A primeira decisão de Adriana Calcanhotto em relação ao seu novo álbum Cantada era fazer um trabalho “muito, muito simples”. Por simples não se entenda apenas a exclusão de orquestra, de participações estelares ou de arranjos de grife. Adriana queria um CD sem sobras, gorduras, muitos acordes ou solos longos. Pode-se dizer que a gaúcha conseguiu seu intento. Cantada é um disco de concepção linear, mas não comum. Tem muitos recursos eletrônicos, mas também privilegia o lado acústico com violão e cellos, estes tocados por Moreno Veloso, filho de Caetano, que ainda pilota outros instrumentos e agrega seu grupo Moreno + 2 à turma comandada pela cantora e pelo ex-baixista do Barão Vermelho, Dé Palmeira.

Programa é a faixa de abertura, assinada por Adriana, Antonio Cicero e Waly Salomão, que há tempos acrescenta e encampa as idéias da cantora. Trata-se de uma letra carioquíssima nas suas metáforas de violência e droga, acompanhada de melodia que mescla a frieza eletrônica com a erudição pop de cellos e o balanço de violão. Pelos ares, também assinada pela cantora e Cicero, que é irmão de Marina Lima, segue o mesmo caminho. A diferença é o tom latino do acordeão de Chico Chagas em contraposição à massa percussiva das máquinas. Calor, propriadamente, envolve a quentura de guitarras, violão e guitarra portuguesa, que ajudam a imprimir doçura à letra cheia de banzo.

A mulher barbada, também de Adriana, é a melhor canção do disco.Tem uma surpreendente participação dos integrantes da banda Los Hermanos, que dão uma boa sustentação musical e ainda conseguem uma sonoridade moderna à esquecida escaleta, instrumento de sopro, com teclas, muito usado na época da jovem guarda. No bilhete à imprensa, Adriana Calcanhotto deseja que seus prazeres e alegrias estejam impressos e audíveis neste CD. Estão.