Europeus, asiáticos e americanos se rendem cada vez mais às curvas brasileiras. Esqueça a sedução neste caso. Os olhares de admiração se voltam à beleza conquistada com a ajuda dos nossos cirurgiões plásticos. Os estrangeiros estão buscando as clínicas do País atrás do famoso toque verde- amarelo. O prestígio não é exclusividade de Ivo Pitanguy, referência mundial em cirurgia plástica. Prova disso é a visita da multimilionária Athina Onassis a uma clínica de São Paulo. Podendo pagar qualquer especialista do planeta, ela fez uma lipoaspiração na capital paulista. O sucesso dos médicos entre os gringos já gerou uma brincadeira. “O Brasil é conhecido pelo Carnaval, futebol e cirurgia plástica”, conta Liacyr Ribeiro, cirurgião do Rio de Janeiro, que foi elevado à categoria de mago pelas
pacientes italianas que atende na capital fluminense, em Roma
e Nápoles. Ribeiro viaja quatro vezes por ano para a Itália. Mas
todos os meses recebe visitantes.

Como Ribeiro, outros cirurgiões vivem em aviões, com um pé aqui e outro em terras estrangeiras. É o caso, por exemplo, do gaúcho Marco Aurélio Faria Correa, único cirurgião plástico não nativo a operar em Cingapura, para onde vai cinco vezes por ano. Eles fazem a alegria dos interessados em afinar a cintura, aumentar os seios, rejuvenescer o rosto e engrossar as coxas e o bumbum. Muitos se inspiram na beleza dos corpos exibidos nas praias e no Carnaval. E assim os médicos se popularizam no Exterior e atraem clientes internacionais para suas clínicas no Brasil. Não há estimativas a respeito desse fenômeno. O que os especialistas asseguram é que esse público vem crescendo. No Rio, por exemplo, funcionários poliglotas são indispensáveis nos consultórios. O baiano Volney Pitombo, muito conhecido pelos narizes impecáveis que constrói, recebe de quatro a seis pacientes de fora do Brasil por mês. Paulo Müller, darling das cariocas, contabiliza três européias por mês em sua agenda. Para Müller, o interesse dos gringos tem origem na tradição da plástica brasileira conquistada por Pitanguy, de quem já foi assistente. “Ele abriu caminho para todos nós”, sublinha.

Essa fama se mantém por diversos motivos. O primeiro é a qualidade da cirurgia. Para o gaúcho Carlos Uebel, sócio de uma clínica em Berlim, uma explicação é a forma como é feita a especialização. “Os residentes operam pacientes. Na Alemanha, por exemplo, as cirurgias não são permitidas nessa fase. Treinamos mais”, diz. Por ser o segundo país no ranking das cirurgias, atrás dos EUA, o Brasil permite que nossos profissionais exercitem bastante suas habilidades com o bisturi e aprimorem técnicas. A excelência é comprovada pelo baixo índice de maus resultados, inferior a 3%, semelhante ao americano. “Como trabalhamos muito na área, nos aperfeiçoamos”, completa Uebel.

É verdade que os americanos são fortes na plástica facial. “Como a população americana em geral tem a pele mais clara, o envelhecimento é precoce. Por isso, se aperfeiçoaram em rosto”, explica o cirurgião João Carlos Sampaio Góes, reconhecido internacionalmente pela experiência em cirurgia de mama. Em relação ao corpo, no entanto, os brasileiros se sobressaem. “Cultuamos a beleza dos contornos. Por isso, o trabalho se aprimorou”, diz o cirurgião gaúcho Rubem Lang. Outra vantagem de nossos médicos é a habilidade. Ou o que os especialistas chamam de jeitinho brasileiro. “A cirurgia plástica é 20% tecnológica e 80% artesanal. O americano domina máquinas, mas não tem a mão do brasileiro”, analisa Liacyr Ribeiro. O presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Luiz Carlos Garcia, confirma. “As técnicas que usamos são as mesmas de outros países. O que nos difere é a sensibilidade estética, o toque”, diz.

Não é simples confete. O reconhecimento do talento brasileiro é feito por médicos de outras áreas. “Estrangeiros vêm ao Brasil para se especializar”, diz o presidente da Associação Médica Brasileira, Eleuses Paiva. O americano Sherrell Aston, tido como o maior cirurgião plástico de face no planeta, avaliza. “Pessoas do mundo inteiro viajam para os EUA e para o Brasil em busca dos procedimentos mais sofisticados”, declarou
a ISTOÉ.

O jeitinho brasileiro pode ser traduzido também como versatilidade. Segundo Garcia, os médicos têm criatividade para adaptar métodos. “Cada paciente necessita de um enfoque. Também usamos muita arte”, resume o paulista Juarez Avelar, inventor da cirurgia de reconstrução de orelha. Além disso, os brasileiros se esmeram em deixar cicatrizes menos visíveis. “As cicatrizes estão mais finas e é possível disfarçar suas cores”, explica o cirurgião mineiro Sebastião Guerra.

