Quem não quer ter uma boa colocação no mercado de trabalho, receber bem pelo que faz e ter perspectivas concretas de progressão na carreira? Anos atrás, essa equação soaria como um sonho no Brasil. Mas, com a expansão econômica na última década, descortinou-se uma realidade na qual há oportunidades abundantes para quem estiver atento às movimentações provocadas pelo crescimento da economia. A prova disso está em uma pesquisa realizada pela Manpower Group, agência internacional de recrutamento que, anualmente, realiza um levantamento global sobre a escassez de talentos. Na edição 2012, realizada em 41 países, um dado chama a atenção: o Brasil é o segundo no ranking das nações onde os empresários têm mais dificuldade para contratar. Em primeiro vem o Japão, país que sofre com a falta de jovens para ocupar os postos de trabalho deixados vagos pelos profissionais que se aposentam. “É impressionante a carência de mão de obra no Brasil. Em especial a técnica e a de engenheiros”, avalia Riccardo Barberis, diretor para o Brasil da Manpower Group. O apagão de talentos tem razão de ser: até a década de 1990, o foco eram a recessão e a inflação galopante e, com isso, não sobrou tempo para preparar o País para crescer. Quando os ventos mudaram de direção e o Brasil prosperou, já nos anos 2000, ficou evidente a falta de profissionais preparados para atender a essa demanda.

“Estamos em um processo irreversível. Ainda que o ritmo de crescimento do País desacelere, algumas demandas continuarão a existir devido a essas novas necessidades criadas nos últimos anos”, avalia Antônio Octaviano, da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE). Por isso, o momento é propício, em especial para quem está escolhendo a carreira ou pensando em mudar de profissão. Especialistas ouvidos por ISTOÉ apontam cinco macroáreas com boas perspectivas: tecnologia; infraestrutura, energia e petróleo; entretenimento; envelhecimento; e ciências.

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ONDE ESTÃO OS  ENGENHEIROS?

Apesar de ser a sexta maior economia do mundo, o Brasil ainda está distante de qualquer ideal de infraestrutura para um país de proporções continentais. De acordo com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em torno de R$ 17 bilhões são perdidos pelas empresas com falhas estruturais. Para pôr a casa em ordem, é fundamental ter mais engenheiros, mas hoje eles estão no topo do ranking de escassez de talentos entre carreiras de ensino superior. De acordo com a FNE, 30 mil profissionais se formam por ano no Brasil e seria necessário o dobro. “A área de engenharia ficou latente nos últimos anos, durante o período de depressão econômica, aguardando a recuperação das áreas que encolheram”, avalia Antônio Octaviano, secretário-executivo do Instituto Superior de Inovação e Tecnologia. A instituição, uma iniciativa inédita no País, foi criada pela própria FNE para formar engenheiros de inovação e deve receber seus primeiros 60 alunos no próximo semestre.

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INVESTIMENTO
A engenheira de telecomunicações Flávia, 30 anos, foi para a área de
petróleo graças a um programa de formação oferecido por uma empresa do setor

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Outra área em que a carência de profissionais preocupa é a de petróleo. Isso por uma equação simples: ninguém nunca imaginou que o mineral pudesse ser motor da economia brasileira e, assim, pouco se investiu na formação para a área. Tanto que a graduação em engenharia de petróleo existe apenas em duas instituições, ambas no Rio de Janeiro. Sem ter quem contratar, empresas da área estão treinando, por conta própria, talentos em potencial. Foi o caso de Flávia Ferrari, 30 anos, engenheira sênior na Baker Hughes, empresa especializada em perfuração. “Sou graduada em telecomunicações e trabalhava na área da minha graduação, mas quis mudar de carreira”, diz ela. De acordo com dados da consultoria Michael Page, o salário inicial na área de petróleo é o mais alto entre as engenharias, circulando em torno de R$ 10 mil. Outro profissional escasso no setor são os geólogos. Com cursos em apenas 22 universidades, empregadores costumam ir direto às salas de aula buscar seus funcionários.

