Muita velocidade e muito dinheiro são os combustíveis da Stock Car, principal categoria do automobilismo nacional, que tem os pilotos Cacá Bueno e Rubens Barrichello como estrelas. Mas foram os gestores da Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA) que derraparam na pista e agora estão sendo investigados pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), nacional e a regional do Rio de Janeiro. Os dirigentes são acusados de fraude, tráfico de influência, compadrio, uso indevido do cartão corporativo e recebimento por consultorias numa manobra para obter renda mensal de uma institutição que proíbe pagamento de salário.

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No processo, em análise pela Procuradoria Geral da República, o presidente da CBA, Cleyton Tadeu Pinteiro, por exemplo, é acusado de receber, entre gastos com o cartão corporativo e pagamentos por consultorias dadas pela empresa dele, R$ 770 mil ao ano. Segundo o processo a que ISTOÉ teve acesso, o presidente teria tido reembolsos mensais de aluguel de carros, passagens aéreas de primeira classe, despesas com supermercados e até serviços de cabeleireiro. Outra acusação refere-se a contratos pontuais com companhias pertencentes a presidentes de federações regionais, como Sesimar Correia, que preside a Federação Potiguar de Automobilismo, por sua vez, filiada à CBA. Ele é apontado como o corretor responsável pelos seguros de vida de todos os pilotos da confederação, o que rende à sua empresa particular uma conta de R$ 500 mil. A “dupla jornada”, por assim dizer, é considerada antiética, já que os presidentes de federações estaduais elegem a chapa diretora da CBA.

A denúncia enviada ao Ministério Público que deu origem à investigação é assinada por Dione Rodrigues e Antônio dos Santos Neto, ex-vice-presidentes da Confederação, e conta com o respaldo de um dos atuais membros do conselho fiscal, Edison Rodrigues dos Campos. Anexa às acusações, consta uma carta assinada por Campos, na qual ele denuncia ter sido ameaçado, em reunião realizada em outubro do ano passado, por Eduardo José Leal, também membro do conselho, e pelo diretor jurídico da CBA, Fellipe Zeraik. Segundo seu relato, ambos falaram com ele “de forma afrontosa” e o “forçaram a pedir renúncia” da função. Campos diz que a ação foi uma resposta às denúncias feitas pelos ex-diretores e também às suas próprias indagações em assembleias do conselho sobre pagamentos à empresa Zeraik Advogados Associados, pertencente ao diretor jurídico. O processo, que estava nas gavetas do Ministério Público, foi entregue, na segunda-feira 4, à Quinta Câmara de Revisão e Coordenação da Procuradoria Geral da República para revisão.

Há ainda, no processo, informações sobre compadrio entre Zeraik e o Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Automobilismo (STJDA). São elas: o presidente do STJDA, Fernando Cabral, é pai do sócio de Zeraik, Fernando Cabral Filho. Este, por sua vez, faz parte da Comissão Disciplinar da corte. E o advogado Carlos Alberto Diegas Dutra, que trabalha na empresa de Zeraik, é um dos auditores do STJDA. “Há indícios de que diversos auditores do Tribunal são funcionários ou parentes de sócios do escritório de Zeraik, o que obviamente desvirtua o caráter de independência que deve pautar a atuação da Justiça Desportiva, na forma prevista pela Lei Pelé”, recrimina Marcelo Jucá, presidente da Comissão de Direito Desportivo da OAB/RJ.

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Procurado por ISTOÉ, Zeraik afirmou que advoga para a confederação há 20 anos e que não recebe pelo exercício do cargo de diretor, mas sim pelo de advogado. “Não me tornei diretor da CBA e depois escolhi meu escritório para advogar. É o contrário. E, como diretor, eu não recebo. Agora, meu escritório recebe”, defende-se. Em um relatório de auditoria realizado em 2009, há registros de contratos com o escritório de Zeraik para defender a Confederação em casos que somam custos potenciais à CBA de R$1.455.045,13. Questionado sobre os outros diretores, Zeraik afirma que nenhum deles recebe salário e defende o presidente da CBA, Cleyton Pinteiro. Afirma que a empresa Nailda Rodrigues Lima NRL, apontada na denúncia investigada pelo MP como ferramenta de “camuflagem” do salário do presidente em contratos de “assessoria esportiva”, não pertence a Pinteiro. “Eu sei que o Cleyton não é sócio dessa empresa”, afirma.

A CBA negou à ISTOÉ o acesso às contas e aos documentos da entidade. Em resposta à carta-denúncia, a confederação enviou um texto ao MP desqualificando o denunciante, o ex-vice-diretor Dione Rodrigues. Segundo a CBA, Rodrigues sofreu processo administrativo no STJDA e a federação de Brasília, que ele presidia, foi desfiliada “em função de diversas fraudes e irregularidades cometidas pela diretoria”. Já o outro denunciante, Antônio dos Santos Neto, é descrito da seguinte forma: “Já esteve preso e, atualmente, responde a diversos processos criminais”.

Foto: Gabriel Pedreschi