Outros fatores atraem os gringos: o tratamento caloroso dado aos pacientes, o preço e a oportunidade de viajar pelo País. Para Paulo Müller, o carinho é uma marca dos especialistas latino-americanos. Os clientes se sentem mais confortáveis e confiantes no resultado. Em relação ao custo, as operações saem mais em conta para os estrangeiros. Os preços aqui são cerca de três vezes menores do que no Exterior. E mesmo quando há tratamento especial, o valor ainda é bom. O médico Guerra criou um atendimento diferenciado para os estrangeiros (30% de sua clientela). Por e-mail, o médico envia retoques virtuais em fotos dos pacientes,
que o procuram por indicações de amigos. Também é acertado um programa que dá direito a carro, motorista bilíngue, convênio com hotel ou com locadora de automóvel. “Fica quase US$ 1 mil mais caro, mas
o conforto compensa”, diz. E sobra até dinheiro para o turismo.
Muitos aproveitam para passear.

É claro que o Brasil também abriga profissionais não tão qualificados. Tornou-se comum, por exemplo, que médicos de outras especialidades migrem para a cirurgia plástica, atraídos pelo rico e crescente mercado
da estética, sem o devido preparo. É por isso que a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica está se esforçando para ajudar a população a separar o joio do trigo. Neste final de semana, ela lançou uma campanha nacional para incentivar os interessados a procurar a entidade como forma de garantir o atendimento correto e feito por um especialista. Para que o médico receba o título de cirurgião plástico é preciso que ele faça residência de dois anos em cirurgia geral e outros três em cirurgia plástica. Cumprido esse processo, o profissional passa por um exame na SBCP. Se a pessoa estiver disposta a se submeter ao bisturi, pode pedir indicação a um amigo que tenha feito uma cirurgia com bom resultado e checar se o médico é integrante da entidade. Basta acessar o site da sociedade (www.cirurgiaplastica.org.br). Outra dica é solicitar uma sugestão ao médico de confiança. É uma maneira de assegurar bons resultados.

Polêmica turbinada
Nesta semana, acontece em São Paulo o IV Simpósio Internacional de Cirurgia Plástica. Um dos principais temas será a segurança das próteses de silicone, já acusadas de contribuírem para o surgimento de doenças inflamatórias e auto-imunes. Um estudo americano, a ser apresentado no evento, assegura que as próteses não causam malefícios. Mas não faltam argumentos contra o silicone. Outro trabalho, de cientistas holandeses, sugere uma forte relação entre mulheres que colocam silicone e problemas psicológicos. Elas apelariam para o produto porque supostamente teriam problemas de auto-estima. Após avaliar 3.521 pacientes, os pesquisadores detectaram um número significativo de suicídios entre as participantes. Com certeza, a discussão sobre o uso do silicone ainda promete próximos capítulos.

Vitrine viva

Brasileiras retocadas pela cirurgia plástica inspiram muita gente, inclusive os estrangeiros

Carla Perez
“Não tenho do que reclamar. Fiz plástica no nariz e coloquei silicone porque tinha seios pequenos. Adorei. Não teria problemas em fazer uma lipo, mas não precisei disso”
   

Vera Fischer
“Aprovei a cirurgia de pálpebra que fiz. Ficou ótimo.” A atriz também fez implantes de silicone nos seios, lipo nos quadris, coxas, cintura e culote
 

Luma de Oliveira
“O cirurgião que me operou ouve o que o paciente tem a dizer. Depois de amamentar dois filhos, meu seio tinha diminuído de volume. Levei uma foto anterior às gestações para mostrar como eu era. Gostei muito do resultado”

 

O mestre
Referência mundial em cirurgia plástica, Ivo Pitanguy comemora os 40 anos de sua clínica, no Rio, e critica a preocupação excessiva com o corpo

Celina Côrtes

Quando se fala em cirurgia plástica, o primeiríssimo nome que vem à cabeça é o de Ivo Pitanguy. Colecionador de medalhas e condecorações, o médico é referência mundial na sua especialidade. Em outubro, ele comemora os 40 anos da Clínica Ivo Pitanguy, em Botafogo, zona sul do Rio de Janeiro. Com 14 quartos, a clínica é a única do mundo que reúne a prática à pesquisa e formação de profissionais, na pós-graduação vinculada à Pontifícia Universidade Católica e ao Hospital Carlos Chagas. Já passaram pelo curso 400 alunos, que multiplicam conhecimentos por todo o Brasil. A clínica já recebeu mais de 60 mil pacientes, sem falar na 38ª Enfermaria da Santa Casa de Misericórdia, onde o médico já operou gratuitamente mais de 43 mil pessoas. Assinou mais de 800 trabalhos científicos, além de livros, que o credenciaram à cadeira 22 da Academia Brasileira de Letras. É membro das mais importantes sociedades e associações médicas do Brasil e do mundo. Atende a nata do high society nacional e internacional e a quem não tem um tostão. “Tenho clientela de todas as classes sociais e me orgulho disso”, conta o cirurgião, por cujas mãos já passaram beldades do porte de Sophia Loren, Gina Lollobrigida e Gal Costa.

