Michel Houellebecq não quis promover o lançamento de “Submissão”. Nem precisou. O atentado contra o jornal “Charlie Hebdo”, em 7 de janeiro, que ostentava uma caricatura sua no dia da tragédia, e toda a repercussão mundial que se seguiu ao ataque, foram suficientes para colocar o novo romance no topo das listas de espera das livrarias de todo o mundo. Em menos de três meses foram comprados mais de um milhão de exemplares da novela provocativa só na França, na Itália e na Alemanha.

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MALDITO
O autor fala em seu romance de uma França que
elege o islã por falta de opção melhor 

O livro, que agora chega ao Brasil pela editora Alfaguara, divide a crítica europeia de maneira contundente.

O francês “Monde” contraindicou o romance, tratando-o como um libelo direitista. Mas também a direita se incomodou com o retrato pintado pelo escritor das eleições presidenciais de 2022, no qual Marine Le Pen, presidente da Frente Nacional, teria perdido para uma certa Fraternidade Muçulmana. O presidente eleito Mohammed Ben Abbes, da Fraternidade, passa a resolver grandes problemas, como desemprego e a imigração, usando o Corão.

A Sorbonne se torna uma universidade islâmica financiada por emires riquíssimos e seu reitor se casa com três esposas, uma delas adolescente. Houllebecq conseguiu o que queria. Espetou todos: o islã, a direita, a esquerda, as instituições que os representam.

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VENTILADOR
Na mesma história, o escritor ofendeu a direita e a esquerda de seu país

O personagem principal, um professor universitário afundado em um estado patético de desconexão com seu tempo, ainda procura o homem de esquerda que pensa um dia ter sido. Ninguém escapa do veneno do autor: as estudantes, a namorada judia, as segundas e terceiras esposas asseguradas pelo direito divino de não trabalhar. Mas o fato maior é que ele destila sua toxidade com uma percepção irônica da realidade, como o cartoon que o retratava como um bruxo prevendo o futuro na primeira página do “Charlie Hebdo” no dia do assassinato de 12 de seus mais importantes colaboradores por homens armados com fuzis Kalashnikov, gritando “Alahu al akbar” (“Deus é grande”).

Foto: Nicolas guerin/Getty Images