Poluição, favelas, trânsito pesado. Mazelas típicas dos grandes centros urbanos se alastraram rapidamente pelas cidades históricas brasileiras.
A mineira Ouro Preto, principal sede do ciclo do ouro brasileiro
e uma das mais importantes guardiãs da arte barroca,
é um exemplo dessa descaracterização. A situação é tão grave que a cidade, que em 1980 recebeu o título de Patrimônio Cultural da Humanidade da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), corre
o risco de entrar para a lista dos patrimônios ameaçados. Ainda sem
data definida, uma missão da Unesco deve visitar Ouro Preto para
avaliar o grau de destruição do conjunto arquitetônico e urbanístico colonial. Caso as recomendações não sejam atendidas em um ano,
a antiga Vila Rica pode entrar na lista dos bens culturais a perigo.
O único patrimônio nacional que integrou essa lista foi o Parque
Nacionaldo Iguaçu. Entre 1999 e 2001, ele esteve ameaçado pela construção de uma estrada que, posteriormente, foi fechada.

Além de Iguaçu, os outros patrimônios naturais do Brasil são
o Parque Nacional Serra da Capivara, no Piauí; a Costa do Descobrimento, no sul da Bahia e no norte do Espírito Santo;
e as reservas de Mata Atlântica do Sudeste, um caso histórico
do que o descuido e a ação predatória podem causar. Atualmente,
só sobraram 7% da cobertura vegetal na região.

Não é só Ouro Preto que possui o título da Unesco. Esse também é o caso dos centros históricos de Olinda, em Pernambuco; de Salvador, na Bahia; de Goiás, em Goiânia; de São Luís, no Maranhão; das mineiras Diamantina e Congonhas; do Plano Piloto, em Brasília; e das ruínas jesuítico-guaranis de São Miguel das Missões, no Rio Grande do Sul. Todas essas cidades, segundo a Unesco, sofrem de um mal comum.
“Elas mantêm bem seus monumentos, mas apresentam problemas
de gestão. A origem está na confusão de responsabilidades entre as esferas federal, estadual e municipal e órgãos como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)”, avalia Jurema Machado, coordenadora da Unesco no Brasil. A solução, segundo ela, está no casamento harmônico entre gestão governamental e proteção.

Uma iniciativa nesse sentido foi tomada em Ouro Preto, que recebe
cerca de 150 mil turistas ao ano. A cidade criou um comitê para
analisar as dificuldades que vive. Fazem parte desse comitê o Iphan,
a prefeitura, a Universidade Federal de Ouro Preto, o Instituto Estadual de Preservação do Patrimônio Histórico, o Instituto Estadual de Florestas, a Associação Comercial e a de Moradores. O principal
problema da cidade é a falta de planejamento urbano, que inclui
a ocupação desordenada do entorno, a precária infra-estrutura,
com destaque para o saneamento e o tráfego, afirma Sérgio
Abrahão, superintendente regional do Iphan de Minas Gerais.

O trânsito é um dos principais temas em discussão, principalmente
depois de um acidente no início de novembro, quando um caminhão
de bebidas perdeu o freio e destruiu o chafariz da matriz de Nossa Senhora do Pilar, construído no século XVIII. Segundo diagnóstico
da Tectran – empresa responsável por estudar o trânsito da cidade –,
o tráfego pesado provoca rachaduras nos casarios e ameaça construções históricas, como a igreja de São Francisco de Assis,
de 1770, considerada a obra-prima de Manoel da Costa Athaíde e de Aleijadinho, que, além de ser o autor do projeto, também esculpiu
o relevo da portada, os dois púlpitos e o lavabo da sacristia.

“A cidade é muito particular pelo tipo de pavimento, ladeiras, sinuosidade e vias estreitas. O tráfego de caminhões é mais intenso do que ela suporta”, diz Silvestre Andrade Puty Filho, representante da Tectran. A empresa tem algumas propostas para solucionar o problema: reduzir o estacionamento na praça Tiradentes, incentivar o uso do anel viário e proibir a circulação de veículos em algumas ruas.

Sujeira e ocupação irregular são outro problema de Ouro Preto.
As encostas dos morros foram ocupadas por casas erguidas de
forma precária e ilegal. Muitas delas correm o risco de desabar
sobre igrejas de valor incalculável, como Nossa Senhora dos
Pardos de Padre Faria e Nossa Senhora do Rosário dos Pretos.