel, quinquilharias e latinhas, recicláveis de qualquer natureza, com suas carroças abarrotadas de peças que ninguém quer mais, aumentaram numa quantidade incomum. Segundo o Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis, há atualmente 800 mil catadores em atividade, 65% deles mulheres. A entidade acusa um aumento de 15% no último ano no número de pessoas nessa função. E a oferta dessa mão-de-obra, aliada ao custo dos compradores, fez cair o preço da sucata, exigindo jornada dobrada daqueles que se aventuram na atividade.

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Sandra Regina Ferreira Cezarina, 31 anos, é uma das mulheres que engrossaram as estatísticas dos catadores de latinhas. Demitida do emprego de auxiliar de limpeza, e à procura de trabalho há meses, passou a viver de catar recicláveis, o que lhe rende de R$ 60 e R$ 100 por mês. Junta a esse valor o Bolsa Família de R$ 112 da filha e é essa a renda da família de dez membros. Moradora em uma favela de São Paulo, Sandra vive num barraco de três cômodos – cozinha com apenas um fogão, banheiro e quarto com um berço e um colchão – com o marido também desempregado e oito filhos. “Minha maior dificuldade hoje é garantir o pão e o leite no dia seguinte. Arroz e feijão não consigo comprar todo dia”, diz.

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A disputa também é grande entre vendedores de alimentos. Nas feiras, nas barracas, no isopor. Com a mudança de estação, a cada dia mais quente, evapora a podridão de verduras, frutas, doces que se deixam cair na ânsia de convencer com rapidez os transeuntes. Depois de trabalhar durante 15 anos como segurança, José Luciano da Silva, 44 anos, sofreu um acidente de carro em dezembro e foi afastado do trabalho. Sem dinheiro e com a mulher também fora do mercado, decidiu vender frutas em uma das vias mais movimentadas da zona oeste de São Paulo. “Tendo um preço bom e sabendo trabalhar, dá para sobreviver” , diz. Silva trabalha das 6h às 20h, de segunda à sexta-feira, mesmo com o braço imobilizado por causa do acidente. Vende frutas a valores bem abaixo dos praticados na região – uma dúzia de banana sai por R$ 4 e um suco de 300ml de melancia, que na padaria mais próxima custa R$ 5,50, vende a R$ 2. Os limpadores de vidro que oferecem seus serviços nos semáforos são outros que se avolumam nas metrópoles. Everton Auto Ferreira da Silva, 28 anos, foi demitido de uma metalúrgica em 2013 e viu a rua como única alternativa. Tinha carteira assinada, um salário de R$ 1,2 mil, mulher e dois filhos pequenos, mas hoje, com todos os problemas que a demissão lhe trouxe, está separado e mal vê as crianças. Morador de Guaianazes, bairro no extremo leste de São Paulo, prefere trabalhar no centro da cidade e levar uma hora e meia para chegar até lá porque o movimento de carros é maior. A água e o sabão ele ganha em um posto de gasolina das proximidades. E diz não ver muita cara feia. “A maioria dos motoristas me dá algumas moedas.”

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Segundo Pedro Fassoni Arruda, cientista político da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, houve uma estagnação da redução da pobreza no País em razão da crise econômica. “Quem acaba pagando o custo são os mais pobres e a condução da atual política econômica sinaliza um aumento da pobreza. Acredito que há uma tendência para voltarmos a uma situação de precariedade.” Mas não é preciso consultar estatísticas ou tratados de sociologia para perceber que a miséria espreita a cada esquina e vai, de novo, rapidamente, mudando o cenário nas cidades brasileiras. Ela não se esconde mais nas favelas, cortiços ou áreas invadidas. Em qualquer lugar público estão lá seus protagonistas. E eles se multiplicam com o cair da noite. Aparecem de uma hora para a outra com cobertores, cadeiras e parcos utensílios para se acomodar em todo canto, debaixo das marquises ou nos bancos disponíveis. São inúmeros esses agrupamentos humanos, esparramados nos túneis e becos, que viraram rotina e transformaram os grandes centros urbanos num território de desesperados sociais. O fenômeno não é exatamente novo, mas há de se lamentar o fato de seu retorno e recrudescimento após a conquista da estabilidade do real e a promessa do surgimento de uma nova nação. O corte de R$ 9 bilhões, ou 50% do que foi gasto em 2014 no Programa Minha Casa, Minha Vida e nos projetos de educação como o Pronatec (corte de R$ 2,3 bilhões) e Ciências sem Fronteiras (corte de R$ 2 bilhões) só agravam ainda mais o processo de avanço dos excluídos. “A crise pode aumentar a população de rua”, diz Sônia Rocha, economista do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade e autora de “Transferências de Renda no Brasil – O Fim da Pobreza?”. “Pessoas mais vulneráveis acabam indo para as ruas empurradas por condições sócio econômicas muito graves.”

