Multitude / até 10/8 / Sesc Pompeia, SP

Quando grandes aglomerações em volta de estádios de futebol se anunciam, nada mais apropriado que uma discussão aprofundada em torno das animosidades multitudinárias. Em junho, no calor da Copa do Mundo, o filósofo político Antonio Negri traz sua contribuição ao debate promovido pelo projeto “Multitude”, evento internacional de arte contemporânea composto por exposição, apresentações teatrais, performances, workshops e conferências. Autor da ideia de multidão como novo modelo de resistência aos sistemas de poder no mundo globalizado, Negri é um dos convidados do projeto desenvolvido por Lucas Bambozzi e Andrea Caruso Saturnino, no Sesc Pompeia. 

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NOVA TRAGÉDIA
"Farsa – Delacroix", de Dora Longo Bahia, relaciona pintura
histórica com fotografia atual coletada da internet

“Heterogênea, dispersa, complexa e multidirecional” são algumas das definições de multidão destacadas por Bambozzi e Saturnino, que se refletem diretamente nas direções assumidas pelo evento. Na exposição, 20 obras evidenciam como artistas do Brasil e do mundo incorporam o tema em seus processos de criação. A relação entre multidão e utopia é o princípio inerente da performance coletiva proposta por Francis Alÿs em “When Faith Moves Mountains” (Quando a fé move montanhas, 2002), na qual 500 voluntários encaram a tarefa de deslocar uma duna de areia de 500 metros de altura.

Catarse e convulsão movem multidões enraivecidas que em momentos de crise se lançam de forma não organizada ao saque de lojas, como ocorreu em Recife, no início de maio, durante a greve da Polícia Militar, ou em Buenos Aires, em 2001, como sintoma de agravamento da crise econômica. O acontecimento foi registrado pela artista argentina Gabriela Golder no vídeo “Multitud” (2008).

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UTOPIA
"When Faith Moves Mountains", de Alÿs, registro do
esforço coletivo de deslocar uma montanha

No projeto “Cinema sem Volta” (2014), Giselle Beiguelman enfoca a participação como um princípio inerentemente multitudinário.

A artista desenvolveu para a exposição um slideshow alimentado automaticamente com imagens do Instagram publicadas com hashtags como #homofobia, #macho, #copa2014, etc. “A maioria dos autores das imagens nem sabe que está publicando no ‘Cinema sem Volta’. Desenvolvemos um programa que sai coletando e publicando imagens relacionadas a hashtags que são usadas por grupos conflitantes. O que mais me interessa é essa disputa pela visibilidade”, diz Giselle.

O princípio disperso da multidão também se aplica ao modo como Bambozzi e Saturnino estruturaram o evento, numa espécie de “curadoria em cadeia”, envolvendo novos agentes e agregados durante o processo. Isso ocorre, por exemplo, na “curadoria de plantão”, formada por cinco convidados responsáveis por incluir novos trabalhos nos espaços vazios da exposição, promovendo sua transformação gradativa até seu encerramento, em agosto.