Três anos e muitos fios de cabelo branco separam os dois discursos mais relevantes do presidente americano, Barack Obama, em relação ao Iraque. Em 2011, ele se cercou da mulher, Michelle, e de soldados na base militar de Fort Bragg, na Carolina do Norte, para anunciar o plano de retirada das tropas americanas do Iraque depois de quase nove anos de guerra. Era a entrega de uma promessa de campanha. “O futuro do Iraque estará nas mãos de seu povo”, disse. “Estamos deixando para trás um país soberano, estável e autossuficiente.” Na quarta-feira 10, Obama apareceu sozinho na Casa Branca para anunciar uma nova ofensiva no Iraque – é o quarto presidente americano consecutivo a fazê-lo. Desta vez, o inimigo é o Estado Islâmico (EI), grupo extremista que luta para estabelecer um califado na região e que recentemente decapitou dois jornalistas americanos. A ação tem o objetivo final de destruí-lo, o que, se bem-sucedida, só deve acontecer no governo do próximo presidente dos Estados Unidos.

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EM BUSCA DE APOIO
O presidente Barack Obama tentará formar uma coalizão internacional
para combater os jihadistas do Estado Islâmico

Na estratégia militar anunciada, os EUA devem enviar mais 475 conselheiros ao local, além de ampliar os ataques aéreos contra os radicais e aumentar o apoio às forças que combatem o EI em solo, leia-se o Exército iraquiano, o curdo e a oposição síria, como já têm feito há meses. No entanto, para Andrew Terrill, professor do Instituto de Estudos Estratégicos do U.S. Army War College, da Pensilvânia, agora é diferente. “Ter um foco mais intenso no EI e a presença maior de conselheiros na região não é o mesmo que fornecer dinheiro e armas. É muito mais eficiente”, disse à ISTOÉ. O envio de tropas americanas, que chegou a 150 mil na guerra iniciada por George W. Bush, não está incluído no plano de Obama. “Nós poderíamos enviar nossos próprios soldados”, afirma Terrill. “Mas, se quando sairmos de lá o Iraque não tiver lidado com seus problemas fundamentais, algo pior acontecerá.” Peter Robert Demant, professor da Universidade de São Paulo, diz que essa foi a maior lição das guerras anteriores. “Em 2003, os americanos planejaram bem a conquista militarmente, mas não planejaram bem uma ocupação prolongada. O que ficou foi uma estrutura fraca demais para se sustentar sozinha”, diz.

É na Síria, contudo, que estão os maiores riscos. Primeira intervenção ocidental no país desde o início da guerra civil, em 2011, a ofensiva americana pode ter efeito ambíguo. No ano passado, Obama considerou liderar uma investida para derrubar Bashar al-Assad depois de denúncias de que ele usava armas químicas contra seu próprio povo, mas recuou. Agora os dois veem o EI como um inimigo comum, já que, como Washington, os extremistas querem Assad longe do poder. “Enfraquecê-los poderia ajudar o governo sírio a recuperar território”, diz Austin Long, professor do Instituto de Guerra e Paz Arnold Saltzman, da Universidade de Columbia, de Nova York. A Rússia, que apoia Assad, já avisou que uma intervenção sem o aval do Conselho de Segurança da ONU será uma violação do direito internacional. Nas próximas semanas, Obama usará o fórum para a difícil missão de convencer os russos a não usar seu poder de veto.

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AMEAÇA
Os guerreiros do Estado Islâmico sequestram, escravizam e
decapitam seus inimigos. O objetivo é construir um califado

Esse é o último ponto estratégico da nova operação militar. Durante seu discurso, o presidente americano deixou claro que essa não é uma luta isolada dos EUA e que quer trabalhar com uma coalizão internacional que reúna nações com interesses distintos na Europa e no Oriente Médio. A Turquia, dona de uma fronteira com a Síria que é a principal rota de entrada de homens e armas para as milícias jihadistas, deve manter uma postura discreta em relação ao EI. O país teme que uma atitude mais agressiva coloque em risco a vida de seus 49 diplomatas mantidos reféns pelos extremistas e que os curdos que ocupam parte de seu território e reivindicam autonomia sejam beneficiados pelo Ocidente.

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Mais do que olhar para fora, o Iraque precisa olhar para dentro. Os especialistas são unânimes em dizer que uma eventual derrota do EI depende da formação de um governo mais inclusivo em Bagdá. “O único motivo pelo qual os jihadistas e líderes tribais que sustentam o EI se entendem hoje é que existe uma política excludente”, afirma Andrew Terrill. “Nem todos querem viver sob um califado e uma rígida interpretação da lei islâmica.” Na semana passada, com o apoio dos EUA, o Parlamento iraquiano aprovou o gabinete do novo premiê, Haidar al-Abadi, que promete adotar um programa de descentralização. Sobre o sentimento antiamericano que cresce a cada investida dos EUA no mundo árabe, entretanto, Obama pouco pôde fazer.

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Fotos: Pete Souza/Official White House; Ashraf Amra/Landov/Other Images 


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