Durante décadas, o Rio de Janeiro defrontou-se com o enfraquecimento progressivo das instituições públicas ao mesmo tempo que o reordenamento de forças criminosas constituía um poder paralelo, ávido por ocupar o espaço deixado pelas autoridades. Nesse processo, o carioca conheceu a submissão política e a corrupção de agentes da lei, que resultaram na transformação do Rio em uma das cidades mais perigosas do Brasil. Isso, porém, está ficando para trás. O divisor de águas aconteceu em 2008, um ano após o governador Sérgio Cabral (PMDB) assumir o Estado e criar, com o secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, um corajoso projeto de retomada de controle das comunidades pobres. Em 19 de dezembro daquele ano foi instalada a primeira Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), no Morro Santa Marta, em Botafogo, na zona sul. Até agora, são 38 unidades espalhadas pelas favelas cariocas. E Beltrame anuncia outra novidade: a UPP do asfalto, como são chamadas as CIPPs, sigla das Companhias Integradas de Polícia de Proximidade. A primeira foi cravada na terça-feira 24, na Tijuca. “Esse é o desfecho do programa de polícia pacificadora”, diz Beltrame. “UPPs nos morros e CIPPs embaixo, todos alinhados numa política só.”

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A expectativa é de que até 2018 as CIPPs tenham se transformado em referência no País. “Vamos otimizar o efetivo para ter mais qualidade”, disse, em nota, o comandante-geral da PM, coronel Alberto Pinheiro Neto. Já o projeto das UPPs será encerrado com 44 ou 46 unidades, segundo Beltrame. Para resumir o benefício que a iniciativa levou às áreas pobres, basta dizer que o índice de homicídios dentro nas favelas com UPPs é de oito por 100 mil habitantes, abaixo até do que a ONU considera aceitável (dez homicídios por 100 mil). O secretário Beltrame diz que a consolidação desse trabalho só será possível com o que chama de UPP social, que consiste em um processo conjunto com escolas, creches e hospitais. Beltrame está exultante com a criação de uma Comissão Executiva de Monitoramento e Avaliação da Política de Pacificação (CEMAPP). A nova entidade tem a missão de planejar a ocupação social das favelas, em parceria com o governo federal, ONGs, entidades internacionais e o setor privado. “As UPPs não são só um projeto de segurança, mas uma política de Estado que traz esperança para a população”, diz o secretário.

Seria ingênuo dizer que as favelas pacificadas se tornaram paraísos imunes à ação dos criminosos. Dispostos a reaver territórios e a desmoralizar a polícia, de tempos em tempos traficantes entram em ação para disseminar a violência. Uma das táticas é dar tiros a esmo e tentar, assim, lembrar os moradores dos anos de medo e tirania. “Os criminosos querem que os moradores pensem que a UPP foi embora”, diz Beltrame. A estratégia, garante ele, não tem funcionado. “A principal facção criminosa do Rio está esfacelada, o Comando Vermelho não tem mais um comando e nas áreas ocupadas não há mais uma liderança”, diz o secretário. Trata-se, enfim, de um vitória de toda a cidade.

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NAS ALTURAS
Teleférico no Complexo do Alemão, onde funcionam quatro UPPs (topo)
e o secretário Beltrame: símbolos da luta contra o tráfico

A maior ofensiva contra o tráfico de drogas foi no Complexo do Alemão, que reúne 15 favelas e recebeu quatro UPPs com a união de forças estaduais e federais, algo inédito no País. Antes da pacificação, o Alemão era estratégico para o tráfico. Ali funcionava o QG do Comando Vermelho, que controlava a circulação de moradores e impedia o acesso da polícia ao morro. Após as UPPs, o Alemão se tornou um lugar diferente. O símbolo dessa nova fase é o bondinho inaugurado em 2011. Além de atrair uma legião de turistas, ele serve como meio de transporte para os moradores. Agora todos podem desfrutar de um lugar que, depois de muitos anos, conseguiu deixar a rotina da violência para trás.

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Fotos: Marcelo Regua/UOL; Fernando Frazão/Agência Brasil  


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