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O filósofo, poeta e romancista Édouard Glissant afirmou em seu livro “Todo-Mundo: Caos-Mundo” que o cenário global se encontra entre “um mundo universal da mesmice cultural” e “um padrão de diversidades fragmentadas”. Nascido na Martinica, o pensador usava as antíteses citadas acima para pensar o fenômeno da diversidade cultural a partir das heranças coloniais percebidas nas relações entre ilhas das Antilhas e sua matriz francesa. O caos-mundo, segundo o autor, nasceria desse contexto em que as identidades estariam em constante conflito mediante os jogos de poder ainda presentes e advindos do passado colonial.

O jovem mineiro João Castilho expande sua prática como fotógrafo para terrenos experimentais que cruzam com a linguagem do vídeo, se apropriando do conceito de caos-mundo proposto por Glissant, em uma mostra homônima, em cartaz na Zipper Galeria, em São Paulo. O artista mostra uma série de trabalhos em que discute a situação política mundial a partir das tensões e pressões que o cidadão contemporâneo enfrenta diante desse impositivo “universal da mesmice”. Exemplos são as séries de três trabalhos que têm como centro a questão do trabalhador na conjuntura atual. Em “Retirante”, o artista transforma em poética o rastro deixado no Cerrado pelos trabalhadores que nunca conseguem permanência por falta de condições laborais, tendo de ir buscar o sustento digno em outros lugares. O políptico de 32 fotografias em preto e branco registra diversos caminhos e rastros criados por essas pessoas, mostrando que as relações entre o lugar de origem e o lugar de trabalho se estabelecem de maneira caótica, como também apontou Glissant ao formular o conceito de “enraizamento e errância”.

Já na videoinstalação “Erupção”, composta por seis monitores de tevê, a comunicação nos tempos globais é desconstruída no gesto do artista que captura na Internet vídeos feitos por pessoas anônimas que desabafam sobre os episódios recentes em que vários ônibus de grandes centros urbanos do País foram queimados. Os vídeos caseiros são paulatinamente sobrepostos às imagens sincronizadas de uma fogueira, atestando o conflito cotidiano latente nas telas às quais estamos constantemente conectados.