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Pelos critérios da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), a definição de pobreza extrema encontra outros critérios. É baseada na estimativa do valor de uma cesta de alimentos com a quantidade mínima de calorias capaz de suprir uma pessoa. De acordo com essa metodologia, o Brasil também vem registrando, desde 2013, aumento na quantidade de carentes. Eles somariam cerca de 30 milhões de brasileiros, 11 milhões dos quais na condição de miseráveis, vivendo com menos de R$ 77 per capita por mês, parâmetro estabelecido pelo Programa Brasil Sem Miséria. Nesse campo de análise o índice subiu de 3,6% para 4% da população. Pode parecer pouco em termos percentuais, mas representa um absurdo no tocante a regressão da qualidade de vida nacional. Há pelo menos um par de ano já era possível prever que estava sendo armado no Brasil um desastre social de proporções épicas, fruto direto de políticas, atitudes e decisões erradas por parte do Governo. Também era evidente que iriam faltar recursos para atender cidadãos humildes num país em que o Estado sustenta uma máquina capaz de torrar R$ 214 bilhões em um ano apenas para pagar os salários de seus funcionários. Na semana passada, ministros e políticos aliados voltaram a falar em redução de investimentos, dessa vez no Bolsa Família. Algo como R$ 10 bilhões, ou 35% do total, seriam cortados do Programa na proposta do relator do orçamento federal, deputado Ricardo Barros. A presidente Dilma resolveu barrar a manobra. “O último bastião vai ser mexer no Bolsa Família”, diz Alvaro Martins Guedes, especialista em administração pública e professor da Unesp. “Será tensão social e miséria absoluta.” Alheia às tramas em Brasília, Maria Aparecida Guimarães, 52 anos, vive com a filha e o neto num barraco minúsculo na cidade de São Paulo. Todos os adultos da casa estão desempregados e a família sobrevive com R$ 300 por mês do que chamam de “bicos”. Com isso, não é possível pagar aluguel, água, luz, nada. O pouco que têm vai para o gás e a comida. “Minha vida piorou muito”, atesta dona Maria Aparecida.

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Uma coisa é certa: nada tão previsível como a miséria brasileira após anos seguidos de desvios e má gestão das administrações petistas. Logo ela, que empunhava a bandeira do “tudo pelo social”, enterrou a oportunidade de ouro de conduzir o País para um novo papel no concerto das nações. Da mesma forma, nada tão inevitável como a mudança de patamar da miséria por aqui. Durante muito tempo os brasileiros se acostumaram a encarar as favelas dos centros urbanos como símbolos de um padrão miserável de vida. Elas perderam esse status. Mudaram de nome. Viraram comunidades. E a realidade dos últimos anos informa que a favela de outrora deixou de ser para qualquer um. No eixo Rio-São Paulo, por exemplo, o aluguel de um barraco pode chegar a R$ 2 mil. Resultado: cresce a quantidade de pessoas que não têm recursos sequer para morar numa favela, sobretudo nas que hoje contam com casas de alvenaria, luz elétrica e água encanada. Por isso mesmo é que o flagelo humano ganhou às ruas. Deixou de ser visto apenas como um incômodo estético para se converter numa terrível demonstração de abandono do compromisso oficial de erradicação da pobreza. A reportagem de ISTOÉ encontrou Marcelo Coelho, 45, numa fila para ganhar um prato de comida, dado pelas irmãs da instituição Madre Teresa de Calcutá, na Lapa, centro do Rio. Eletricista e pai de três filhos, Marcelo trabalhou 1 ano e 6 meses na CSL Siderurgia do Brasil, em Volta Redonda, no Rio de Janeiro, mas foi demitido há oito meses, devido a um corte de custos. Ao tentar a sorte no Rio de Janeiro, foi assaltado logo que chegou, e ficou sem documentos. Encontrou apoio na Instituição Madre Teresa  de Calcutá, que ajuda dando roupas e alimentação.  “Durmo na rua, onde der, mas não deixo de procurar emprego. Nessa condição de miséria, o sujeito fica sem dinheiro para tudo. É muita humilhação para quem já teve um lar, uma família, um trabalho”, diz Coelho, que mandou os filhos para a São Paulo, na casa do sogro.

