Na segunda-feira 24, um anúncio feito pela agência americana Standard & Poor’s (S&P) surpreendeu até mesmo os críticos da política econômica do governo Dilma Rousseff. A agência rebaixou a nota de crédito do Brasil de BBB para BBB-. Em bom português significa que, para a S&P, investir no Brasil passou a ser tão arriscado quanto colocar dinheiro na Espanha, ainda mergulhada na crise financeira que varreu a Europa, ou nas Filipinas, país sem relevância econômica global. “O rebaixamento reflete a combinação de derrapagem fiscal, a perspectiva de que a execução fiscal permanecerá fraca, em meio a um crescimento moderado nos próximos anos”, justificou a agência. O diagnóstico nebuloso, no entanto, provocou um efeito contrário no mercado financeiro brasileiro. Nos dias seguintes à decisão, o real se valorizou e a bolsa de São Paulo acumulou altas seguidas. O veredicto definitivo sobre o rebaixamento da nota brasileira foi dado pelo empresário Abilio Diniz, presidente do conselho de administração da BRF. “Isso, para mim (a alteração da nota brasileira), não significa nada”, disse Abilio em um seminário.

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ANÁLISE INCONSISTENTE
Para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, o rebaixamento
não condiz com a solidez da economia brasileira

A indiferença de um empresário do porte de Diniz pode ser explicada pela falta de credibilidade das agências de classificação de risco. Nos últimos anos, elas mais erraram do que acertaram. Quando erraram, foi para valer. A própria Standard & Poor’s cometeu uma barbeiragem histórica. Ela não só foi incapaz de prever a crise de 2008 como, ao contrário, avaliou de maneira positiva o Lehman Brothers no mesmo mês em que o banco quebrou, levando consigo uma série de outras empresas e desencadeando a crise das hipotecas imobiliárias nos Estados Unidos. Não por acaso, economistas renomados, a exemplo do Prêmio Nobel Paul Krugman, denunciam a promiscuidade e os equívocos dessas agências. “As agências de rating começaram como pesquisadoras de mercado, vendendo avaliações de dívida corporativa para pessoas considerando a compra ou não dessa dívida”, escreveu Krugman em artigo publicado em seu blog no site do jornal “The New York Times”. “Entretanto, elas se transformaram em algo bastante diferente: empresas contratadas pelas pessoas que vendem as dívidas para darem às dívidas um selo de aprovação.” A análise é similar à do economista Luiz Gonzaga Belluzzo.As agências de risco, diz ele, não têm nenhuma credibilidade depois da crise de 2008. Na verdade, elas é que deveriam ser rebaixadas. “O que vem a ser isso, essa decisão das agências? Que significado isso tem? Isso é coisa de estelionatários”, disse Belluzo ao jornal “O Estado de S.Paulo”.

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Ao rebaixarem a dívida de um país ou de uma empresa, as agências de classificação de risco praticamente os forçam a pagar juros mais elevados ou até mesmo impedem que investidores comprem seus títulos. Muitos fundos não podem, por determinação do estatuto, colocar recursos em títulos que não tenham, ao menos, o selo de grau de investimento de duas agências. Na prática, elas são capazes de tornar real um cenário adverso mesmo se ele não existir, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso declarou tempos atrás em uma entrevista. “De repente vem uma nota dessas e o mercado fica acanhado. Quando coincide de algum dia depois ter outro acidente negativo, isso produz um resultado catastrófico”, disse FHC. “E a base da avaliação às vezes é subjetiva. Quem toma essa decisão sabe do impacto. Há o risco de haver manipulação”, complementou. Para sorte brasileira, o diagnóstico da Standard & Poor’s não foi acompanhado pelas principais concorrentes.

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O rebaixamento do rating do País gerou críticas do Palácio do Planalto. Para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a decisão da Standard & Poor’s se baseia em uma análise “inconsistente”. Segundo ele, o rebaixamento não traduz a solidez e os fundamentos da economia brasileira. “No ano passado, o País cresceu 2,3%, um desempenho superior ao da maioria dos países do G-20”, disse o ministro. É inegável que o Brasil não vive uma fase de pujança financeira. A inflação cresceu nos últimos meses, a indústria continua sem acelerar e os investimentos não avançam no ritmo desejado. Isso é suficiente para o País ser rebaixado? Há fatores positivos que não podem ser desprezados. A dívida, por exemplo, está controlada na casa dos 60% do Produto Interno Bruto (PIB), bem abaixo da de países como a França, detentora da classificação AA e que deve o equivalente a 95,1% de tudo o que produz. Afinal, para que serve a Standard & Poor’s?

Foto: Ueslei Marcelino/REUTERS


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