Omar, o amor romântico e os rompantes idealistas são a matéria-prima mais
cara ao escritor japonês Yukio Mishima (1925-1970). Opositor feroz ao processo de modernização do Japão pós-guerra, que sempre considerou como traição
às tradições ancestrais, Mishima faz
da ode ao homem simples o grande
tema de sua obra. Neste Mar inquieto (Companhia das Letras, 164 págs.,
R$ 26), escrito em 1954, não é
diferente. A história do puro e ingênuo pescador Shinji e da delicada Hatsue,
filha do homem mais abastado de uma ilha isolada das mudanças
do resto do país, comove o coração mais empedernido.

Como de hábito, Mishima localiza seus personagens em uma paisagem bucólica, que apenas de raspão toca a realidade do Japão em via de modernização. Na ilha de Utajima, não há nenhuma das novidades
que chegam do outro lado do mar. Cinema e transporte urbano são
ecos de histórias contadas à luz difusa da lua pelos que ousam
cruzar as águas por qualquer motivo. A única realidade palpável
para aquela singela comunidade de pescadores é o dia-a-dia do
polvo arrancado das profundezas, do pargo oferecido com fervor
às divindades e os atos de heroísmo que o mar força os homens
a cometer como moeda de troca pela própria sobrevivência.

Eles, homens e mulheres, são heróis, sim, mas nem o reconhecem
direito. Apenas se comportam no padrão. Fazem “a coisa certa”
que o momento exige. E assim vão levando a vida, à luz de lampiões
que compensa o sempre defeituoso gerador de eletricidade – ironia
fina de que Mishima lança mão para lembrar que o que é novo,
estranho, sempre falha. O que importa não quebra nem falha.
É a essência do Japão que nunca se rendeu.