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NOVO VOCABULÁRIO
O estudioso ministro Garibaldi Alves:
"Agora argumento com cálculos atuariais"

Todo ministro que assume uma vaga na Esplanada passa por uma espécie de sabatina desde a primeira reunião com a presença da presidenta Dilma Rousseff. Os auxiliares sabem: a chefe é durona e não gosta de papo-furado. Para ter certeza de que os ministros estão se dedicando à gestão das pastas, Dilma costuma submeter seus escolhidos a testes, como se aplicasse uma prova escolar. Muitas vezes na frente dos colegas. Se o ministro responde e demonstra domínio do assunto, ganha salvo-conduto até o surgimento de outra dúvida sobre a administração da pasta. Mas se vacila, gagueja e não demonstra segurança sobre as informações de seu ministério, passa a ser cobrado cada vez com mais rigor. Há casos até de ameaças de demissão. Ciente disso, nos últimos dois anos, alguns ministros passaram a se esforçar mais para evitar broncas. Fazem serão e trabalham até nos fins de semana, ralando para permanecer no cargo. É o caso principalmente do ministro da Previdência, Garibaldi Alves. Depois de ser alvo de uma série de esculachos públicos, ele iniciou um supletivo para conseguir gabaritar as provas da presidenta. “Presidenta, eu quero apresentar uma ideia para um novo projeto”, tentava o ministro. “De onde você vai tirar o dinheiro?”, devolvia Dilma. “Podemos resolver o problema com uma estratégia alternativa”, arriscava Garibaldi, para logo ser rebatido pela presidenta: “Não vamos brincar à beira do precipício.” Diante de um muro intransponível para argumentos políticos, o ministro da Previdência reparou que os amantes das planilhas de Excel “apanhavam” menos. Convocou, então, um corpo técnico para auxiliá-lo nos estudos. Dedicou de 12 a 15 horas por dia para destrinchar gráficos.

O teste de fogo foi no início deste ano, quando o Congresso discutia a criação do fundo que vai custear a previdência complementar dos servidores públicos, o Funpresp. O governo queria se livrar dos custos dos benefícios especiais e transferir para as receitas do fundo as despesas com as aposentadorias para mulheres, professores e policiais, que se aposentam com menos tempo de contribuição. O ministro da Previdência relatou a Dilma que os parlamentares rejeitariam o texto do governo. “Desse jeito não passa, presidenta”, tentou. “Não interessa”, ela respondeu ríspida. “Conversei com as bancadas, estão dispostos a aprovar rápido, com a ressalva das aposentadorias especiais. Desse jeito não passa, eles vão votar com a emenda”, continuou Garibaldi, com seu jeito manso. “Eu veto!”, disse Dilma, encerrando a conversa e levantando-se da cadeira de modo a deixar claro que o ministro deveria sair do gabinete.

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OUTROS TEMPOS
Dilma Rousseff não confiava nos argumentos
técnicos do ministro Garibaldi Alves

Garibaldi saiu perdido da sala, perguntando-se o que fazer para convencer a presidenta. Só com números, concluiu. A semana de trabalho foi longa. Chamou seu melhor especialista, o secretário de Políticas de Previdência Complementar da pasta, Jaime Mariz, e viraram noites trabalhando. Elaboraram relatórios para provar a Dilma que o governo não sairia perdendo e se cedesse um pouco terminaria o ano com o Funpresp aprovado. Bem ensaiado, Garibaldi foi para a sessão de convencimento. Disse que tinha números para apresentar e ela começou com uma sabatina digna de estudos avançados de economia. Ao perceber que o ministro tinha os dados na ponta da língua, deu o aval para negociar com o Congresso. No Planalto, os “cortes” são vistos como um bom presságio. “Argumentei com cálculos atuariais. Olha como eu estou dominando a linguagem”, brinca Garibaldi.

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O ministro, antes de se tornar um estudioso dos números de sua pasta, era alvo das constantes reclamações de Dilma. Durante a campanha presidencial, o projeto de ampliação do número de agências do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) estava na lista de promessas de Dilma. A presidenta não estava satisfeita com a lentidão das obras e reclamou. Pressionado, Garibaldi teve que apresentar relatório mostrando que o problema do projeto estava nas políticas do Ministério do Planejamento e não na sua pasta. Não convenceu. Logo quando assumiu a pasta, o senador desagradou à presidenta ao dizer que estava recebendo um abacaxi. Na primeira reunião com Dilma recebeu do ex-ministro da Casa Civil Antônio Palocci o pedido de manter o secretário-executivo Carlos Eduardo Gabas em sua equipe. “Eu disse a ele: olha Gabas, sei que você está aqui para me vigiar, mas eu contratei outros dois para lhe vigiar.” Agora, Garibaldi garante que Gabas é seu maior aliado e está empenhado em implantar na Esplanada um sistema de monitoramento online semelhante ao das agências do INSS. “Agora, ele não tem mais tempo para me vigiar. Não precisa mais”, brinca o ministro. Depois de ganhar alguns elogios da presidenta, ele não tem medo de afirmar que o ministério ainda é um abacaxi. “Mas eu posso dizer que o descasquei um pouco.”

Foto: Adriano Machado/Ag. Istoé; Iano Andrade/CB