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Dois lobbies muito poderosos estão travando uma guerra silenciosa nos gabinetes de Brasília. Os fabricantes de aço pressionam o governo federal a adotar barreiras contra a importação, mas encontraram um adversário de peso pela frente: as montadoras.

As siderúrgicas sofreram um importante revés. No fim de setembro, a administração Dilma Rousseff negou um pedido da CSN, apoiado por Usiminas e Arcelor Mittal, para adotar uma tarifa antidumping contra a importação de aço revestido, o mais utilizado por fabricantes de veículos e eletrodomésticos, vindo, principalmente, da China.

Em 144 páginas de parecer, o mais longo da sua história, o Departamento de Defesa Comercial (Decom), do Ministério do Desenvolvimento, concluiu que ocorreu um surto de importações de aço com dumping (a preços abaixo dos praticados no mercado de origem) mas que isso não provocou dano para as siderúrgicas nacionais.

Em manifestações no processo, a Volkswagen afirmou que a imposição de medida antidumping neste caso seria "catastrófica" para a indústria automobilística nacional. A Renault informou que o mercado brasileiro "é um dos mais caros do mundo para adquirir aço".

A CSN, presidida pelo empresário Benjamin Steinbruch, foi surpreendida com a decisão e, conforme fontes ouvidas pelo Estado, vai fazer de tudo para reverter o resultado. A empresa entrou com um recurso, que está sendo analisado pelo ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel.

Também colocou seus executivos em campo para convencer as autoridades, principalmente no Ministério da Fazenda, da necessidade de proteger esse mercado. O setor vai tentar incluir o aço revestido na nova lista de aumentos de tarifa de importação que vem sendo preparada pelo governo para proteger a indústria nacional.

"Sob condições normais, o Brasil não precisa de aço importado. Só queremos isonomia. Estamos percorrendo todos os secretários do governo para explicar isso", diz uma fonte do setor siderúrgico. "Não podemos interferir diretamente num processo antidumping, mas vamos reagir se o aço for incluído em alguma lista de exceção", diz uma fonte de uma montadora.

Está em jogo um mercado estimado em mais de R$ 4 bilhões por ano, que são as vendas de aço laminado plano revestido. Esse tipo de aço recebe um revestimento de zinco, pode ser vendido até pré pintado e, entre outras funções, é utilizado para fabricar carros e eletrodomésticos, como geladeiras.

O aço revestido custa hoje entre 15% e 20% mais caro que o tradicional. É, portanto, o produto que as siderúrgicas mais querem vender. Mas é também a principal matéria-prima de empresas poderosas.

No processo antidumping, aparecem como importadoras as montadoras Fiat, Ford, Volks e Renault, além de empresas de outros setores como Electrolux e Samsung. Embora estejam brigando para manter as tarifas de importação estáveis, as montadoras compram um volume pequeno de aço revestido fora do País. Essas empresas optam pelo produto local, porque precisam do aço em depósitos próximos de suas fábricas. A questão é que o valor do aço importado funciona como referência no Brasil. As tarifas de importação, portanto, interferem diretamente nas negociações de preço entre siderúrgicas e montadoras.

Frustração

Segundo fontes do mercado, a CSN ficou muito frustrada com o resultado negativo do caso antidumping, porque contraria o discurso protecionista do governo Dilma. A empresa gastou cerca de R$ 300 mil no processo, que demorou 17 meses para ser concluído.

Foram cinco países investigados (Austrália, China, Coreia do Sul, Índia e México) e os técnicos do Decom visitaram as siderúrgicas brasileiras e as concorrentes no exterior. "Os técnicos do Decom estiveram nas fábricas e viram as linhas de produção paradas. Se isso não é dano, não sei o que é", diz uma fonte.

O órgão encontrou um aumento expressivo das importações no período investigado, cuja participação no consumo do País saltou de apenas 4,5% em 2006 pra 36,6% em 2010. Também encontrou margens de dumping que variavam de US$ 77 a US$ 412 por tonelada.

Mas, na avaliação do Decom, as importações não estavam provocando dano para as siderúrgicas, cujos resultados melhoraram no período. O lucro operacional das empresas cresceu 51,9% entre 2006 e 2010. Em seu recurso, a CSN argumenta que os dados estão distorcidos por acontecimentos excepcionais, como a explosão de um alto-forno em 2006.

"Não adianta uma margem de dumping elevada se falta o dano. Os indicadores mostram uma recuperação do setor no período", disse Felipe Hees, diretor do Decom. "Nenhuma empresa montaria um processo desse se não se sentisse prejudicada pelas importações", afirma Marco Polo de Mello Lopes, presidente executivo do Instituto Aço Brasil. Procuradas, CSN, Arcelor e Usiminas não deram entrevista. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.