Muito do que se escreveu na literatura sobre adultério vale para quase todas as espécies animais, do percevejo ao leão, passando pelos sapos. A frase que melhor se encaixa nessa situação foi dita por ninguém menos que o dramaturgo Nelson Rodrigues. Para o escritor, era melhor trair do que ser traído. Na prática, a mesma lógica vale para os animais. De todas as espécies pesquisadas, menos de um terço delas mantém hábito monogâmico.

Fêmeas de chimpanzés, por exemplo, copulam entre 500 e mil vezes, com diferentes machos, antes de cada gravidez. Outro tipo de macaco, os bonobos, são conhecidos pela promiscuidade: em média, machos e fêmeas copulam uma dúzia de vezes todos os dias. Há aqueles que buscam formas criativas de prevenir a pulada de cerca. É o caso do inseto Abedus herberti, que procura saciar a fêmea para que ela não o abandone. Seu recorde foi fazer sexo 100 vezes em menos de 36 horas. O tempo máximo de uma relação sexual pertence a outro inseto, o Necroscia sparaxes, que chegou a ficar 79 dias sobre a parceira.

O mais recente estudo científico sobre os motivos da traição foi publicado na revista inglesa Nature. Interessados em explicar por que alguns pássaros traem mais do que outros, cientistas do centro alemão de pesquisa Max Planck de Ornitologia, liderados por Bart Kempenaers, analisaram as aves conhecidas no Brasil como maçarico-das-rochas e tarambola. A descoberta foi surpreendente: os casais com grau de parentesco próximo tendiam a se reproduzir com aves de outros ninhos. Partindo do princípio de que os filhos de pais com genes parecidos têm mais chances de nascer com doença hereditária, se especula que os pássaros reconheceriam o parentesco e buscariam parceiros com genes diferentes, para que a prole tivesse mais chance de vingar.

O comportamento animal intriga os pesquisadores, e muitas explicações já foram propostas para resolver o mistério. A explicação mais frequente está na própria biologia. Na tentativa de passar seus genes adiante, a maioria dos animais procuraria transar com frequência, para deixar o maior número de descendentes. Há ainda outros motivos para pular a cerca. “Para a fêmea, ter mais de um macho pode ser importante porque assim ambos arrumam alimento para suas crias”, explica o estudioso americano David Barash, autor do livro The myth of monogamy (O mito da monogamia), em que tenta explicar as razões para a traição animal.

Quase nenhuma espécie escapa desse mal. Nem os pássaros, que até os anos 60 eram considerados um modelo de monogamia. Estima-se que só um décimo deles seja fiel a seus parceiros. Entre os mamíferos, a situação é mais grave. “Parece que a monogamia ocorre só em um punhado de casos”, diz Barash. Na última estimativa, somente cerca de 3% tinham parceiros fixos, entre algumas espécies de morcegos, antílopes e raposas.

Será que é possível usar a mesma base biológica para explicar o comportamento humano? “Não podemos ser ingênuos ao acreditar que, só porque algo ocorre entre animais, o mesmo se passa entre humanos”, comenta Barash. Seres humanos, indica o pesquisador, não são guiados apenas pela biologia. Seu comportamento social muitas vezes fala mais alto. “Mesmo assim, não podemos abandonar o lado biológico por completo. Afinal, também somos animais”, lembra o autor.

Outra pesquisa inusitada, publicada em agosto na revista americana Science, revirou a vida dos leões africanos para descobrir quais eram os indivíduos mais populares, já que os “reis da selva” são conhecidos por sua intensa atividade sexual. As leoas chegam a transar alguns milhares de vezes antes de engravidar. No estudo, ao que tudo indica, as jubas podem ser um indício do desempenho sexual. Depois de analisar o comportamento leonino nos últimos 24 anos, o americano Peyton West chegou a uma conclusão surpreendente. Quanto mais negras e longas as jubas, mais fêmeas os leões conseguiam abocanhar. A cor das jubas indicaria um maior grau do hormônio masculino, a testosterona, e isso os tornaria “garanhões” em potencial.

Para avançar na sua pesquisa, West espalhou pela savana da Tanzânia bonecos de leões com juba negra e analisou a recepção que eles tinham. As fêmeas eram naturalmente atraídas pelos morenos, deixando de lado os companheiros de jubas claras e curtas. No entanto, a relação parou por aí. Os animais surpreendem os cientistas quando se trata de sexo, mas ainda não se deixam enganar por falsos parceiros.