Objetos de mobilidade, ações de permanência/Inside the White Cube, White Cube São Paulo, até 23/8

Migração e deslocamento são pautas que sempre estiveram no caminho de Daniel de Paula. Desde o berço: já que ele nasceu em Boston, filho de brasileiros que imigraram para os EUA, e veio pequeno para o Brasil, onde hoje vive e trabalha. Independentemente deste ponto de partida, hoje, aos 25 anos, Daniel de Paula inicia uma carreira artística ancorada sobre uma base móvel, com residências e exposições entre o Brasil e a Europa. O interesse pelos estados transitórios da vida cotidiana é matéria comum aos três trabalhos de sua primeira individual realizada em uma galeria de arte. A mostra “Objetos de Mobilidade, Ações de Permanência” também marca a primeira vez que a White Cube São Paulo apresenta uma individual de um artista brasileiro.

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LUZ E SOMBRA
Obras de Daniel de Paula subvertem princípios da iluminação urbana

A White Cube é a maior galeria do Reino Unido e uma das primeiras do mundo em credibilidade, faturamento e área ocupada – tem seis endereços, sendo que a White Cube Bermondsey, no sudeste de Londres, tem uma metragem de 5.440 m2. Desde que foi inaugurada, em dezembro de 2012, a filial paulistana apresentou cinco individuais de artistas estrangeiros e incluiu um brasileiro em uma exposição coletiva: o pintor Daniel Senise em “The Gesture and the Sign”. Mas é com Daniel de Paula que a galeria efetivamente inicia um diálogo com a produção brasileira e demonstra seu real comprometimento com a cena local.

Após ter integrado a coletiva “Open Cube”, curadoria de Adriano Pedrosa, na White Cube Mason’s Yard, em Londres, em 2013 (detalhe: foi um dos 17 selecionados entre 2.900 inscritos em convocatória), Daniel foi convidado pelos diretores da galeria a realizar uma individual dentro do projeto “Inside the White Cube”. Este é um programa de exposições desenvolvido com artistas que (ainda) não pertencem ao casting dos artistas representados. “‘Inside the White Cube’ é um programa que já existe há muitos anos em Londres, e para a primeira edição em São Paulo estamos felizes em apresentar as obras de Daniel de Paula. Seu trabalho estreita as relações entre público e privado, promovendo uma maior interação com o espectador. Podemos perceber na sua arte um forte diálogo entre disciplinas como arte, arquitetura e geografia, além do tempo”, diz Karla Meneghel, diretora da White Cube São Paulo.

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DERIVA
O artista lê texto de Hélio Oiticica nas ruas de Paris

“É muito bom que eles estejam propondo um diálogo com urgências locais”, diz Daniel, que apresenta três trabalhos na exposição. O primeiro, “Crux” (2014), consiste em um poste de iluminação urbana atravessado no chão da galeria. O segundo é a frase-título da exposição escrita em neon. Ambos os trabalhos têm um dispositivo comum: usam a luz com o objetivo de atrair o espectador. Mas, quando ele se aproxima, a luz se apaga. As obras são equipadas com sensores, que fazem com que a luz se desligue com qualquer movimento; para ver a obra iluminada, o espectador deve permanecer estático diante dela. São trabalhos, portanto, que estimulam a contemplação e o silêncio.

A terceira obra exposta também fala da tensão entre mobilidade e permanência, pois é o resultado de uma série de caminhadas do artista durante a leitura de livros. É, portanto, fruto da combinação entre a experiência solitária (a leitura) e a atividade pública (usos ou derivas no espaço urbano). A primeira ação se deu em fevereiro de 2013, quando vivia em Paris, na residência artística Cité International des Arts. “Foram sete horas de leitura do texto ‘Aspiro ao Grande Labirinto’, de Hélio Oiticica. Saí da Cité, à beira do Sena, e fui parar no Banlieu, a periferia da cidade, que tem um caldo cultural e uma mistura que vão muito além da imagem turística que temos de Paris”, conta Daniel de Paula, que persegue a dissolução da dicotomia entre os conceitos de centro x periferia, público x privado, coletivo x individual. “Prefiro a complexidade do que comparações binárias, pois o espaço que habitamos é complexo. São Paulo é ao mesmo tempo centro e periferia hoje”, diz ele.