A cada nova pesquisa eleitoral, parece claro que, em outubro de 2013, quando previu a vitória de Dilma Rousseff no primeiro turno, o marqueteiro do PT João Santana mostrou-se mais eficiente para encantar os próprios clientes do que  para interpretar corretamente as opções do eleitorado nas urnas. Nas últimas semanas, ao contrário do vaticínio de Santana, as pesquisas eleitorais mostraram que a eleição presidencial caminha para ser resolvida apenas no segundo turno. A pesquisa ISTOÉ/Sensus, divulgada na última edição de ISTOÉ, foi a primeira a revelar esse movimento e a nova realidade eleitoral provocou a revisão das estratégias de campanha de Dilma Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB). Cada um deles por razões distintas. Aécio, para manter a curva ascendente registrada nos recentes levantamentos. Eduardo, com o objetivo de mostrar ao eleitorado que ele e não o tucano seria a melhor opção para enfrentar Dilma num segundo turno. E Dilma, para tentar estancar a sangria de votos observada nos últimos meses. Como, entre os três postulantes, a presidenta foi quem mais saiu perdendo, a partir dos novos números eleitorais, o comando da campanha petista teve de empreender as mudanças mais vigorosas nos rumos da campanha. A tentativa de reação começou a ser desenhada há exatos 15 dias, quando o crescimento dos candidatos de oposição foi captado com clareza por sondagens internas do PT, e se intensificou depois da publicação da pesquisa ISTOÉ/Sensus.

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APREENSÃO
Na quinta-feira 8, Dilma visitou as obras do Itaquerão em São Paulo.
A situação cada vez mais desfavorável nas pesquisas
retira a vantagem da perspectiva de poder

Num encontro com a presença do presidente do partido, Rui Falcão, e dos ministros da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e de Relações Institucionais, Ricardo Berzoíni,  resolveu-se abandonar a prioridade estabelecida inicialmente de dar ênfase à atuação de Dilma como gestora de grandes investimentos, que chegam a ser questionados por fatias crescentes de eleitores – como os estádios da Copa – e tem gerado protestos nas grandes capitais, como ocorreu na semana passada, quando a presidente reuniu-se com lideranças sem-teto de São Paulo. Por motivos óbvios, o Planalto também suspendeu uma discussão de bastidores sobre os projetos de governo para 2015, que envolviam eventuais ajustes na política econômica e outras áreas da administração. O foco agora é se concentrar no discurso da luta de classes que está na origem do PT, e se traduz na defesa de conquistas sociais históricas, como o Bolsa Família e a lei do salário mínimo. 

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EM ALTA
Crescimento nas pesquisas anima os tucanos. Nunca, desde o início da
campanha, Aécio Neves recebeu tantos telefonemas de empresários

A primeira manifestação dessa mudança ocorreu no discurso de Dilma às vésperas do 1º de Maio, um texto que, apesar de algumas emendas e sugestões de auxiliares, deve ser lido como pura obra da presidenta. A segunda, 72 horas depois, no Encontro Nacional do PT. O saldo dessa nova linha política, materializado no anúncio do chamado pacote de bondades, que incluiu a correção na tabela do imposto de renda e reajuste de 10% no Bolsa Família, foi captado na nova rodada do Datafolha, divulgada na sexta-feira 9. A pesquisa não só referendou o levantamento da ISTOÉ/Sensus, apontando na mesma direção, como mostrou a tendência de crescimento de Aécio Neves, que subiu quatro pontos num intervalo de um mês, e de Eduardo Campos. O discurso dos petistas, agora, é de quem joga a toalha para a expectativa inicial de triunfo nas urnas no primeiro turno. “Eu sempre acreditei que seria muito difícil vencer no primeiro turno,” afirma o ministro de Relações Institucionais Ricardo Berzoini, há dois meses incorporado ao primeiro escalão do governo Dilma. “Se não foi possível ganhar no primeiro turno em 2010, quando a economia crescia 7,5% e o Lula era o presidente que havia vencido um  tsunami econômico, agora temos uma situação muito mais difícil. Somos favoritos, mas teremos uma campanha dura”, resignou-se.