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Discutia-se no passado como dividir o bolo da riqueza no País. Esse debate foi superado com a estabilização da moeda, ainda na era FHC, e a criação de programas como o Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio Gás e Fome Zero, reunidos todos eles depois sobre um mesmo guarda-chuva na gestão seguinte. Por mais exótica que fosse, a sociologia bandoleira de Lula cumpria uma missão. Resgatava para milhares de brasileiros o sentimento de dignidade. Mas a perpetuação da estratégia assistencialista, sem qualquer trabalho adicional no campo da preparação e aprimoramento do indivíduo para enfrentar os desafios do mercado e ganhar o próprio sustento, criou distorções como o nascimento de uma massa de acomodados, pessoas defasadas e dependentes das benesses do governo. Com a escassez em voga dos recursos estatais, muitos desses amparados perderam o chão. E o teto. Passando a habitar calçadões e viadutos.


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O problema, com perspectiva de piora, é que hoje em dia existem outros cidadãos disputando esses mesmos lugares. São desempregados da indústria e do varejo, profissionais da construção civil, aposentados maltratados pelas pensões miseráveis da previdência e toda sorte de gente que não tem dinheiro para pagar sequer o quarto de um cortiço. Desempregada há quatro meses, Ládis Rocha Ladislau, 49 anos mostra insistentemente sua carteira de trabalho, um símbolo de dignidade que carrega pelas ruas da Zona Sul do Rio de Janeiro, onde vive. Sem trabalho, sem dinheiro e sem o marido, que a abandonou, ela diz que a irmã e as sobrinhas moradoras do subúrbio também não quiseram recebê-la. Dormindo no bicicletário da Glória, sua rotina é totalmente diferente. “Não lavo roupa: uso até ficar muito sujo e jogo fora. E tomo banho em chafariz. Peço dinheiro e me alimento, a depender da bondade alheia. Mas ninguém gosta de ajudar”, diz a ex-auxiliar de serviços gerais, agora sem rumo depois que perdeu a casa. É cidadã de um país que começou a dar errado bem antes de o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, anunciar seu ajuste fiscal. Diga-se que fosse apenas a moradia sua dificuldade já seria um desafio monumental superá-la. Virar desabrigada é contar com a sorte a cada dia. Inclusive para não ser morto por desconhecidos ou bandidos que imperam nas madrugadas.

Pessoas como Ládis e outros brasileiros citados nesta reportagem podem ser definidas como cidadãos fora das estatísticas oficiais. É que para efeito de registro, os cálculos sobre miseráveis e desabrigados em geral consideram apenas aqueles com endereços fixos, que podem ser localizados. Uma incoerência absoluta! Decorre daí que provavelmente existam muito mais pessoas nessa situação no Brasil inteiro do que estimam os institutos com seus chutes numéricos. Embora o fenômeno epidêmico de moradores de rua esteja mais concentrado em casos clássicos de desajustados – mendigos, alcoólatras irrecuperáveis, drogados e doentes mentais – é fato que muitos ex-empregados estão enveredando por essa alternativa. E até trabalhadores ocupados assumiram essa condição devido os baixos soldos que recebem. A conclusão, aí, é perfeitamente clara. O trabalho, no Brasil, já não é suficiente para evitar que o indivíduo acabe perambulando sem destino pelos grandes centros.

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O que chama a atenção é que, em sua fase atual, a pororoca dos necessitados não faz distinção regional. Acomete com igual vigor metrópoles e pequenos municípios. Há um ano, Rosângela da Silva Santos, 37 anos, morava com seus oito filhos em uma casa alugada na cidade de Santa Maria, nos arredores de Brasília. O imóvel era pequeno: apenas um quarto, uma sala, uma cozinha, um banheiro e um quintal. Mas ela diz ter saudades de ter um teto para proteger sua família, “especialmente nos dias de chuva”. Hoje está morando em um terreno baldio do Plano Piloto. No município vizinho, ela trabalhava para uma cooperativa de reciclagem e contava com a ajuda do governo do Distrito Federal para inteirar o aluguel. Perdeu o benefício, não pode mais morar na mesma região e, longe da coleta, ficou desempregada. No terreno, escolheu a sombra de uma mangueira alta, fincou estacas de bambu, cobriu com uma lona preta e forrou o chão de terra batida com papelão. Recentemente, encontrou em um lixão uma mesa e bancos de madeira, que acomodou ao lado do barraco. Lá, seus filhos comem e fazem a lição da escola. O dinheiro que recebe é vindo do Bolsa Família, cerca de R$ 300, e de latinhas que recolhe na rua. “Sinto falta de poder abrir e fechar a porta de casa”, lamenta.. É um dado perverso no sistema brasileiro de desenvolvimento que os R$ 5,74 trilhões de PIB, segundo o Ministério da Fazenda – número inferior aos dos demais anos, mas ainda assim relevante -, não tenham impacto positivo direto na vida dessa significativa massa de aflitos. É um problema que transcende partidos, bandeiras ideológicas e disputas de poder. E que deveria motivar a todos por um grande pacto nacional em busca de saídas imediatas.

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