DISPOSITIVOS PARA UM MUNDO (IM)POSSÍVEL/ Roesler Hotel, Galeria Nara Roesler, SP, até 15/3

O que Brasília, Marienbad e Berlim têm em comum? Categoricamente, não muito, mas essas três localidades se cruzam na exposição “Dispositivos para um Mundo (Im)Possível”. Pense em 1989, na queda do muro, no ápice da crise das utopias e no artista brasileiro Leonilson interessado no alcance político da arte. Estamos chegando perto. Se esses três lugares fossem associados a palavras, chegaríamos a utopia, ilusão, desconstrução. São precisamente esses três conceitos que dão sustentação à curadoria de Luisa Duarte, na Galeria Nara Roesler, em São Paulo.

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CAOS
Obra de Lais Myrrha (acima) desconstrói hierarquias, enquanto instalação
de Laercio Redondo (abaixo) faz citação de painel de Athos Bulcão

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Brasília, a cidade utópica projetada como obra de arte, é reinterpretada nesta exposição nas obras de Laercio Redondo e de Clarissa Tossin. A instalação “Restauro – Lembrança de Brasília” (2009), de Redondo, reproduz um dos painéis de azulejos criados por Athos Bulcão na capital federal. “O que poucos lembram é que a arte participativa brasileira começa em Brasília nos azulejos de Athos Bulcão”, diz o artista, que descobriu em pesquisa que os desenhos dos murais de Bulcão eram decididos pelos operários responsáveis por sua instalação, e não por ele.

Marienbad, a localidade fictícia do filme de Alain Resnais que remete à ilha de ilusões e simulacros do romance “A Invenção de Morel”, de Bioy Casares, é evocada em fotografia do artista argentino Jorge Macchi. A imagem mostra a imitação de um fragmento dos jardins de Versailles em um terreno na periferia de Paris. O resultado é uma espécie de miragem, posicionada entre obras e ruínas. A mesma dimensão ficcional de Marienbad pode ser encontrada no vídeo “Everything is Going To Be All Right”, do holandês Guido van der Werve, que registra um homem caminhando diante de um navio encalhado no gelo.

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(DES)ORDEM
Imitação de Versailles na periferia de Paris, na fotografia "Marienbad", de Macchi

Finalmente, Berlim, como símbolo da desmontagem, da desconstrução e da reorientação dos paradigmas de ordem mundial, está presente em toda a mostra. Está nas fotografias que Carlos Garaicoa tirou das ruínas urbanas de Havana, está na série de desenhos apagados de Carlos Bunga, está na instalação “Pódio para Ninguém” (2010), de Lais Myrrha – um pódio feito de pó de cimento prensado –, e está na aquarela “Leo Can’t Change the World” (1989), pintada por Leonilson no ano da queda do muro.

Outro nexo comum à maioria dos trabalhos da mostra são os tons em branco e preto. O branco do mármore da arquitetura de Brasília, no vídeo de Clarissa Tossin, contrastado com o preto do carvão dos azulejos de Laercio Redondo, resulta no cinza do cimento, das pedras e do arame, que dão forma aos trabalhos de André Komatsu, Nicolás Robbio, Antonio Dias e Lucia Koch. Dessa orquestração de tons melancólicos resultam os humores niilistas da curadoria de Luisa Duarte.

Fotos: Paula Alzugaray 


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