Chamada.jpg
A ARTIMANHA
Eduardo Cunha tentou favorecer o Banco Nacional
apresentando emendas de contrabando às Medidas Provisórias

O deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ) conta as horas para a eleição deste domingo 3 que pode lhe garantir a liderança do partido na Câmara. No Palácio do Planalto, porém, a possibilidade de que o peemedebista conquiste mais poder é vista com temor. O motivo é que nos últimos três anos Cunha trabalhou de forma persistente para tentar viabilizar uma operação financeira que provocaria um rombo de mais de R$ 33 bilhões nos cofres públicos. A armadilha, conduzida longe das vistas do cidadão comum e de boa parte de seus colegas de Congresso, previa a quitação da bilionária dívida dos acionistas do Banco Nacional, extinto em 1995, com títulos podres, sem liquidez e de securitização incerta. Com a manobra, o banco passaria de devedor confesso à confortável condição de credor da União. Tudo isso à base da caneta de Cunha, que teria plantado emendas de contrabando – aquelas que são feitas sem discussão prévia dos parlamentares – em medidas provisórias.

Por duas vezes, a presidenta Dilma Rousseff vetou os artigos das MPs para impedir a operação. As primeiras articulações começaram em 2009, quando Eduardo Cunha passou a defender a ampliação da Lei do Refis Tributário para instituições bancárias liquidadas. O alvo seriam os bancos resgatados pelo Proer (Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional) na década de 1990, especificamente o Banco Nacional. Cunha fez consultas ao Palácio do Planalto, sem sucesso. Propôs então uma emenda abrangente, instituindo o programa de parcelamento para devedores de autarquias e fundações. O texto foi inserido na Medida Provisória 472 pelo relator, o senador Romero Jucá (PMDB/RR), depois aprovado no Congresso e sancionado pelo Executivo.

Com a expectativa de descontos de até 45% sobre os encargos da dívida, a nova Lei 12.249 beneficiou milhares de contribuintes. Os bancos do Proer também aproveitaram a oportunidade para renegociar seus débitos com o Banco Central. A dívida chegava a R$ 64,5 bilhões, dos quais R$ 31,8 bilhões cabiam ao Banco Nacional. Para o governo, receber parte da dívida era melhor do que nada. O Nacional, porém, pleiteou desconto maior do que o previsto na lei e ainda ofereceu para quitação créditos emitidos contra o Fundo de Compensações de Variações Salariais (FCVS) – títulos incertos, ilíquidos e inexigíveis.

Para avançar no pleito do Banco Nacional, contudo, não bastava a Medida Provisória. Era preciso uma portaria da Advocacia-Geral da União. Foi assim que o deputado teria levado um texto para o próprio ministro Luis Inácio Adams, em que a União reconhecia os FCVS como instrumentos da dívida pública federal. Na audiência, também estava presente o ex-presidente e acionista majoritário do Nacional Marcos Catão de Magalhães Pinto. Adams discordou da portaria e consultou o procurador-geral do Banco Central, Isaac Sidney Menezes. Ouviu uma opinião igual à sua. Na quinta-feira 31, Cunha negou à ISTOÉ o teor dessa reunião. Disse que só esteve com Adams para discutir emendas propostas pela própria AGU. O advogado-geral da União apresentou outra versão: “Fizemos o trabalho de avaliar e ouvir os argumentos do deputado. Mas a solução não era viável juridicamente e não atendia ao interesse da Administração”, disse Adams à ISTOÉ. Quando confrontado com a declaração de Adams, Cunha afirmou: “Isso é provavelmente um erro de interpretação dele. Participei de um debate. Nunca sugeri nada.”

Em 2011, em nova medida provisória, apareceu uma emenda que repetia a mesma proposta feita à AGU. O Congresso aprovou a MP, mas, alertada por Adams e Isaac, Dilma vetou. Nas razões do veto, a presidenta afirmou que aquela emenda atropelava o procedimento de securitização dos créditos de FCVS, indispensável para torná-los “líquidos, certos e exigíveis”. E alertava sobre o dano aos cofres públicos. “A proposta favorece os devedores em detrimento da Administração Pública ao considerar o valor de face das dívidas do FCVS.”

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

Derrotado pela segunda vez, Eduardo Cunha teria feito nova e derradeira investida. Um ano depois, inseriu outra emenda de contrabando numa terceira MP (561/2012), convertida na Lei 12.693. A abordagem, agora, era diferente. Em vez de empurrar créditos da União para o banco, tentava-se liberar o Nacional da exigência de regularidade fiscal, passo fundamental para dar início ao processo de novação, ou validação, dos FCVS. Uma espécie de carona no benefício oferecido a empresas, cooperativas e produtores rurais de municípios atingidos por desastres naturais. Dilma, novamente, vetou a iniciativa.

Na semana passada, depois de falar com a reportagem de ISTOÉ, Cunha enviou nota atribuindo a denúncia a adversários. “Toda essa invencionice maldosa e irresponsável tem um único intuito: tentar constranger-me diante da opinião pública, simplesmente porque sou candidato para o cargo de líder do meu partido na Câmara”, escreveu.

1.jpg

Fotos: Breno Fortes/CB/D.A Press; FERNANDO BIZERRA JR./efe


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias