Brasil entrou na rota das maiores grifes de luxo internacionais. Em menos de um mês, empresas como a joalheria Tiffany & Co., a alfaiataria masculina Ermenegildo Zegna e a butique italiana Giorgio Armani abriram as portas em São Paulo. No Rio de Janeiro, a rua Garcia D’Ávila, no bairro de Ipanema, está se tornando a meca de assinaturas tradicionais como Cartier, Louis Vuitton e Montblanc. E a onda de investimentos, que tem como alvo os consumidores mais ricos do País, não pára: a butique francesa Hermés e a alemã Escada estão a caminho. Enquanto isso, a espanhola Zara e a francesa Kenzo planejam para breve a inauguração de novas lojas.

A descoberta do Brasil pelo mercado de luxo tem um motivo bastante óbvio: a existência de público. A saturação dos mercados de origem, nos Estados Unidos e na Europa, fez com que, nos últimos anos, as grifes investissem US$ 3 bilhões anuais em mercados emergentes como a China, o Leste Europeu e a América Latina. Neste último bloco, o Brasil é o filé mignon. Representa dois terços de todas as vendas no continente para a Louis Vuitton. É o sexto consumidor mundial de canetas Montblanc, tendo adquirido 40% da produção de relógios da marca, lançados no ano passado e vendidos a, no mínimo, R$ 2 mil cada um. Sem falar na Cartier, que registra 30% de crescimento nas vendas por ano, e na Armani que, com 25 mil clientes exclusivos, em quatro anos abriu três lojas e um café no País.

Classe AAA – No mundo todo, de acordo com estatísticas divulgadas pelas grifes, apenas 2% da população consome produtos de alto luxo. No Brasil, são cerca de 0,5%, ou seja, de 700 mil a um milhão de pessoas, entre quatrocentões, novos-ricos e empreendedores da classe AAA. Segundo dados divulgados recentemente pelo IBGE, essa fatia da população teve a sua renda aumentada em 29% na última década. Na opinião do consultor empresarial José Roberto Martins, autor do livro O Império das grandes marcas, essa demanda reprimida trouxe as principais grifes. “Primeiro vieram as montadoras de veículos, os bancos e as empresas multinacionais”, lembra. “Agora, é a vez das butiques de luxo, que vêem no Brasil um novo pólo de consumo.”

A região dos Jardins, em São Paulo, concentra boa parte dos investimentos estrangeiros. Quem vive no bairro já nota a mudança no quarteirão que abriga as ruas Oscar Freire, Haddock Lobo e Bela Cintra, dividido pelas maiores marcas nacionais e outras de fora como Hugo Boss, Swarovski e MaxMara. Moradora da região há 20 anos, a empresária Mary Nigri, 38 anos, diz que aos sábados tem de deixar o carro em casa e ir a pé para o seu restaurante, o Quattrino, no mesmo bairro, tamanho o congestionamento. Vestindo sapatos e óculos Armani, terninho Vera Arruda e bolsa e xale Louis Vuitton, ela se apressa em explicar que a sofisticação é boa para o lugar. “É uma comodidade poder encontrar as maiores grifes do mundo na esquina de casa”, afirma Mary. “E o melhor é poder parcelar o pagamento no cartão de crédito, algo impossível no Exterior.”

Na capital paulista, a supremacia do quadrilátero da Oscar Freire só encontra equivalente no Shopping Iguatemi, na avenida Faria Lima. Um dos centros de compras mais tradicionais da cidade, o local abriga uma filial do Emporio Armani, uma Louis Vuitton e distribuidores das maiores joalherias internacionais. Este mês, ganhou a primeira loja da Tiffany & Co., grife eternizada no filme Bonequinha de luxo, uma franquia da loja de acessórios francesa Longchamp e outra da grife italiana Ermenegildo Zegna. A marca masculina é a preferida de famosos como o arquiteto João Armentano, 40 anos. Além da praticidade de poder encontrar no Brasil a marca que comprava na Itália, ele elogia a qualidade do atendimento da loja, com direito a água mineral com a assinatura da grife, cafezinho e assessoria de alfaiate. “Também, sou suspeito para falar”, diz. “Me identifico com a Zegna, acho tudo confortável e não reclamo de nada.”

Peso – Depois de São Paulo, a bola da vez para as marcas mais nobres é o Rio. A Montblanc e a Louis Vuitton estão construindo megalojas na rua Garcia D’Ávila, entre a Vieira Souto e a Lagoa Rodrigo de Freitas. “São pontos de rua, em lugares bem localizados, que dão peso para o negócio”, afirma o diretor da Montblanc no Brasil, Freddy Rabbat. Na segunda-feira 14, trazida em uma Grand Cherokee guiada por motorista e cheia de sacolas, a atriz Cláudia Jimenez parou em frente à loja da Louis Vuitton. “Estou me preparando para viajar muito durante a turnê da peça Pequeno dicionário amoroso e precisava de uma bolsa bonita e que aguentasse o tranco”, contou. Com artigos que custam de R$ 150 (um chaveiro) a R$ 19,5 mil (uma bolsa de couro de crocodilo), recentemente a loja viu esgotar em sete horas o seu estoque de 80 unidades da bolsinha acessoire, vendida a R$ 300.

O corretor Francisco Eduardo Ponce de Leon, especializado em compras e vendas em Ipanema, diz que nos últimos anos a área está supervalorizada. “Os terrenos acabaram e há poucos empreendimentos à venda porque a rua está se tornando ponto chique”, afirma. Prova disso é que a Montblanc precisou negociar durante quatro anos para adquirir o ponto de 70 metros quadrados na esquina da Garcia D’Ávila com a Barão da Torre. Com cerca de 350 mil clientes fiéis – o número é calculado pela venda de cargas de canetas –, a marca inspira pessoas como o executivo Marcus Valério Barroso, 34 anos, que usa carteira, agenda e porta-cartões e relógio com a grife. “Quando compro um artigo, tenho a sensação de estar acima de todos, como o monte Montblanc, o mais alto da Europa”, diz. Vale lembrar que a montanha inspirou a criação da caneta Solitaire Royal, feita com 4.810 diamantes, número equivalente à altura do Montblanc, cotada no mercado ao preço de R$ 348 mil. Consumidores apaixonados como esses fazem grifes como a Tiffany & Co. sonhar alto com o Brasil. “Inauguramos nossa primeira filial internacional há dez anos, mas nunca vi um público tão ávido por artigos de luxo como o de São Paulo. As vendas da primeira semana superaram as expectativas”, conta John Queen, vice-diretor da marca.