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A imagem da torcida desfraldando enormes bandeiras em meio a coros em animados batuques nos estádios não poderá ser vista na Copa das Confederações que começa em 15 de junho. As rígidas regras de comportamento estabelecidas pela Fifa para as arenas esportivas dos seis Estados-sede, e que valerão também para os 12 da Copa do Mundo de 2014, tirarão muito da empolgação – e até do charme – do público brasileiro. “Criamos um estádio para uma nova cultura de futebol. O torcedor vai se moldar”, acredita o engenheiro Ícaro Moreno, presidente da Empresa de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro, que comandou a remodelação do Maracanã.

As exigências arquitetônicas irão criar um novo jeito de torcer no Brasil e serão um legado definitivo dos dois eventos. O espectador estará muito mais próximo dos jogadores – no Maracanã, agora, 14 metros os separam e, no brasiliense Mané Garrincha, apenas 7,5 metros. Com o fim da arquibancada, ele não poderá ficar trocando de lugar nos degraus, pois terá de ocupar somente o seu assento numerado. O objetivo principal dessas alterações é a segurança. Em 1989, quando 96 torcedores morreram durante um jogo na Inglaterra, as mudanças começaram a ser pensadas. Todos os obstáculos entre arquibancada e gramado, como alambrados e fossos, foram eliminados para que a rota pudesse ser usada como opção de escape em caso de tumulto na multidão. Essa proximidade do campo demandará um comportamento civilizado do torcedor e maior efetivo policial para garantir a integridade de quem vai ao estádio.

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As regras de conduta só valem para os jogos da Fifa, mas são muitas. A entidade proíbe que o espectador fique de pé, obstrua a visão dos outros, incomode jogadores e grite xingamentos. Mesmo manifestações efusivas de torcedores – como fazem os fluminenses, que jogam pó branco para o ar no início das partidas, ou os corintianos, conhecidos pelo show de papel picado – não poderão acontecer nos jogos oficiais da entidade. As bandeiras sem mastro não devem ultrapassar o tamanho de 2 m x 1,5 m e com mastro só serão admitidas as de plástico flexível de até 1 cm de diâmetro e no máximo um metro. Há, ainda, obstáculos físicos: barras de ferro foram instaladas para impedir a movimentação entre algumas fileiras, de modo a tentar organizar uma eventual confusão.

Para a torcida brasileira, entretanto, o maior golpe é a proibição de instrumentos musicais. “Nossa forma de torcer sempre foi carnavalizada, com samba, música. Esse veto é uma barbárie”, lamenta Marcos Alvito, historiador especializado em futebol, da Universidade Federal Fluminense (UFF). De maneira artificial, a Fifa tentou emplacar a caxirola, instrumento inventado sob encomenda pelo músico Carlinhos Brown para ser usado pela torcida nos dois eventos. Mas ela terminou proibida na Copa das Confederações por ter sido usada como arma ao ser lançada, em massa, no gramado durante um jogo na Bahia, em abril.

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Outra mudança significativa é no perfil do torcedor. Há uma elitização imposta pelo aumento dos preços dos ingressos. Com menos plateia devido à colocação de cadeiras em substituição às arquibancadas, a entrada ficou mais cara, para garantir o lucro de clubes e federações. Em dez anos, o valor do tíquete mais barato subiu 300% no País, contra uma inflação de 78% no período, segundo Fernando Ferreira, economista da Pluri Consultoria. O jogo entre Santos e Flamengo, realizado em Brasília no domingo 26, arrecadou R$ 6,9 milhões, valor muito acima do que costuma render a bilheteria. A partida entre Brasil e Inglaterra no domingo 2, no Maracanã, deve auferir R$ 10 milhões. O custo elevado de um programa que sempre foi barato no Brasil está afugentando os torcedores. A média de público no Brasileirão em 2012 foi de 12,9 mil pessoas por jogo. O ex-técnico inglês Alex Ferguson, atualmente dirigente do Manchester United, comparou o silêncio da torcida a um cemitério, o que ilustra o clima nos arenas assépticas da atualidade. “Assim é o estádio que oferece conforto sem emoção”, diz o historiador Marcos Alvito. Resta torcer para que isso não aconteça também no Brasil.

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Fotos: André Luiz Mello/ag. O Dia; Jorge William/ ag. o globo


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