Em 2011, o vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, demonstrou otimismo quanto à retirada das tropas americanas de solo iraquiano. “Essa pode ser uma das grandes conquistas dessa administração”, declarou ele, entusiasmado com a possibilidade do cumprimento de uma das principais promessas de campanha de Barack Obama. Ele foi ainda mais explícito num telefonema a Obama, segundo Peter Baker, correspondente da Casa Branca no jornal americano “New York Times”. “Obrigado por me dar a chance de acabar com esta maldita guerra,” disse ao presidente. Na ocasião, Biden estava em Bagdá para acompanhar a saída dos últimos soldados americanos e encerrar oficialmente uma impopular intervenção militar, que durou oito anos e matou quase meio milhão de pessoas. Menos de três anos depois, os EUA estão de volta ao atoleiro que custou US$ 1,7 trilhão aos cofres americanos. Nos últimos dias, Obama se viu obrigado a aumentar seu apoio às forças de segurança iraquianas para conter o avanço de insurgentes sunitas no norte e no oeste do País.

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DE VOLTA AO ATOLEIRO
O governo americano anunciou o envio
de 300 forças especiais para auxiliar o Iraque

O governo americano anunciou, na semana passada, o envio de ao menos 300 forças especiais para auxiliar o Iraque, enquanto extremistas do Estado Islâmico do Iraque e Levante (EIIL) seguiram conquistando cidades importantes, como Mossul, segunda maior do país, e Baiji, onde fica a maior refinaria de petróleo iraquiana, a caminho de Bagdá. Na quarta-feira 25, atacaram uma base aérea. Os EUA calculam em dez mil o número de militantes do grupo radical, que tem o objetivo de redesenhar as fronteiras da região e criar um Estado Islâmico entre o Iraque e a Síria. De acordo com a Organização das Nações Unidas, ao menos 1.075 pessoas, a maioria civis, morreram nos primeiros 17 dias desde o início da escalada da violência. Somados a isso, os indícios de que o Irã tem fornecido armas, munições e inteligência ao governo do xiita Nouri al-Maliki, no Iraque, e de que a Síria tem bombardeado cidades fronteiriças em poder dos sunitas arrastam a administração de Obama para um envolvimento mais direto do que se planejava inicialmente. Ainda assim, o presidente americano descartou a possibilidade de suas tropas voltarem a combate.

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AGRADECIMENTO PRECOCE
Há três anos, o vice-presidente dos EUA, Joe Biden, agradecia
a Barack Obama pela chance de encerrar a guerra no Iraque

Apesar de tanto o Irã quanto os EUA desejarem um Iraque estável, há divergências de interesses entre os dois países. Os iranianos querem fortalecer Maliki. Os americanos condicionam sua ajuda à formação de um novo governo, mais inclusivo aos sunitas. Nos últimos meses, o premiê Maliki alienou ainda mais essa parte da população, o que contribuiu para a radicalização de jovens que se identificavam com o EIIL. “Os EUA precisam obrigar o governo iraquiano a fazer concessões radicais à comunidade sunita numa tentativa de ganhar o apoio dos sunitas,” disse à ISTOÉ Nussaibah Younis, especialista em Iraque e pesquisadora do Programa de Segurança Internacional da Universidade Harvard. “Isso é crucial para recuperar o território permanentemente.” Nas eleições de abril, Maliki não conseguiu a maioria de votos necessária para lhe garantir um terceiro mandato. A saída do primeiro-ministro atenderia também aos interesses de importantes aliados sunitas dos EUA, como a Arábia Saudita, e evitaria um novo componente inflamável para a polarização entre Teerã e Riad. Agora, pelo menos uma previsão do vice-presidente americano, Joe Biden, tem merecido mais atenção. Em 2006, Biden propôs a divisão do Iraque em três regiões autônomas: uma xiita, uma sunita e uma curda. Foi ignorado pelo então presidente George W. Bush. Mas, com o agravamento do atual conflito sectário, que, para alguns especialistas, é a reedição da guerra civil que estourou no Iraque entre 2006 e 2008, a manutenção de um país unido é cada vez mais improvável.

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Fotos: Khalid Mohammed/AP; Pete Souza/Official White House