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PRUDÊNCIA
O desafio de Eduardo Campos, agora, é conseguir marcar
diferenças com o candidato tucano, Aécio Neves, sem
que isso signifique uma divisão na oposição

Aos poucos, uma situação cada vez mais desfavorável nas pesquisas retira do Planalto e do PT uma vantagem conhecida da política: a perspectiva de poder. O ex-líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR) já se encontra em campanha de murmúrios contra Dilma. Jucá tem dito que “este governo do PT não vai mais a lugar nenhum. Agora é ver quem (da oposição) terá mais chance”.  Num ambiente de acerto de contas e juras de infidelidade, o senador Eunício OIiveira (PMDB-CE), favorito ao governo do Ceará, tornou-se alvo de uma pequena anedota na semana passada. Na quarta-feira 7, Eunício  manteve conversas tão demoradas com Aécio Neves e depois com o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) nas cadeiras do Senado que acabou provocando uma intervenção irritada da deputada Gorete Pereira (PR-CE): “Essa conversa está demorada demais, Eunício,” disse ela. “Seu bico está tão comprido que vai acabar virando tucano!”. A parlamentar estava exagerando. Eunício tem recebido apoio de Lula e Dilma para se unir à reeleição em seu Estado e tem atuado como um aliado firme do Planalto. Mas os conflitos locais com os irmãos Cid e Ciro Gomes seguem tão complicados que Eunício não perde uma chance para fazer uma cena típica de quem ameaça mudar de lado.      

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DIFERENÇAS E CONVERGÊNCIAS
Em entrevista, a candidata a vice na chapa de Eduardo
Campos, Marina Silva, atacou o PSDB. Aécio minimizou:
"Nós não devemos temer nossas diferenças. Assim
como não devemos temer nossas convergências"

A constatação de que a eleição parte para uma disputa em segundo turno também tem provocado mudanças nas fileiras da oposição. Até a divulgação das últimas pesquisas, Aécio Neves e Eduardo Campos cultivavam uma convivência de quem faz aliança para combater um inimigo comum. Celebravam pontos de convergência  e evitavam recordar suas diferenças.  Como é natural, o ambiente de congraçamento ameaça se desfazer na medida em que um dos concorrentes – Aécio, no caso – vai tomando a dianteira nas pesquisas, numa vantagem que chega perto do dobro marcado pelo aliado-adversário. Numa ação combinada com Eduardo Campos ou não, a candidata a vice na chapa socialista Marina Silva partiu para o ataque ao PSDB na semana passada: “A gente tem que parar com essa história de querer diluir as diferenças. O PSDB sabe que já tem o cheiro da derrota no segundo turno”, disse Marina em entrevista durante evento em Tocantins. Em seus pronunciamentos, no entanto, Eduardo Campos adotou um tom mais ameno ao se referir às divergências com o PSDB.

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Bem implantado em Minas Gerais, seu estado natal e segundo maior colégio eleitoral do País, Aécio Neves  conta com a máquina política do PSDB para chegar ao segundo turno. Para um bom número de analistas, o crescimento de Aécio no primeiro turno já era um dado esperado de sua candidatura. Mesmo assim, segundo fontes tucanas, Aécio nunca recebeu tantos telefonemas de empresários como nas últimas semanas. Em política, este é um importante sinal de que a campanha vai bem e o mais importante: finalmente há perspectiva de vitória. A dúvida consiste no segundo turno, a partir do qual a questão das alianças torna-se fundamental.  Por isso, a ordem no PSDB é evitar atritos com os socialistas, e despeito das provocações de Marina Silva. Questionado sobre o assunto, semana passada, Aécio minimizou: “Nós temos diferenças e não devemos temê-las. Assim como não devemos temer nossas convergências. Elas são boas para o Brasil”, afirmou o tucano. Embora haja a compreensão de que uma fatia do PSB tem dificuldades para se aliar ao PSDB, sigla assumida pelos adversários políticos de toda a linhagem à esquerda que se iniciou com Miguel Arraes, avô do candidato socialista, os tucanos sustentam que Campos e aliados, ao intensificarem suas críticas ao atual governo, já teriam atravessado o seu rubicão, como o romano Júlio Cesar. Ou seja, o caminho dele e do PSB rumo à oposição ao PT não teria mais volta. Isso significa que PSB e o PSDB poderão marchar juntos num segundo turno, mesmo que os socialistas já tenham decidido demarcar diferenças com os tucanos na primeira etapa das eleições. Neste caso, as chances de uma vitória de Aécio nas eleições aumentariam exponencialmente.

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Ao confirmar nas pesquisas sua recusa em assinar um cheque em branco – este é o significado de uma vontade de segundo turno – o eleitor também diz que espera mais dos candidatos. A maioria quer mudanças. Resta saber quem vai conseguir encarnar esse desejo. Ao que indicam as últimas pesquisas, este nome não é Dilma. Mas como política é uma nuvem, já dizia Magalhães Pinto, velha raposa mineira, e cabeça de eleitor um mistério até o escrutínio dos votos, convém prudência na hora de emitir vaticínios definitivos. João Santana que o diga.

Com reportagem de Claudio Dantas Sequeira