Criado por D. João VI em 1808 para aclimatar as especiarias trazidas das Índias Orientais, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro é considerado um centro de referência na proteção de espécies brasileiras e em pesquisas na área de botânica. Com um acervo de 35 mil plantas vivas, 360 mil plantas desidratadas, seis mil frutos secos, sete mil amostras de madeira, e um moderno centro de pesquisa, o parque desenvolveu, em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o Banco de DNA de Espécies da Flora Brasileira, o primeiro  da América Latina. O objetivo é conservar e estudar as espécies
nativas da flora brasileira, dando maior ênfase às espécies raras ou ameaçadas de extinção, e desenvolver remédios a partir de substâncias encontradas nas plantas. “Começamos pela coleta do DNA de uma palmeira imperial, pois ela é o cartão-postal do parque. Depois foi a vez do pau-brasil, por sua importância histórica”, conta Luciana Franco, doutora em biologia molecular.

Hoje o banco genético possui 50 espécies de plantas da Mata Atlântica, de restingas, da Amazônia e de outros ecossistemas ameaçados. “Pretendemos catalogar os genes das plantas do Jardim Botânico e daquelas que representem a flora de um determinado período do País”, explica a pesquisadora. Entre as espécies já catalogadas estão a Hydrogaster trinervis, mais conhecida como barriga-d’água. A espécie foi descrita a partir de uma amostra transportada do Espírito Santo e plantada no Jardim Botânico por um pesquisador brasileiro. A Tibouchina, a popular quaresmeira, é uma planta típica do clima tropical e abundante em todo o País. Como está presente na Mata Atlântica, deve entrar em breve no banco de DNA. “Damos prioridade às espécies que correm maior risco de desaparecer”, alerta a bióloga.

A Heliconia rauliniana, conhecida como caetê-papagaio, é típica da Venezuela, mas
foi catalogada no Brasil. “Qualquer pessoa que queira estudar o caetê no mundo vai precisar buscar informações no parque carioca, onde se encontra a matriz que serviu para o estudo e o registro da planta”, explica o biólogo Claudio Fraga.

A vitória-régia (Victoria amazonica), outra riqueza brasileira ameaçada que vive exclusivamente nos rios da Amazônia, será uma das próximas a ter o DNA desvendado. Suas folhas verdes flutuam acompanhadas de flores brancas reluzentes. Ao contrário do que se pensa, o caule fica preso no fundo dos rios para não deixar a planta boiar sem destino. A parte inferior das folhas é coberta por espinhos pontiagudos para evitar que os peixes se alimentem desta beleza natural. Outra peculiaridade da vitória-régia, que ora tem o formato de um coração, ora de uma fôrma gigante de pizza, são os drenos em suas folhas, que escoam a chuva, evitando o acúmulo de água que poderia
causar a morte da planta.

Hieróglifos – Algumas espécies de bromélias como a Vriesia hieroglyphica e a Vriesia fosteriana também fazem parte do grupo de risco de extinção. Os desenhos sobre as folhas das vriesias se assemelham aos hieróglifos egípcios e serviram de fonte de inspiração para sua denominação. “A bromélia é uma planta muito usada em decoração e sua venda indiscriminada pode condená-la ao desaparecimento”, alerta Fraga.

As orquídeas são consideradas a família mais evoluída do reino vegetal por conta das variações na cor de suas folhas de formatos curiosos. São mais de 20 mil espécies no planeta. Só no Brasil estão cerca de duas mil delas. A maior parte das orquídeas apresenta o velame, um tecido esbranquiçado e esponjoso que reveste suas raízes e é o responsável pela rápida absorção de nutrientes, permitindo que as espécies vivam em locais áridos como galhos, rochas ou na areia. A Laelia crispa é uma orquídea nativa das serras cariocas e também está na fila para ser catalogada no banco de DNA. Encontrada em algumas restingas do Rio, a Cattleya forbesii é uma orquídea lilás de flor minúscula que igualmente está condenada a desaparecer.

O processo de extração de DNA das plantas passa por três etapas. Depois de realizar a coleta das amostras, as folhas são desidratadas. Em seguida, é preciso esmigalhar a planta até ela virar pó, num processo conhecido como maceração. Por fim, adiciona-se água e armazena-se a solução num freezer a 80º C negativos.

Para a bióloga Luciana Franco, o banco genético é um sonho realizado. Além da possibilidade de troca científica entre jardins botânicos que possuem centros de pesquisa como os de Kew (Inglaterra) e do Missouri (EUA), um objetivo mais futurista – e ainda distante – povoa o pensamento dos pesquisadores brasileiros. “Não podemos clonar espécies vegetais, pelo menos por enquanto. O futuro é incerto, mas há alguns anos pensava-se que era impossível clonar um ser humano e isso já é uma realidade. Quem sabe se o banco de DNA não será responsável pelo salvamento de espécies ameaçadas?”, sonha Luciana.