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"O estudo é importante porque avança no entendimento do
papel que as mutações aleatórias podem ter no câncer"
Fernando Maluf, oncologista 

Doutor, por que eu? Não é tarefa fácil para os oncologistas darem respostas a essa pergunta, especialmente quando ela é feita por pessoas que seguem todas as regras do estilo de vida saudável e não apresentam fatores de risco como a hereditariedade, mas, ainda assim, têm câncer. Um estudo publicado recentemente pela revista “Science” apontou um elemento que até agora não tinha sido suficientemente valorizado e pode ajudar a entender essas situações: o acaso. De acordo com o oncologista Bert Vogelstein e o biomatemático Cristian Tomasetti, ambos da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, dois terços dos casos de câncer (o equivalente a 65% dos tumores estudados) surgem por causa de mutações aleatórias na divisão celular natural do organismo. Uma espécie de má sorte biológica.

As alterações casuais a que se referem os dois especialistas, surgidas sem nenhuma razão em particular a não ser o acaso, estariam na origem de 22 dos 31 tumores analisados na pesquisa. Entre eles, os tumores de pâncreas, testículos, ossos, cérebro. O câncer de mama e de próstata foram excluídos do estudo porque os cientistas não encontraram informações suficientes para inseri-los na pesquisa. “Há casos em que a verdadeira razão não é porque a pessoa se comportou bem ou mal ou teria sido exposta a alguma má influência ambiental. É apenas porque essa pessoa não teve sorte”, resume o cientista Volgestein.

O trabalho mostrou ainda que outros nove tipos, incluindo o câncer colorretal, o carcinoma de células basais (pele) e o câncer de pulmão, foram mais fortemente influenciados pelos genes herdados e por fatores como o comportamento de risco ou exposição a agentes cancerígenos. As conclusões foram recebidas com cautela pelos médicos. Para Paulo Hoff, diretor de oncologia do Sírio-Libanês e do Instituto do Câncer de São Paulo (Icesp), o estudo reafirma a ideia de que nem sempre há explicação para o surgimento do câncer. “Porém é certo que os fatores de risco aumentam as chances de que isso aconteça”, diz o médico. Na opinião de Fernando Maluf, chefe do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes, em São Paulo, a pesquisa avança na compreensão do peso que podem ter as mutações imprevisíveis, a hereditariedade e os fatores de risco também. “Mas ainda é necessário entender por que pacientes com essas mutações aleatórias podem ter maiores chances de manifestar alguns tipos de câncer.” 


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