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ÊXTASE
Zanetti exibe sua medalha dourada tática do elemento
surpresa e preparação psicológica diária

Assim que o locutor oficial da espetacular arena North Greenwich anunciou o ginasta paulista Arthur Nabarrete Zanetti, 22 anos, como o novo campeão olímpico, ouviu-se um longo “Ohhhhhhhhhh!” varrendo as arquibancadas. Afinal, até as argolas suspensas a 2,55 metros do chão pareciam saber que o chinês Yibing Chen, dono de oito títulos mundiais e que faturou três medalhas de ouro em Pequim-2008, ganharia a prova. Todos tinham certeza da vitória de Chen, ídolo na China, menos meia dúzia de pessoas: Zanetti, seu técnico Marcos Gotto e a entourage da ginástica masculina do Brasil. “Acabou, cara!”, disse Gotto, entre lágrimas, no momento em que Zanetti foi abraçá-lo. Sim, tinha acabado o pesadelo do fracasso que assombrava a ginástica brasileira e começava ali uma nova era desse esporte no Brasil. “Faltava uma medalha para quebrar a barreira e acabar com essa história de que nós não vencemos”, disse Zanetti à ISTOÉ, num tom de voz tão baixo que mal dava para escutá-lo. “E ganhar de um favorito é sempre melhor, dá mais peso para o que você fez.”

Embora evitasse o tom revanchista, a delegação da ginástica brasileira estava mordida em Londres. Primeiro, a queda de Diego Hypólito, depois o fiasco das meninas e por fim as declarações do próprio Yibing Chen, que disse que encerraria a carreira olímpica com a medalha de ouro, foram os combustíveis que injetaram ânimo no talento de Zanetti. “Sei o que o Diego passou e ganhei essa medalha por ele também”, afirma o novo rei das argolas. Mas não foi só isso. Dois fatores se revelaram decisivos para a conquista: o elemento surpresa e a preparação psicológica. Zanetti foi medalha de prata, também nas argolas, no mundial de Tóquio, em 2011, mas o que pouca gente sabia é que ele tinha escondido o jogo durante o torneio. “Deixamos nossa nova rotina de movimentos para a Olimpíada”, diz o técnico Gotto. Em sua primeira exibição em Londres, na fase classificatória, o brasileiro também não apresentou os seus melhores exercícios. “Sabíamos que, se o Zanetti repetisse certinho o que fazia nos treinos, teria chance de ouro”, afirma Gotto.

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ÁLBUM

Da esq. para a dir., o boletim escolar, estripulias na árvore,
no começo das aulas de ginástica e já um pouco mais velho

Zanetti teve que se apresentar pouco tempo depois da enxurrada de críticas que caíram sobre a ginástica. O verbo “amarelar”, que os atletas abominam, foi usado largamente, o que irritou a chefe da delegação brasileira, Berenice Arruda. Zanetti sabia que, se perdesse, a ladainha da “tremedeira” voltaria com força. “Eu estava muito forte psicologicamente.” Ele atribui o equilíbrio mental à psicóloga Maria Cristina Miguel, contratada pela confederação, que o acompanhou em Londres. Nesse aspecto, o paulista tem um diferencial em relação a outros atletas. “Já ouvi o pessoal por aí dizer que acha um saco falar com o psicólogo, mas eu gosto”, diz o ginasta. Discutir o que passa na cabeça da gente ajuda muito.”

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O jeito simples ele herdou da família de classe média de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo. Se Zanetti abrir um espacate – o que o faz ocupar um espaço de 1,82 metro – no quarto que divide com o irmão Victor, três anos mais velho, não vai ter espaço para mais ninguém. O cômodo do sobrado dos pais é muito pequeno. Nele, estão um beliche de ferro, onde os irmãos dormem desde a infância, um guarda-roupa, uma mesa, uma prancha de surfe, uma tevê, medalhas, credenciais e um mural de fotos. Zanetti nasceu em São Caetano do Sul, mas cresceu no sobrado que fica em uma rua sem saída de São Bernardo. O garoto, cujo apelido é Tutu, sempre foi vigiado de perto. Na rua estão o comércio de sucata do tio, Sérgio Nabarrete, e a oficina de usinagem do pai, Archimedes Zanetti. O tio lembra que, certa vez, “o Tutu conseguiu a proeza de ser expulso duas vezes de uma mesma festinha na casa de uma vizinha porque não dava sossego às pessoas”. No Colégio Metodista, onde o ginasta estudou entre 1995 e 2002, as professoras não desgrudavam o olho do aluno. “Ele não parava de virar cambalhota na escada”, diz Kelly Toscano, coordenadora da educação infantil. Archimedes, o pai do ginasta, explicou à ISTOÉ que ele jamais abriu mão de investir na educação e na saúde dos filhos. “Sempre pagamos colégio e um plano de saúde aos meninos”, diz.

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MESTRES
Acima, Cláudia, a primeira treinadora, já da Serc Santa Maria, e Sérgio dos Santos,
o professor de educação física que indicou aos pais de Zanetti a ginástica olímpica

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O caçula dos Zanetti não repetiu nenhum ano, mas brilhava mesmo nas aulas de educação física. Justamente em uma dessas aulas, ministradas pelo professor Sérgio Oliveira dos Santos, é que o potencial do garoto como ginasta foi descoberto. “Arthur era baixo, ágil e tinha o tronco forte”, lembra o professor. Ele foi responsável pela matrícula da criança nas aulas de ginástica da Serc Santa Maria, em São Caetano. O garoto tinha só 7 anos e era a avó Neide Thomazzo, hoje com 74 anos, que o levava aos treinos. “Arthur servia como minha cobaia para eu mostrar como queria que os movimentos fossem feitos”, diz Cláudia Cobo, primeira treinadora do ginasta. A família Zanetti é atuante no clube de São Caetano do Sul. A mãe é presidente da associação de sócios e o pai constrói aparelhos educativos usados nas aulas – chegou a fazer um cavalo com alça e argolas para o filho. Não foi fácil a trajetória rumo ao topo. Na Serc, muita coisa funciona no improviso. Além da falta de estrutura, Zanetti sofreu com a pressão por ser um atleta de alto nível. Em 2005, teve uma crise de estresse e ameaçou abandonar o esporte. “O Arthur disse que não queria mais treinar e ficou longe daqui por um mês”, lembra Marcelo Araújo, auxiliar-técnico de Groto. “Ele retornou, contratamos uma psicóloga e, desde então, tudo mudou.” Sorte da ginástica brasileira.

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