A lei seca, que entrou em vigor em dezembro de 2012, endureceu as regras para o consumo de bebidas alcoólicas no trânsito e obrigou os brasileiros a fazer o teste do bafômetro. Entretanto, uma alteração no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro permitiu que alguns juízes absolvessem motoristas flagrados em estado de embriaguez. Isso porque o artigo aboliu a expressão “concentração de álcool” do texto e considerou crime dirigir “com as capacidades psicomotoras alteradas em função do álcool”. Na prática, a mudança significa que todos os motoristas flagrados sob efeito de álcool serão punidos com ações administrativas – multa no valor de R$ 1.915,40 e perda da carteira de habilitação por um ano – porém aqueles que apresentarem um índice alcoólico superior a seis decigramas no sangue não serão necessariamente condenados com ações criminais.

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RETROCESSO
Para especialistas, essa medida é um perigo, pois o álcool tira
a capacidade de concentração e o raciocínio do motorista

“Não basta o resultado do bafômetro, é necessário um exame clínico para comprovar que o motorista não tem capacidade motora para dirigir”, afirma Maurício Januzzi, presidente da Comissão de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo. “A lei tem o objetivo de arrecadar dinheiro para os cofres públicos, e quando uma pessoa é presa acarreta ônus para o governo.” O artigo, segundo Januzzi, abre precedentes para diferentes interpretações nos Tribunais de Justiça dos Estados, dando margem para sentenças divergentes. Para o professor de direito penal da Fundação Getulio Vargas Thiago Bottino, as fiscalizações serviram para mostrar a atuação do Estado contra a impunidade. “As blitze ajudaram a acabar com a ideia de que tudo é permitido”, diz. “A nova lei seca veio para mostrar tolerância zero, mas trouxe requisitos que dificultaram a aplicação da punição criminal.”

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De acordo com a Associação Brasileira de Medicina do Tráfego, o texto mais brando do artigo 306 é tolerante com motoristas flagrados sob efeito do álcool. “O organismo das pessoas é diferente, o alcoólatra não manifesta esses sinais clínicos que precisam ser verificados”, afirma Dirceu Rodrigues Alves Júnior, chefe do departamento de medicina de tráfego ocupacional. “Ele pode tomar uma garrafa inteira de uísque e estar aparentemente bem, mas não estará apto a dirigir por falta de concentração e raciocínio.” Um dos coordenadores do Movimento Não Foi Acidente e Viva Vitão, Nilton Gurman, diz que a pena administrativa é insuficiente. “Para muitas pessoas a multa não é significativa”, afirma Gurman, cujo sobrinho Vitor Gurman foi atropelado e morto em julho de 2011 por uma motorista sob efeito de álcool.

Foto: LEONARDO SOARES/AGÊNCIA ESTADO/AE

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