Com 1,56 metros e 83 quilos, a dona de casa paulista Amanda Abreu não demorou a ser diagnosticada com diabetes tipo 2. A doença, descoberta em 2006, mudou sua rotina. Ela aboliu os doces e passou a ingerir medicamentos diariamente. Em novembro de 2011, Amanda se submeteu à cirurgia de redução de estômago. Hoje, aos 30 anos, está 24 quilos mais magra e a enfermidade desapareceu. “Eu não tomei mais remédios, foi excelente”, diz. A dona de casa é a prova viva da conclusão a que chegou uma pesquisa publicada este mês pelo King’s College London, no Reino Unido, em parceria com a Universita Cattolica em Roma, na Itália. O estudo concluiu que operações bariátricas podem controlar a diabetes tipo 2. “A cirurgia vai se tornar uma importante opção terapêutica para a doença”, afirmou à ISTOÉ um dos responsáveis pelo trabalho, Francesco Rubino, professor de cirurgia bariátrica e metabólica no King’s College e cirurgião consultor no hospital da universidade.

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Eduardo e Amanda de Abreu, ambos diabéticos, comemoram os resultados
após a cirurgia: "Hoje posso comer chocolate de novo", diz a dona de casa

Animado com o resultado alcançado por Amanda, seu marido, o montador Eduardo de Abreu, seguiu o mesmo caminho. Diferente da mulher, ele sofre há 24 anos de diabetes tipo 1, forma mais grave da doença. Depois da redução de estômago, emagreceu e diminuiu de quatro para um e meio o número de frascos de insulina que recebe por mês. Para comprovar o que se observa em pacientes como Amanda e Abreu, a nova pesquisa acompanhou 60 obesos diabéticos entre 30 e 60 anos. O primeiro grupo, com 20 pessoas, seguiu o tratamento convencional, com medicamentos. As outras 40 realizaram operações de estômago. Metade dos pacientes que se submeteu à cirurgia controlou a diabetes. Em comparação, nenhuma pessoa apenas medicada superou a doença. Também foi observado uma diminuição nas complicações decorrentes da enfermidade entre os que fizeram a redução – o risco cardiovascular caiu pela metade e a qualidade de vida subiu. “A operação bariátrica pode influenciar vários mecanismos, enquanto as drogas alteram um por vez. Não é surpresa que o procedimento seja mais poderoso do que as medicações”, afirma Rubino.

A eficácia da cirurgia se dá por dois motivos. Primeiro, a obesidade. O excesso de peso pode causar diabetes tipo 2 porque faz com que a insulina, hormônio responsável pela passagem do açúcar do sangue para as células, não funcione direito. Segundo, e mais importante, porque o tubo gastrointestinal é um regulador da insulina. Alterá-lo cirurgicamente pode trazer efeitos positivos na produção do hormônio. Em outras palavras, se por um lado a magreza faz com que a insulina funcione melhor, por outro a produção do hormônio é otimizada pela retirada de partes do estômago e do intestino. “Este procedimento controla a diabetes”, afirma Pedro Luiz Bertevello, gastroenterologista da Beneficência Portuguesa de São Paulo.

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O próximo passo de Rubino será comprovar se só quem está acima do peso poderá se beneficiar, já que a nova pesquisa estudou pacientes com IMC superior a 35. Os especialistas consultados por ISTOÉ foram unânimes em dizer que ainda é cedo para recomendar o bisturi a pessoas com diabetes tipo 2 que estão em dia com a balança. Uma pesquisa conduzida pelo coordenador do Centro de Obesidade e Diabetes do Hospital Oswaldo Cruz de São Paulo, Ricardo Cohen, porém, mostrou que ele dá resultados em gordinhos moderados, com IMC entre 30 e 35. Ou seja, o procedimento não serve a todos os 387 milhões de diabéticos no mundo. “Mais de 10 milhões de brasileiros têm diabetes. Como operar todas essas pessoas? Eu mando alguns para a cirurgia, mas muitos não podem ir”, diz Walter Minicucci, presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes. Também por isso, o endocrinologista João Eduardo Nunes Salles, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, vê o método “como mais uma arma, não como solução”.

O Brasil deve ser o primeiro país do mundo com grande volume cirúrgico a regulamentar a ida para a mesa de operações em caso de diabetes. Profissionais e sociedades clínicas do País mandarão ao Conselho Federal de Medicina uma proposta para decidir as diretrizes da prática, que deve valer já este ano. Por enquanto, pessoas como Amanda aprovam a novidade: “Hoje posso comer chocolate de novo”, comemora.