Imagine 250 piscinas olímpicas cheias. Agora troque a água límpida por óleo combustível e despeje toda essa quantidade no mar da Galícia, na costa noroeste da Espanha. Isso poderá dar a dimensão de uma das maiores catástrofes ambientais já registradas no mundo, caso os tanques do petroleiro Prestige venham de fato a se romperem, como prevêem os especialistas, despejando sua carga de 77 mil toneladas no oceano Atlântico.

O petroleiro afundou na terça-feira 19, depois de se partir em dois.
Até a quinta-feira 21, o vazamento do navio já era de dez mil
toneladas. Os derradeiros dias do Prestige, um navio de propriedade
da empresa grega Universe Maritime, com bandeira das Bahamas, provocou muita tensão entre os ambientalistas. “Se o óleo vazar,
será um desastre com efeitos mais graves que os provocados pelo naufrágio do Exxon Valdez” (leia quadro na pág. ao lado), avaliou um
dos diretores do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), Christopher Hails. O desastre também causou um impasse diplomático entre o governo da Espanha e de Portugal, numa ferrenha troca de acusações sobre a responsabilidade pela limpeza do acidente. A mancha de
óleo já cobre mais de 295 quilômetros da costa espanhola, ameaça
o ecossistema e afeta a economia pesqueira da região.

Os problemas começaram na quarta 13, quando o petroleiro
de 26 anos sucumbiu às intempéries climáticas e à má conservação, sofrendo um rombo de dez metros de diâmetro em seu casco, abaixo
da linha de flutuação. Cerca de cinco mil toneladas de óleo
vazaram, enquanto o navio era rebocado para alto-mar.

O petroleiro fora contratado por uma empresa russa e transportava
o óleo combustível da Letônia para Cingapura. Logo após ter sido
partido ao meio, mais cinco mil toneladas vazaram do Prestige, aumentando a mancha negra que atinge pelo menos 90 praias
da costa espanhola. O restante do carregamento, mais de 60 mil toneladas, afundou junto com o navio e há divergências sobre o
que acontecerá com o óleo a 3,5 quilômetros de profundidade. O
impacto do Prestige contra o fundo do mar poderia fazer romper definitivamente os tanques, ou a enorme pressão poderia implodi-los, lançando toda a carga de óleo no oceano. A análise mais otimista
prevê a possibilidade de o óleo ficar retido nos tanques sob a forma
de gel, devido às baixas temperaturas do fundo do mar.

O óleo combustível, resultado do refinamento do petróleo, é mais denso e mais perigoso que o óleo cru; isso, somado à proximidade da costa, transforma o naufrágio do Prestige num desastre ecológico grave. As primeiras estimativas sobre o custo de limpeza da área mencionam mais de 42 milhões de euros. Desde o acidente, Espanha e Portugal trocaram acusações na tentativa de se eximirem de responsabilidades maiores, o que acabou fazendo com que o petroleiro fosse rebocado para longe do continente, mesmo com a possibilidade de o navio não suportar o reboque. Entidades ambientalistas, como o Greenpeace, criticaram essa decisão, pois consideram que o esforço inicial deveria ter sido na tentativa de bombear o óleo do Prestige para outro navio.

O impacto do acidente na Galícia,
que depende da pesca, é grande.
Mais de 150 quilômetros de costa
já foram interditados, paralisando
uma indústria que empregava indiretamente 28 mil pessoas. A
União Européia liberou 117 milhões
de euros como auxílio para pescadores da região. Apesar dos esforços para limpar as áreas afetadas, até 40%
da fauna marítima da região corre o risco de desaparecer. O óleo combustível é espesso e, além de não evaporar, tende a se encorpar. Os moluscos que vivem no fundo do mar não conseguem se alimentar. Os mamíferos marinhos e os peixes podem apresentar disfunções neurológicas, e as aves perdem sua capacidade de flutuação. Nas áreas mais suscetíveis à ação da maré, não menos de dois anos deverão ser necessários para que o ecossistema comece a se recompor. Nas áreas mais abrigadas, o tempo pode ser ainda maior.

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Risco mundial

Um dos piores desastres ecológicos causados por vazamento
de petróleo aconteceu em 1989, quando o petroleiro americano
Exxon Valdez encalhou no canal do Príncipe William, no Alasca.
A colisão causou o vazamento de cerca de 35 mil toneladas de petróleo cru, por volta da metade do que o Prestige transportava.
O resultado do vazamento para a fauna do Alasca foi devastador.
De acordo com estimativas, 250 mil aves marinhas, além de outras espécies, como lontras e salmões, morreram. Mesmo depois de
13 anos do acidente, a recuperação da fauna ainda é parcial. Segundo pesquisadores da Universidade da Califórnia, o número
de lontras ainda é metade do que era antes do vazamento.
A Exxon, gigante multinacional do petróleo, foi condenada
a pagar nada menos que US$ 5 bilhões em indenizações.

Em 1999, o petroleiro maltês Erika afundou no nordeste da
França, lançando ao mar 11 mil toneladas de combustível.
Depois desse acidente ecológico, a União Européia criou novas
leis de segurança marítima, como a exigência do casco duplo
para petroleiros, que ainda não foram implementadas.

O Brasil também sofreu recentemente com vazamento de combustível, só que em menores proporções. Em janeiro de 2000, um oleoduto de 13 quilômetros que ligava a refinaria de Duque de Caxias (Reduc) ao terminal de abastecimento de navios de Ilha D’Água, no Rio de Janeiro, se rompeu e cerca de mil toneladas de óleo afetaram a Baía de Guanabara. Em outubro de 2001, o navio Norma, da Petrobras, encalhou perto do porto de Paranaguá e cerca de quatro milhões de litros de nafta, outro derivado do petróleo, vazaram do tanque.


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