Até o início de fevereiro, as grandes bancas de advogados de empresas acusadas de participar do esquema de corrupção da Petrobras temiam que algumas das empreiteiras fizessem amplo acordo na Justiça, com delação premiada de seus executivos e pacto de leniência para as entidades jurídicas. O pesadelo dos investigados estava prestes a se materializar com o avanço das conversas da gigante Camargo Corrêa com integrantes da força-tarefa do Ministério Público e da Controladoria-Geral da União (CGU). As empresas OAS e UTC também flertavam com a chance de entregar detalhes do esquema em troca da atenuação de penas que a Justiça decidirá futuramente. Nos últimos dias, porém, houve uma inflexão. Os representantes das construtoras encerraram as conversas e as negociações ganharam termos inegociáveis. Advogados das empreiteiras ouvidos por ISTOÉ afirmam que CGU e MP ofereceram “muito pouco” em troca da delação. Por isso, preferiram aguardar o desenrolar dos processos.

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MUDANÇA DE RUMO
Empreiteiras se negaram a pagar multas bilionárias em troca da colaboração

Para aliviar as punições às empreiteiras, os procuradores propuseram garantias institucionais para que elas mantivessem contratos com a União. Como compensação, as empreiteiras pagariam multas pesadas. A proposta não foi considerada vantajosa pela maioria delas. A Camargo Corrêa, por exemplo, achou exorbitante o valor da multa estipulado pelos negociadores do acordo de leniência: R$ 1,5 bilhão. Os advogados tentaram, em vão, reduzi-la para R$ 500 milhões. Diante do impasse, encerraram as conversas. O advogado Antônio Cláudio Mariz, que defende o vice-presidente da Camargo Corrêa, Eduardo Leite, confirma que a discordância no valor da multa inviabilizou a colaboração nas investigações. “O acordo da empresa não deu certo em relação a valores”, afirmou.

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ESTACA ZERO
Dalton dos Santos Avancini, presidente da Camargo Corrêa, recomendou que
seus advogados negociassem a redução da multa à empreiteira,
em troca da delação premiada, mas o acordo não avançou

Aos executivos das empreiteiras, os representantes do MP e da CGU ofertaram a atenuação de penas e o relaxamento de pedidos de prisão preventiva. Mas os dirigentes não se sensibilizaram. Os executivos das empreiteiras do cartel argumentam que não há benefícios diretos na estratégia de assumir culpa por crimes administrativos. “Com as pessoas físicas, ainda não houve desfecho das tratativas, mas o Eduardo Leite já conversou com o Ministério Público nesse sentido”, acrescentou o advogado Antônio Cláudio Mariz. Depois da divulgação do conteúdo dos depoimentos de delação premiada de outros investigados, os empreiteiros da Camargo Corrêa e da UTC chegaram à conclusão de que a colaboração com a Justiça provoca efeito mais negativo do que o cumprimento de penas. A exposição pública das empreiteiras como resultado da delação, avaliam, afeta diretamente a imagem da empresa e, de quebra, inviabiliza a retomada profissional dos executivos. Os advogados dizem acreditar, ainda, que a redução da pena na hipótese de delação premiada seria muito pequena, pois os grandes acordos já foram fechados com o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Pesa ainda na nova estratégia o fato de o TCU e a Advocacia-Geral da União (AGU) estarem trabalhando num acordo de leniência que permite às empresas continuarem no mercado das obras públicas. Nesse sentido, alguns executivos asseguram contar com o ex-presidente Lula.

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VOLTOU ATRÁS
O presidente da UTC, Ricardo Pessoa, que teve negado o pedido de
habeas corpus feito no STF, era a adesão mais aguardada à delação,
mas de última hora resolveu permanecer em silêncio

A morosidade da Justiça e as amplas possibilidades de recursos e artifícios jurídicos para empurrar por longos anos as sentenças contra os executivos também jogam contra o acordo de colaboração, admitem os representantes das empreiteiras. Nesse cenário, não haveria razão para reconhecer a culpa. Mariz afirma ainda que os defensores de investigados da Lava Jato sentiram falta da regulamentação dos acordos de colaboração pela presidente Dilma Rousseff, previstos na Lei 12.846, conhecida como Lei Anticorrupção. “Falta regulamentar a delação. É um assunto novo, eu advogo há 45 anos e nunca me deparei com isso. A delação é comum no direito americano, onde tudo se resolve no pagamento. Aqui é diferente, a solução de conflitos se dá no processo. Por isso, demanda uma regula­mentação.”

Não se pode deixar de considerar que influiu na mudança de tática das empreiteiras a possível alteração do foco da Operação Lava Jato. A expectativa dos advogados é de que, com a divulgação da lista de políticos envolvidos, prevista para as próximas semanas, os holofotes saiam de Curitiba, sob a batuta do juiz Sérgio Moro, e se voltem para Brasília, mais precisamente para o Supremo Tribunal Federal, instância na qual os processos tramitarão.

Na semana passada, Eduardo Leite e os executivos João Auler e Dalton Avancini, da mesma empreiteira, além do presidente da UTC, Ricardo Pessoa, tiveram negados os pedidos de habeas corpus feitos no STF. Eles estão presos há três meses na carceragem da Polícia Federal em Curitiba. Esperam, no entanto, que o cenário mude com a volta dos políticos à ribalta.

Fotos: Rafael Andrade/Folhapress; Daniel Wainstein/folhapress; MARCOS BEZERRA/FUTURA PRESS