É interessante – para dizer o mínimo – constatar como as questões levantadas pelo 34º Panorama da Arte Brasileira irradiam em projetos de investigação urbana e geológica atualmente expostos em São Paulo. Daniel de Paula apresenta no escopo do projeto SITU uma instalação com amostras de rochas retiradas do sub solo da região metropolitana da cidade. Os objetos, coletados pelo artista em sua prática constante de garimpagem e pesquisa em depósitos do Estado, são resultantes de perfurações do subsolo para a execução de obras de mobilidade urbana. Dispostos sobre o piso de concreto da área externa da Galeria Leme, ganham o aspecto de monolitos ancestrais, mas intencionam problematizar os processos de obsolescência e descarte envolvidos em grandes projetos urbanísticos. “O solo, outrora símbolo de um presente inteligível, hoje vê a sua função social erodida pela substituição de seu valor de uso por um de troca, coerente com a manifesta transição de um tempo geológico para um outro do capital”, afirma Bruno de Almeida, curador do projeto SITU.

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INVENTÁRIOS
Obras de Moscheta (acima) e Daniel de Paula (abaixo) processam
rochas do subsolo e de margens de rio

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A poucos quilômetros dali, na Casa do Bandeirante, Marcelo Moscheta apresenta “Arrasto”, exposição-relato de expedição realizada em toda a extensão do Rio Tietê. Utilizando técnicas de catalogação de fragmentos arqueológicos, ele acondicionou em duas prateleiras pedras coletadas ao longo das margens direita e esquerda do rio, em uma operação associada pelo curador Douglas de Freiras a um “deslocamento da paisagem” – que no século 16 foi cruzada pela rota dos Bandeirantes rumo ao interior do Estado. Nenhum resquício da civilização moderna que matou as águas do rio Tietê foi colhido por Moscheta. Mas no centro da instalação o artista posicionou desenho em grafite de uma paisagem que não existe mais, a Cachoeira do Tietê, destruída por barragens e represas.