O cirurgião plástico é tão mineiro que não conversa no elevador. Reúne características tão incompatíveis quanto a vaidade e a simplicidade. Sua gentileza beira a sedução. Aos 76 anos, atende até seis pacientes por dia em julho e agosto, período de pique. Quando falou a ISTOÉ, Pitanguy chegava de duas conferências na França. Com agenda lotada até o fim do ano, o médico fala com o mesmo prazer da atividade profissional e das assíduas viagens. Sua bagagem cultural é visível nos corredores da clínica, que ostentam obras de Antonio Dias, Ivan Serpa e até Salvador Dali, todas presenteadas durante os 11 anos em que presidiu o Museu de Arte Moderna do Rio. Embora vá menos do que gostaria à paradisíaca Ilha
dos Porcos Grande, em Angra dos Reis, onde mantém um minizôo,
não perde o vínculo com seus encantos. “Da próxima vez, vamos
falar de bichos”, propõe.

ISTOÉ – O Brasil está entre os principais centros
de excelência do mundo ou são nossos preços acessíveis
que atraem a clientela internacional?
Ivo Pitanguy –
Nunca fiz comparações. Mas o certo é que ajudamos a criar a maior escola do mundo em cirurgia plástica. Os americanos são muito bons em cirurgia reparadora e fracos na estética. Quando comecei no Rio, há 40 anos, não tinha com quem aprender. Hoje ensinamos em nosso curso tanto cirurgia reparadora quanto estética. Muitos de nossos discípulos criaram escolas pelo País, o que permite que tenhamos mais gente preparada e menos charlatães. A estética reparadora pressupõe uma filosofia, a do bem-estar do ser humano consigo mesmo. Nossos médicos compreendem bem esse princípio.

ISTOÉ – Qual é a média de clientes estrangeiros
que o senhor recebe?
Pitanguy –
Recebo muitos, mas não são a maioria da clientela.

ISTOÉ – No fim dos anos 60 o senhor operou muito na Itália,
e nas décadas de 70 e 80, na Suíça e na Alemanha. Isso o ajudou
a ganhar fama mundial?
Pitanguy –
Como meus filhos estudavam na Suíça, aproveitei para operar bastante em Sion, capital da região do Vallais. Viajava para lá duas vezes ao ano, com duas enfermeiras, um residente e meus instrumentos. Nessa época também operei no Irã, Jordânia, Marrocos, China, Estados Unidos e Austrália. Mas minha referência sempre foi minha clínica, onde criei condições ideais que não encontro em outro lugar. O que me traz muitos estrangeiros são as conferências no Exterior.

ISTOÉ – Quais as marcas do ensino aos futuros profissionais?
Pitanguy
– Em 1981, lancei na Alemanha o livro Cirurgia plástica estética de cabeça e corpo, onde estão relacionados o que chamo de princípios básicos. Por exemplo: é impensável a operação de mama sem que a oncologia seja verificada. Outro é o sigilo do nome dos clientes. Já operei tanta gente importante que seria ridículo nessa fase da vida citar nomes. Outro fator fundamental é a busca da naturalidade. Dar um aspecto à pessoa para que ela não pareça operada.

ISTOÉ – O Instituto Ivo Pitanguy deverá funcionar como uma espécie de garantia à continuidade de sua obra?
Pitanguy
– O Centro de Estudos, que gere a pós-graduação e a 38ª enfermaria da Santa Casa, vai virar instituto. Mas a idéia de continuidade está nas pessoas que formei. Temos a maior associação de ex-alunos do mundo, gente de 40 países, que tem vida própria e fazem seus congressos. Enquanto eu tiver saúde, continuo trabalhando, embora já esteja tentando tirar o pé do acelerador. Trabalho mais do que deveria.

ISTOÉ – A vaidade da mulher brasileira contribuiu para
o desenvolvimento da cirurgia plástica no País? Essa
vaidade tem se excedido?
Pitanguy –
Os brasileiros se expõem mais, são mais soltos. A permanente exigência de exibir o corpo na praia ajudou muito o desenvolvimento dessa filosofia do estar bem com a auto-imagem. Mas hoje há uma preocupação excessiva com o corpo. Cuidar da estética é saudável, mas não se pode deixar de lado o desenvolvimento espiritual. Esse imediatismo faz com que as pessoas fiquem muito pobres de espírito.

ISTOÉ – Aos 76 anos, o senhor mantém a forma profissional e física. Qual o segredo? Pensa em fazer plástica?
Pitanguy –
Tenho uma estrutura física de atleta. Aos 13 anos,
atravessei a Baía de Guanabara a nado. Fui campeão de natação dos
11 aos 16 anos e também de tênis, na adolescência. Fiz caratê, pratico caça submarina e esqui na neve. Levanto às 7h e passeio 20 minutos com meus cachorros. Depois faço alongamento na beira da piscina
e nado. Às vezes jogo tênis com meu filho. Faço uma permanente reciclagem na pós-graduação e nas conferências. Estar sempre viajando me enriquece muito culturalmente. Já pensei em fazer plástica, mas
ainda vou esperar. Quem tem o ego condescendente como eu
não sente pressa (risos).