A última investida do jornalista, compositor e agora autor Nelson Motta na gênese da cultura brasileira resulta em frustração. O livro O canto da sereia – um noir baiano (Objetiva, 264 págs., R$ 32,90) se cerca de fartas referências à religiosidade dos terreiros de candomblé da Bahia para construir
uma trama policial em que uma musa
dos trios elétricos, sucesso da música pop nacional, é assassinada. Mas
não sensibiliza pela história, insossa
e sem ritmo. Nem pelo apelo supostamente noir da cultura negra
que aflora naquele Estado. Produtor artístico que já revelou talentos do calibre de Marisa Monte e autor
de best sellers, como Noites tropicais, que o credencia como expert
em MPB, Motta centra a ficção justamente no ambiente da música, chegando a construir perfis interessantes dos seres que gravitam na indústria musical que ele tão bem conhece. A sensação, no entanto,
é comparável a comer um acarajé sem vatapá e camarão.

Tudo se desenrola a partir do assassinato de uma cantora de grande sucesso, Sereia, mistura de Carla Perez (loura boazuda) com Xuxa (sucesso nacional próximo à unanimidade) e Daniela Mercury (estrela de carnavais). Com a morte dela, entra em cena sua empresária homossexual, sua guia espiritual Mãe Marina e o pessoal da publicidade, como Tuta Tavares, cujo ídolo é Nizan Guanaes. Aliás, Motta brinca de inserir artistas verdadeiros na ficção. Estão lá Bia Lessa, Carlinhos Brown, Gilberto Gil, Ivete Sangalo, etc. O detetive que conduz a trama chama-se Augustão (!) e tem “paixão por flagrante de adultério”, mas ganha a vida seguindo o rastro de trambiqueiros e escrevendo reportagens nem sempre verdadeiras para um jornaleco local. Adora cerveja, maconha e mulheres.

Voz do livro, Augustão (!) produz alguns momentos de humor e literatura aprazível, mas não em dose suficiente para garantir pujança à história, enfraquecida pela falta de suspense e pelo desaquecimento gradual sobre a identidade do assassino, até chegar a um desfecho zerado, digamos assim. Totalmente o oposto do que acontece nas boas tramas do gênero.