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FALTA GESTOR NO  PAÍS DO FUTEBOL

Com dois megaeventos esportivos nos próximos quatro anos, uma área em que se tornou evidente a falta de investimento foi a de gestão esportiva. “Mais de 90% dos profissionais que fazem o planejamento estratégico da Copa e da Olimpíada são estrangeiros”, observa Paulo Henrique Azevedo, coordenador do Laboratório de Pesquisa sobre Gestão do Esporte da Universidade de Brasília. No país do futebol, onde 0,2% do PIB nacional vem desse esporte, só agora os times começam a se preocupar em gerir suas marcas, mina de ouro descoberta em outros países. O Barcelona, por exemplo, apesar de ter passado em branco na última temporada, teve a maior arrecadação da sua história, com uma receita de R$ 1,21 bilhão – o Corinthians, clube brasileiro com maior faturamento, recebeu, no último ano, R$ 290,4 milhões. “Administrar bem o time não serve só para torná-lo vencedor, mas também para não ter dívidas”, explica Tatiana Lara Fabrício, 28 anos, coordenadora de marketing esportivo do Uniceub, time brasiliense de destaque no basquete brasileiro. Tatiana se formou em administração esportiva nos Estados Unidos, fez mestrado na Espanha, trabalhou para grandes marcas esportivas, como Nike e Barcelona, e agora está de volta ao Brasil. “Acredito que o mercado vai melhorar no País”, diz. O otimismo no setor é generalizado, tanto que a Fundação Getulio Vargas (FGV), em parceria com a Fifa, iniciou, neste ano, a primeira turma de pós-graduação em gestão, marketing e direito no esporte.

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APOSTA
A gestora de esportes Tatiana, 28, fez graduação e mestrado
no Exterior. De volta, aposta no futuro da carreira no Brasil

Outra área que deve receber impulso com os megaeventos é a de turismo. No último ano, foi registrado um aumento de 18,3% no faturamento das empresas do setor em relação a 2010, mas há ainda muito o que crescer. No último ranking divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, em 2011, o Brasil ocupou a 52ª posição entre os 139 avaliados. “Além dos problemas de acesso, como a precariedade de rodovias e de aeroportos, o padrão de serviço oferecido no País ainda é muito ruim e faltam profissionais desde a parte operacional até a de gestão”, diz Marcelo Cuellar, headhunter da Michael Page.]

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TECNOLOGIA EM EXPANSÃO, EMPREGO CERTO

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CONCORRIDO
Formado em ciência da computação, Ricardo, 30 anos, foi trabalhar com
arquitetura de sistemas depois de uma pós-graduação e seu salário subiu 60%

Nem a crise econômica mundial nem a desaceleração da economia brasileira no primeiro semestre parecem ser obstáculos para o mercado de tecnologia da informação. Especialistas preveem que o crescimento do setor siga acima de dois dígitos, com projeções entre 10% e 13% para os próximos anos. Dentro da área de tecnologia, de acordo com Oscar Hipólito, diretor da Laureate Brasil, dona de uma rede internacional de universidades, duas características do mercado brasileiro devem ser levadas em consideração: a popularização dos smartphones e o gosto do brasileiro por redes sociais. Hipólito baseia sua opinião na pesquisa que a rede internacional de universidades realizou no País para definir os cursos nos quais irá investir. “Haverá grande demanda por carreiras que atendam ao acesso às novas mídias e à administração das redes sociais”, afirma ele. Outra aposta é o setor de games. “Deixou de ser coisa de criança. Basta reparar no saguão de aeroporto e verá vários executivos jogando em seus smartphones”, diz.

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FOCO
Uma profissão na qual tivesse emprego garantido era o desejo
de Rafaela, 22 anos, que fez o curso de oficial de náutica


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Brasileiros que se destacaram no mercado de tecnologia e informação já existem, a maior parte deles trabalhando fora do País. Basta lembrar que o Facebook, com Eduardo Saverin, e o Instagram, com Mike Krieger, tinham profissionais do Brasil entre seus criadores. Quem escolhe a formação não se arrepende. O arquiteto de sistemas Ricardo Narzochi, 30 anos, formou-se em ciência da computação e resolveu seguir uma área promissora dentro de TI, a engenharia de software, e fez três anos de pós-graduação depois de formado. “Aumentei meu salário em 60% após o curso”, diz Narzochi, que trabalha para a Gol Linhas Aéreas. “O mercado está aquecido. Temos muitas ofertas de trabalho aqui dentro e também empresas americanas e europeias que vêm buscar profissionais no Brasil.”

