Aos 42 anos, o carioca Lobão se prepara para lançar A vida é doce, trabalho recente no qual radicalizou sua opção musical ao acrescentar até pianos jobinianos em algumas faixas que talvez reflitam seu momento pessoal, já que ele não bebe desde março, depois que ficou 15 dias em coma por ter misturado cachaça com soníferos. A vida é doce também inaugura uma nova fase. Sem gravadora, ele próprio se encarregou de toda a produção e pretende comercializar o disco em esquema independente. Será o primeiro CD brasileiro numerado. “Eu pleiteio isso desde 1987, quando o assunto era quase um sacrilégio”, lembra.

O lançamento de A vida é doce está marcado para a quinta-feira 25, na Fnac, em São Paulo. Custou R$ 50 mil e sai pela editora MID com uma tiragem inicial de 50 mil cópias. Virá acompanhado de uma revista chamada Lobão manifesto, em que exercita seu lado poeta no que chama de poemas sampleados, cheios de citações às obras de nomes tão díspares como Paul Valéry, T.S. Elliot, Tim Maia, Glauber Rocha e Dolores Duran. Disco e revista serão vendidos a R$ 14,90, apenas em bancas de jornal e megastores. “O trabalho não é uma reclamação, mas uma sacudida na minha classe, uma solução para as próprias gravadoras, um antídoto contra a pirataria oficial”, uiva ele.

ISTOÉComo é o novo CD?
Lobão – É o meu disco mais importante, como letra, projeto, estética. Compus, arranjei e toquei em todas as faixas. É o disco que tem mais a minha cara. Meu objetivo é constranger o mercadão. Não é um disco de rock, é MPB.

ISTOÉ Por que você gravou em esquema independente?
Lobão – Fui a gravadoras pequenas e todas tinham o mesmo discurso das majors. Diziam para fazer um álbum ao vivo, para gravar Renato Russo. Mas eu tinha um repertório novo para mostrar. O ao vivo e o acústico viraram pontes de safena para salvar artistas em decadência. O acústico dos Titãs foi um sucesso, mas acho difícil sempre ser sucesso.

ISTOÉ Seus últimos dois discos tocaram pouco nas rádios. Como você vai fazer para divulgar o novo trabalho?
Lobão – Não quero ser tocado pelas rádios, o que inclusive vai ser um detector de jabaculezice. Porque as pessoas querem que eu toque, eu sou um artista popular, dou ibope, loto shows no Brasil todo. Vou dar o CD apenas para as rádios comunitárias. Não posso compartilhar desse procedimento das rádios oficiais. Eu só toco no rádio em horários vagos, que não são negociados na base do jabá, por isso só tocam minhas músicas antigas. A maior parte do disco novo tocaria em qualquer rádio. Mas se quiserem tocar, vão ter que comprar. Não faço qualquer coisa. Veja o Herbert (Vianna), dos Paralamas. Como é que pode um cara que fez propaganda da Telemar, uma empresa espúria, ganhar uma grana e cantar indignado Que país é esse?

ISTOÉ Você não faria propaganda?
Lobão – Não vendo minhas idéias porque não vou pulverizar minha credibilidade. Recebi uma proposta milionária de um fabricante de celular que queria dar US$ 1 milhão por Me chama. Só que eu quero ganhar esse dinheiro com os royalties e direitos que não são pagos por essa música. Um monte de gente a gravou, mas eu não ganho quase nada. Há um mês insistiram na proposta, e respondi por e-mail: Há! Há! Há! Não que eu não tenha preço. Por US$ 10 milhões eu faria, mas me retiraria do mercado, iria para o norte da Escócia virar um eremita. De-ter-mi-na-dos artistas são entertainers, não lidam com arte. Eu tenho a pretensão de fazer arte. E quem faz arte tem que segurar uma peteca.