Há algo de muito impressionista nas pinturas recentes de Sergio Romagnolo, apresentadas na primeira individual do artista na Galeria Marília Razuk, em São Paulo. As oito pinturas, que dividem o espaço com quatro esculturas de plástico modelado, apresentam sobreposições de imagens do mesmo lugar visto por diferentes pontos de vista. Não importa se elas podem ser representações de cidades da América Latina ou da Europa, de paisagens modernas, pós-industriais ou contemporâneas. Há nas pinturas de Romagnolo o fantasma das catedrais pinceladas por Claude Monet em 1894.

Contam os livros de história que o impressionismo é a arte da representação da passagem do tempo. Fugindo do realismo fotográfico, os pintores impressionistas criaram uma linguagem que chegou muito perto do cinema, porque representou o dinamismo do tempo. Hoje, na era pós-televisão das relações em tempo real, Romagnolo persegue o tempo não cristalizado. As figuras fantasmagóricas e fora de registro representadas em suas pinturas têm o aspecto das imagens “defeituosas” derivadas dos sinais desencontrados da televisão analógica.

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Há ainda as quatro esculturas: uma flor, uma motocicleta e dois objetos disformes e fragmentários, como se tivessem perdido a forma e a função em explosões ou radiações, e se tornado restos de uma civilização. As obras de Romagnolo são, portanto, arquivos de temporalidades distintas: do impressionismo à televisão analógica, passando por um cenário de destruição à la “Mad Max”.

Compõem essa arqueologia catedrais de Monet e personagens de tevê. Como a Feiticeira, protagonista de um seriado dos anos 1960/70, que foi “apropriada” pelo artista e “deslocada” para um texto de ficção científica que ele vem escrevendo há alguns anos. O texto “A Feiticeira e as Máquinas”, cujos dois primeiros capítulos estão disponíveis em uma publicação na exposição, dá ao espectador outras claves de leitura do trabalho. Entendemos que estamos em um território de investigação sobre os estatutos da imagem, numa espécie de elo perdido entre o mundo moderno e o pós-moderno. Encontro de escultura, pintura e literatura, a exposição de Romagnolo tem um efeito semelhante ao ruído branco, sonoridade produzida pela combinação simultânea de sons de todas as frequências.