Nos corredores do poder em Brasília, “xeique” é o apelido usado para designar empresários influentes que embolsaram bilhões nos anos dourados da gestão petista à frente da Petrobras. Na quarta-feira 24, ao aceitar os termos de um acordo de delação premiada, o doleiro Alberto Youssef prometeu entregar nomes e detalhes das operações que criaram esses novos bilionários. Em seu depoimento, conforme ISTOÉ apurou, será explicado o esquema de pagamento de propinas e lavagem de dinheiro, que inclui, segundo o doleiro disse a procuradores, a criação de até cinco estágios diferentes de off-shores em paraísos fiscais. “São como cascas de uma cebola ou aquelas bonecas russas, que se fecham uma dentro da outra”, disse uma fonte ligada à investigação.

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HOMEM BOMBA
O doleiro Alberto Youssef simulou mais de 3,6 mil operações de
importação e exportação que movimentaram bilhões

Informações obtidas pela reportagem indicam que, para escapar dos vários processos em que é réu, o doleiro tem a intenção de revelar como o esquema financeiro paralelo criado desde a época do mensalão, em parceria com o falecido deputado José Janene (PP), continuou abastecendo contas de partidos e políticos. Confirmada a disposição do doleiro em contar tudo o que sabe e vivenciou, o tamanho da lista de ministros e parlamentares delatados pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa pode dobrar. Pelo papel central que detinha na organização criminosa herdada de Janene, morto em 2010, o MPF espera que Youssef contribua também para a compreensão mais ampla de um esquema que drenou recursos, não apenas da Petrobras, mas dos Ministérios de Minas e Energia, Cidades, Integração, Saúde e Transportes, além de bancos públicos e estatais elétricas.

Para os procuradores que compõem a força-tarefa da Lava Jato, sem as informações de Youssef seria impossível rastrear o destino dos recursos que foram desviados de obras públicas. Apesar dos evidentes indícios de superfaturamento em grandes projetos, como o da Refinaria de Abreu e Lima, que, segundo o TCU, já chega a R$ 1,7 bilhão, o MP quer saber como o dinheiro foi “esquentado” em operações de comércio exterior e da estruturação de créditos para projetos de fachada, além dos números das contas bancárias no exterior. Já se sabe, por exemplo, que Youssef simulou mais de 3,6 mil operações de importação e exportação que movimentaram ao todo R$ 1 bilhão em contas de instituições financeiras de 24 países na América.

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DELAÇÃO
Operação Lava Jato da Polícia Federal poderá ter
desdobramentos com novas revelações do doleiro

Um dos procuradores do grupo disse à ISTOÉ que a quebra dos sigilos bancários de pessoas físicas e jurídicas arroladas no inquérito até agora revelou menos do que se esperava. Não há mais “saques na boca do caixa” como no mensalão. “Eles refinaram o pagamento de propina”, diz o procurador. Nas conversas informais que levaram ao acordo de delação, que ainda precisará ser homologado, Youssef explicou que a Bolsa de Valores tornou-se um dos melhores ambientes para fraudes financeiras.

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Segundo ele, a atual matriz energética brasileira, concebida à época em que José Janene presidia a Comissão de Minas e Energia da Câmara e Dilma Rousseff era ministra do setor, tornou-se uma grande bolha de especulação, um campo fértil para fraudes. “Se falta energia no Brasil é porque 70% das empresas do setor não existem de fato e nunca existirão”, disse o doleiro. Ele explicou que o esquema consiste na abertura de empresas de fachada, também chamadas de “power-point”. Com ajuda de agentes públicos, elas são autorizadas a comercializar ativos, alavancando recursos no mercado financeiro por meio de corretoras de valores, que recorrem a fundos de investimentos – especialmente os grandes fundos de pensão. A anuência política garante a concessão de linhas de crédito público, como do BNDES. Mas esses empréstimos nunca serão pagos. O dinheiro desaparece após uma série de incorporações feitas por empresas de investimentos, participações ou holdings financeiras controladas por off-shores em paraísos fiscais.

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Como se vê, é um sistema complexo de fraudes que se utiliza das vias legais. Youssef revelou, por exemplo, que muitos bancos pequenos e médios que quebraram nos últimos dez anos foram usados para lavar dinheiro do esquema. Ele promete entregar os nomes. Assim como o de funcionários de grandes bancos e servidores de órgãos de controle que teriam sido coniventes com a operação, como já apontaram os depoimentos da doleira Nelma Kodama, e do operador de câmbio Lucas Pacce. Réu em seis ações decorrentes do inquérito da Lava Jato, Youssef corria o risco de pegar condenação superior a 50 anos de prisão. O doleiro passou a cogitar a delação premiada depois que Paulo Roberto Costa decidiu fazer o acordo. Ele também sofreu pressão da família.  


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