PINTURAS DE ONDA, MATO E RUÍNA/ Galeria Millan/ até 8/11
RESISTÊNCIA DA MATÉRIA/ Editora Cobogó/ 224 págs/ R$ 140

Na era da reprodutibilidade de imagens em aceleração máxima, quando 60 milhões de fotos são postadas diariamente no instagram, a pintura é resistência. Uma pintura com densas massas de tinta pode desafiar a imaterialidade da imagem e se tornar tão concreta quanto uma paisagem real. Assim pensa Rodrigo Andrade, artista militante da pintura, que já realizou trabalhos em vídeo e flertou com o cinema. “A imagem é a anti-matéria, o cinema é pura luz e a pintura traz a imagem de volta para o mundo das coisas”, diz Rodrigo Andrade, que expõe 20 pinturas inéditas na Galeria Millan até o sábado 8.

abre.jpg
CONCRETUDE
Massa de tinta em "Bosque Verde" confere à pintura uma realidade material

A exposição é composta por duas séries de pinturas de paisagens construídas com grossas camadas de tinta a óleo. No térreo, quatro telas em grandes dimensões representam ações corrosivas e destrutivas causadas por fenômenos naturais: o tsunami e o tempo. No primeiro andar, a série de “Bicromias” aprofunda os mesmos temas – a onda, o mato e as ruínas –, reduzindo a dimensão do quadro e sintetizando a representação em duas cores. Embora fortes – em amarelo, rosa, azul –, as bicromias remetem ao cair da noite. Se as grandes pinturas do térreo parecem ter sido pintadas ao meio-dia, as bicromias têm o tempero do lusco-fusco.

Ambas as séries exalam, no entanto, a mesma melancolia de um certo “imaginário da catástrofe” que, segundo o crítico Tiago Mesquita, ronda a pintura de Andrade há anos, desde a série “Matéria Noturna” (2011), apresentada na 29ª Bienal de São Paulo. A escuridão e os meios-tons que predominam nos últimos cinco anos da produção do artista estão reunidos no belíssimo livro “Resistência da Matéria”, organizado por Mesquita e com projeto gráfico de Daniel Trench.

ARTES-03-IE-2345.jpg
BICROMIAS
Pintura "Bosque Roxo e Amarelo" realizada a partir de fotografia de August Sander

Mas embora se configurem como gestos de “resistência da matéria”, suas pinturas figurativas recentes são sempre realizadas a partir de imagens fotográficas. No caso específico dessa nova individual, a partir de fotos de August Sander, Don McCullin e Daido Moriyama. Esse é sem dúvida o aspecto paradoxal que alimenta a complexidade, a densidade e a profundidade da obra de Rodrigo Andrade. Para além da espessura de sua tinta.

Fotos: Eduardo Ortega