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O BOLSO E A SAÚDE DOS APOSENTADOS

Em 1960, o percentual de idosos no total da população brasileira era de 2,7%. No último censo, divulgado neste ano, a proporção aumentou para 7,4%. Com previsão de crescimento contínuo dessa faixa etária, a Organização Mundial da Saúde prevê que em 2025 o Brasil seja o sexto país do mundo em número de pessoas idosas. E o aumento não é apenas no percentual que eles representam, mas também na expectativa de vida. De 1960 para 2010, os brasileiros passaram a viver 25,4 anos a mais – hoje a esperança de vida é de 73,4 anos e a tendência é continuar aumentando. “Profissionais que entendam de aposentadoria e possam ajudar a pessoa a escolher o melhor investimento serão muito requisitados nesse cenário”, analisa Carlos Honorato, do Programa de Estudos do Futuro, da Fundação Instituto de Administração.

Além da previdência, a área de saúde também deve se beneficiar do aumento de idosos. “Já falta profissional na área de gerontologia (que trata do envelhecimento em suas dimensões biológica, psicológica e social) e a tendência da população brasileira é continuar envelhecendo, ou seja, a situação irá se agravar”, observa Ângelo José Gonçalves Bós, presidente da regional Rio Grande do Sul da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia e professor do Instituto de Geriatria e Gerontologia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) gaúcha. Hoje, apenas 21 hospitais brasileiros possuem residência em geriatria. “Ainda temos pouca cultura de os pacientes com mais de 65 anos realizarem uma avaliação com o especialista”, diz a médica geriatra Adriane Schneider, 35 anos. Graduada em fevereiro, a médica tem buscado crescer no mercado investindo nas visitas domiciliares. “É um filão interessante, pois, para o idoso, ir até uma clínica pode, muitas vezes, significar um processo complicado de deslocamento”, avalia.

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A VEZ DA CIÊNCIA

Nunca houve tanta preocupação no Brasil em formar cientistas. Prova disso é o envio de 101 mil estudantes brasileiros para universidades estrangeiras até 2015 pelo programa federal Ciência sem Fronteira. Em paralelo a esse avanço, foi anunciada, em março, a criação da Bionovis, primeira indústria nacional especializada na fabricação de medicamentos biológicos (desenvolvidos a partir de células vivas). A farmacêutica está de olho em um lucrativo mercado, potencializado pelo fim da patente de sete medicamentos destinados ao tratamento de doenças complexas, como cânceres e artrite reumatoide. Hoje, todos esses fármacos vêm de fora. “Vamos começar a contratar em breve, mas ainda não existe no Brasil profissional com formação para trabalhar com essa área”, diz o presidente da Bionovis, Odair Finotti. Por isso, junto à criação da indústria, será construído um instituto para qualificar a mão de obra.

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FUTURO
O farmacêutico Wendel, 31 anos, resolveu investir na área de biotecnologia

Hoje, a maioria dos que atuam na área, no Brasil, vem de outros cursos, como farmácia e biologia. São menos de 30 as universidades que ofertam a graduação em biotecnologia no País. “Fiz curso de farmácia e depois, no mestrado, é que me aproximei da área de biotecnologia”, diz Wendel de Oliveira, 31 anos, diretor-executivo da Editec, empresa dedicada à produção de alimentos livres de um aminoácido chamado fenilalanina, usado para a alimentação de crianças com uma rara sensibilidade a essa substância. Oliveira e seus sócios também preveem para os próximos anos a primeira fábrica brasileira do produto, hoje importado do Exterior. “Tive muitas propostas para trabalhar com pesquisa e desenvolvimento na indústria farmacêutica, mas resolvi ser empreendedor”, conta. Projetos como o de Oliveira e da Bionovis devem se tornar comuns nos próximos anos. “A biotecnologia deixou de ser uma ciência maluca para se tornar parte da vida das pessoas”, avalia Eduardo Emrich, diretor-presidente da Biominas, rede que financia o projeto de Oliveira.

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Fotos: Masao Goto Filho / Ag. IstoÉ; Adriano Machado; Kelsen Fernandes; Rodrigo Castro; Victor Schwaner/Odin


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