Meteorologistas de todo o mundo estão acompanhando com espanto e especial atenção o aquecimento das águas no Oceano Pacífico na faixa em torno da Linha do Equador. Nos últimos dois meses, a temperatura na superfície do oceano tem aumentado de forma tão acelerada e anômala que boa parte dos cientistas começa a afirmar que neste próximo verão o mundo irá experimentar o mais potente El Niño já registrado na história. O fenômeno natural recorrente, que acontece ao menos uma vez a cada década, é caracterizado pelo aquecimento das águas do Pacífico e tem potencial para transformar de maneira profunda o clima em todo o mundo.

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EXTREMOS
No Nordeste (acima) a seca foi devastadora no último grande El Niño,
enquanto em Minas (abaixo) as chuvas causaram enchentes históricas

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Até hoje o El Niño mais devastador da história foi registrado em 1997. Naquele ano, tempestades poderosas na costa Oeste dos Estados Unidos e da América do Sul, além de secas e incêndios no Sudeste Asiático mataram mais de 20 mil pessoas. Estima-se que os eventos extremos causados pelo fenômeno natural tenham gerado prejuízos de mais de R$ 35 bilhões. “Este ano o aquecimento das águas do Pacífico está ocorrendo mais cedo e de forma mais repentina”, diz o meteorologista Mozar Salvador, do Instituto Nacional de Meteorologia, o Inmet. “Mas o grau de elevação tem sido maior do que o registrado em 1997 e, com base nesses dados, estamos acreditando que esse possa ser se não o maior, um dos maiores da história”, conta.

O El Niño é conhecido desde o século 19. Recebeu esse nome de pescadores peruanos em referência ao Natal e ao menino Jesus. A cada cinco ou sete anos os pescadores percebiam que as águas do Pacífico ficavam mais quentes que o normal e, com isso, havia mudanças tanto no tempo quanto na quantidade de peixes. Por seu pico ocorrer sempre no final do ano, ficou associado ao Natal. O fenômeno, no entanto, só passou a ter seus dados coletados na década de 1950 e, até hoje, o El Niño de 1997 havia sido o mais severo.

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Apesar de os efeitos mais fortes ocorrerem em geral em países banhados pelo Pacífico, o Brasil também é afetado de maneira agressiva pelo El Niño. Por aqui as características mais marcantes são um aumento anormal de chuvas na região Sul do Brasil e uma seca mais severa e prolongada no Nordeste e no Norte do País. A região sudeste fica em uma área de transição e, de acordo com a intensidade do fenômeno, pode ter verões mais secos ou chuvosos. No de 1997, por exemplo, Minas Gerais e Espírito Santo registraram chuvas torrenciais, assim como o Acre, que teve uma das maiores enchentes de sua história. E, no Sul, choveu muito mais do que a média, causando as trágicas enchentes tão comuns como as que ocorre em Santa Catarina.

No Nordeste brasileiro, principalmente nos estados mais próximos à Linha do Equador, houve uma seca severa, uma das maiores da história. No Leste da Amazônia, na região já próxima ao Cerrado, houve uma ocorrência incomum de queimadas. “Antecipar o que vai ocorrer no Centro do País e na região Sudeste é mais complicado, são áreas de transição, mas pelo que estamos vendo é muito provável que o Sul e o Nordeste, em especial o Norte do Nordeste, irão sofrer os impactos de um El Niño forte como esse”, diz Caio Coelho, pesquisador do Centro de Previsão do Tempo e de Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Cptec/Inpe).

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Apesar de antigo, ainda não se sabe exatamente porque o El Niño ocorre. Não se sabe, também, se ele tem alguma ligação com as mudanças climáticas que vem ocorrendo no planeta nos últimos anos. E nem mesmo se a forte intensidade que se prevê para este ano está de alguma forma relacionada ao aumento de emissão de gás carbônico na atmosfera. “Cientificamente ainda não temos como afirmar isso e não há um consenso na comunidade científica a respeito dessas correlações”, explica Coelho.

Apesar disso, é quase certo que 2015 seja o ano mais quente registrado em toda a história. Está, aliás, é mais uma característica de quando o El Niño resolve dar as caras.

Fotos: Marcio Fernandes/Folhapress; Fabiano Accorsi/Folhapress 


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