Em política não existe vácuo de poder. Fiando-se nesse princípio, o PMDB ocupa espaço e apresenta suas credenciais num momento de isolamento e fragilidade da presidente Dilma Rousseff. Na última semana, os peemedebistas fizeram vários gestos de modo a se colocarem como alternativa real de poder. Se até então o partido se contentava em ser uma espécie de apêndice do Planalto, na condição de maior partido da base de sustentação do governo, agora o PMDB demonstra apetite para ser o protagonista principal. Em breve, se as condições políticas e jurídicas assim permitirem, ou mais adiante. Durante evento de lançamento da plataforma digital na internet da Fundação Ulysses Guimarães, o vice-presidente Michel Temer falou sobre a necessidade de se buscar a “tranquilidade institucional” no País. “Temos de levar adiante a ideia de uma grande pacificação nacional”, afirmou ao lado de expoentes do PMDB.

PMDB-01-IE2.jpg
ELES ALMEJAM MAIS
Em evento na Fundação Ulysses Guimarães, integrantes da cúpula do
PMDB defenderam a candidatura própria à Presidência da República

Na atual circunstância, uma declaração como esta não é pouca coisa, sobretudo vindo do vice-presidente da República, que é o primeiro na linha sucessória de uma presidente frágil e sob o risco de afastamento. Mas Temer foi adiante. Disse que seu partido quer ter candidato à Presidência na eleição de 2018, após ser questionado sobre se a aliança com o PT terminará daqui a três anos. “O que está sendo estabelecido é que o PMDB quer ser, digamos assim, cabeça de chapa em 2018”, ressaltou o vice-presidente.

É em momentos de turbulência política, como o atual, que o PMDB gosta de aumentar o seu preço. Por isso, movimentos como os que o partido faz agora não constituem novidade. O que é novo – e até certo ponto supreendente – é a intenção do PMDB de elaborar um projeto para o País. Para o final deste mês está prevista uma reunião com governadores, prefeitos de capital e presidentes de diretórios onde será apresentada uma proposta de governo com 15 pontos. O projeto será posto em debate a partir de agosto – mês considerado crítico para a presidente Dilma, quando ela enfrentará protestos nas ruas e julgamentos decisivos no TCU e TSE. “Faremos uma proposta que emocione, gere confiança, seja factível e que as pessoas entendam”, afirmou à ISTOÉ o presidente da Fundação Ulysses Guimarães, Moreira Franco. Os pilares serão a estabilidade, o respeito aos fundamentos macro-econômicos, o equilíbrio fiscal, a liberdade de imprensa e a educação em tempo integral. Uma das bandeiras será a construção de um “País de classe média”.

PMDB-02-IE.jpg
RETALIAÇÃO
O café da manhã com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy,
na Câmara foi boicotado pelo líder do PMDB, Leonardo Picciani 

Enquanto o vice-presidente e o ex-ministro Moreira Franco planejam para 2018 o rompimento com o governo, figuras de proa do PMDB se antecipam. Na sexta-feira 17, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), anunciou sua ruptura de maneira oficial, elevando ainda mais a temperatura da crise. Ele disse estar convencido da participação do que chamou de “um bando de aloprados” do Planalto na ação “persecutória” do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para conseguir elementos para incriminá-lo no Petrolão. “Não vou aceitar que me arrastem para a lama. Por essa razão, me considero rompido com o governo. E vou tentar que meu partido vá para a oposição”, afirmou. Horas antes, em reunião com aliados, o peemedebista prometeu “explodir o governo”. Depois do anúncio, no entanto, o vice Michel Temer fez questão de dizer que a decisão de Cunha era pessoal e sem respaldo do partido.

Eduardo Cunha se transformou numa pedra no sapato do Planalto no Congresso desde que ele ascendeu ao comando da Câmara a contragosto de Dilma. O que atiçou ainda mais ira de peemedebista foi a disseminação da informação, semana passada, de que ele seria denunciado na Lava Jato. Na quinta-feira 16, ele foi implicado no escândalo pelo consultor Júlio Camargo, da Toyo Setal. Em depoimento, Camargo afirmou que Cunha pediu US$ 5 milhões em propina em um contrato de navios-sonda da Petrobras. O pedido teria sido feito durante um encontro dos dois no Rio, que contou também com a presença de Fernando Baiano, lobista do PMDB. Para Cunha, o governo estaria por trás das ações para miná-lo. “O delator foi obrigado a mentir. Há um objetivo claro de constranger o Legislativo e que pode ter o Executivo por trás”, disse.

Embebido em fúria, o presidente da Câmara passou a consultar juristas sobre o pedido de impeachment apresentado pelo Movimento Brasil Livre. Pretende ter uma opinião sobre o assunto em 30 dias. Até pouco tempo, considerava o tema impensável. Cunha sinalizou ainda que poderá instalar no segundo semestre uma série de CPIs com potencial de tirar o sono do Planalto, como as do BNDES e dos Fundos de Pensão. Na mesma toada da retaliação ao Planalto, o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani, não compareceu nem ao café da manhã e nem à audiência do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, na Câmara. Ele alegou incompatibilidade de agenda. Ninguém acreditou.

Outros integrantes da cúpula do PMDB participam de articulações mais sofisticadas. Conforme apurou ISTOÉ, líderes do partido procuraram o PSDB para sondá-los sobre um possível apoio a Michel Temer, em caso de impeachment da presidente. Os tucanos estão divididos, mas uma ala expressiva da legenda adota a lógica consagrada pelo deputado Tiririca segundo a qual “pior que está, não fica”.

Ailton de Freitas/AgÊncia O Globo; José Cruz/Agência Brasil