Famosa por seu impressionante acervo de três mil pares de sapatos, com marcas como Gucci, Ferragamo, Chanel, Prada e Christian Dior, a ex-primeira-dama das Filipinas Imelda Marcos, 85 anos, também era uma voraz colecionadora de obras de arte. A viúva do ex-ditador Ferdinand Marcos (1917-1989), que esteve à frente do país por mais de 20 anos, de 1965 a 1986, manteve em sua casa uma coleção de cerca de 150 obras assinadas por artistas do quilate de Picasso, Gauguin e Miró. Oito delas teriam sido apreendidas na terça-feira 30 sob suspeita de terem sido compradas indevidamente com dinheiro do Estado. Segundo o porta-voz do governo das Filipinas, Nick Suarez, ainda é necessário determinar “quais e quantos quadros” foram retirados da rica propriedade da família.

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Acima, Imelda Marcos em sua casa, com algumas de suas obras
de arte ao fundo. Abaixo, parte da coleção de três mil pares de
calçados exposta no museu Marikina, nas Filipinas

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A apreensão faz parte de um intrincado processo judicial no qual o governo filipino acusa o governo de Ferdinand Marcos de ter utilizado o dinheiro do Estado em seu próprio interesse. Calcula-se que o casal Marcos tenha desviado cerca de US$ 10 bilhões (R$ 24,5 bilhões) dos cofres públicos enquanto esteve no poder, em propriedades, joias, dinheiro e outros bens, quantia essa que nunca foi recuperada. O valor das oito obras apreendidas não foi divulgado, mas elas devem representar uma pequena fortuna, pois são assinadas por Picasso, Michelangelo, Miró, Gauguin, Francisco de Goya, Pierre Bonnard, Bernard Buffet e Camille Pissarro. Entre os 150 quadros, há exemplares de Van Gogh, Rembrandt e Monet, que também podem ser apreendidas. O advogado da família Marcos, Robert Sison, disse que o confisco judicial é altamente questionável e que não estava incluído no caso que o governo filipino abriu contra a família, há mais de uma década. 

Mesmo tendo sob suas costas dezenas de acusações de fraude e corrupção, Imelda não amargou um único dia na cadeia. A extravagante ex-primeira-dama, que ganhou concursos de beleza na juventude, foi readmitida nas Filipinas em 1991, após fugir para o Havaí em 1986, com a queda do marido durante uma revolta popular. Ferdinando já havia morrido, aos 72 anos, no exílio – na ocasião Imelda tinha 60 anos de idade. Quando voltou, a viúva trouxe consigo o corpo embalsamado do marido que hoje é exposto ao público como um herói filipino. No ano seguinte ao seu retorno, ela tentou entrar na carreira política, na esteira da imagem do falecido, porém só em 1994 conseguiu assumir o cargo de deputada, permanecendo na função até 1998. Desde então ela continua presente na política e em 2010 voltou a se tornar deputada, sendo a mais votada do país. Entre os anos de 2007 e 2008 enfrentou julgamento por corrupção, mas, à época, foi absolvida.

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Os filhos do casal também ingressaram na vida pública. Ferdinando Jr., 54 anos, foi eleito senador. Imée, de 56, governadora da província de Ilocos Norte, reduto da família. Além dos dois, o ditador e Imelda tiveram Irene e Aihmeé. Há dois anos, a ex-primeira-dama viveu outro contratempo, justamente com seus objetos de maior apreço: seus incontáveis e célebres pares de sapatos. Grande parte de sua coleção foi destruída por inundações e cupins – ela havia deixado 1.220 exemplares para trás quando saiu do país em 1986. Cerca de 765 pares permanecem conservados no museu de Marikina, nas Filipinas.

O advogado Ferdinand Marcos começou sua trajetória política nas Filipinas em 1949, ao ser eleito para a Câmara dos Representantes. Em 1959, chegou ao Senado e, em 1964, foi eleito presidente do país pelo Partido Nacionalista – e reeleito em 1969 e 1981. Durante o seu governo, realizou reformas econômicas e sociais e elaborou uma nova Constituição em que atribuía mais poderes à presidência. Recebeu uma forte oposição, o que o levou a prender seus opositores e a instaurar a lei marcial, em 1981, mesmo período em que se intensificaram a corrupção, a pobreza e as guerrilhas no país. Em 1986, foi declarado oficialmente vencedor das eleições, mas houve forte suspeita de fraude eleitoral. Foi então que Marcos fugiu para o Havaí, em meio à Revolução do Poder Popular. Em seu lugar, subiu ao poder Corazón Aquino, viúva de Benigno Aquino, assassinado em 1983, um de seus grandes opositores.