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NAS ALTURAS
Obra na subestação de energia de Ibicoara,
na Bahia: medidas estimulam investimentos

Enquanto Alemanha e França discutem se a melhor forma de combater a crise na Europa é a austeridade ou o crescimento, no Brasil esse debate foi vencido há muito tempo. Desde 2008, a equipe econômica fez sua escolha. Em vez de pôr o pé no freio e apertar o cinto como os europeus, o País abre mão de impostos, aumenta os investimentos e turbina o consumo. A receita tem dado certo e voltou a ser acionada na semana passada, quando o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou um pacote de R$ 2,7 bilhões em incentivos voltados para o setor automotivo e de bens de capital. O governo reduziu de 7% para zero a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para carros 1.0 e conseguiu das montadoras o compromisso de baixar o preço da tabela de automóveis em até 10%. Também ficou acertado com os bancos privados o aumento no volume de crédito e no número de prestações. “Vamos garantir o crescimento econômico num momento de crise internacional”, diz Mantega. “Se ainda faltarem recursos, o governo tomará novas medidas.”

O pacote nasceu depois de uma série de reuniões, algumas secretas, entre o ministro Guido Mantega, o secretário-executivo, Nelson Barbosa, e representantes da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave). O pedido da indústria era um só: redução do IPI para desencalhar os 360 mil veículos, um estoque de 43 dias, quando o normal seria entre 30 e 35 dias, e assim evitar férias coletivas. Mantega acenou com medidas, desde que o setor privado desse sua contrapartida. E foi exatamente o que aconteceu. As montadoras aceitaram oferecer descontos sobre o preço de tabela após o corte do IPI. A Ford, por exemplo, anunciou uma redução de 2,5%, e os bancos concordaram em baixar o valor da entrada e as exigências na contratação do crédito. “A renda mínima necessária para um financiamento também vai cair, porque a prestação agora pode ficar mais baixa”, diz Décio Carbonari, presidente do banco Volkswagen.

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"Vamos garantir o crescimento econômico
num momento de crise internacional"

Guido Mantega, ministro da Fazenda

O governo calcula que a ação terá resultados rápidos sobre o estoque da indústria, com reflexo no crescimento do PIB. Afinal, a medida é bem mais ampla do que a desoneração do IPI. O Banco Central vai liberar R$ 18 bilhões em depósitos compulsórios – recursos que os bancos são obrigados a deixar no Banco Central – como crédito direcionado para o financiamento de automóveis e de veículos leves. Nos cálculos do BC, até 22 de junho haverá pelo menos R$ 9 bilhões a mais para empréstimos no mercado. E o BNDES voltou a alterar, em menos de um mês, as condições de financiamento do Programa de Sustentação do Investimento (PSI). Os juros da linha voltada para ônibus e caminhões caíram de 7,7% para 5,5% e o prazo de financiamento do programa Procaminhonheiro passou de oito para dez anos. Ao socorrer a indústria automobilística, a Fazenda quer garantir a previsão de R$ 40 bilhões de investimentos das montadoras até 2015 e a geração de cerca de 1,5 milhão de empregos diretos e indiretos. Detalhe importante: a cadeia de produção do setor automotivo responde por mais de 20% do PIB industrial.

A resposta ao pacote foi rápida. Na semana passada, concessionárias anunciaram a expectativa de aumento de 40% nas vendas. Os consumidores devem ser atraídos não apenas pela redução dos preços, mas também pela acirrada concorrência entre os bancos. Na média, oferecem-se juros de 0,99% para quem der 30% de entrada e parcelar a dívida em três anos. Se o comprador pagar 50% de entrada, os juros são zero – uma enorme facilidade diante das taxas que, até alguns dias atrás, eram de 1,47%. Alguns economistas apostam que os juros dos carros usados, atualmente em 1,8%, cairão para 1,25% em pouco tempo. Além de atender à demanda do setor automotivo, a preocupação maior do governo é com o crescimento da economia. A anunciada redução do IOF de 2,5% para 1,5% nos financiamentos para as pessoas físicas tem o poder de beneficiar outros produtos. O ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, lembra que, em abril, o Planalto desonerou a folha de pagamento de 15 setores. “O governo conjugou medidas estruturais, como a redução sistemática da taxa de juros, com medidas conjunturais, como a redução a zero do IPI”, diz Pimentel. Essa é a mesma visão do economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn: “Nossa percepção é de retomada da economia e ela tem a ver com os novos estímulos.”

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"O governo conjugou medidas estruturais, como o corte de
juros, com medidas conjunturais, como a redução do IPI"

Fernando Pimentel, ministro do Desenvolvimento

A redução do IPI para o setor automotivo será válida até 31 de agosto. Os próximos três meses serão suficientes para que as medidas de incentivo ao crescimento adotadas desde o fim de 2011 surtam efeito concreto, como é o caso da redução progressiva da Selic. Dentro da equipe econômica impera a certeza de que a economia vai se recuperar no segundo semestre deste ano. Num levantamento ainda inédito feito pelo Ministério da Fazenda com 100 dos principais analistas financeiros, 65% consideram que o segundo semestre será melhor do que o mesmo período de 2011, 30% acreditam num cenário estável e apenas 5% veem possibilidades de piora. Com o sétimo pacote para estimular o crescimento desde a crise de 2008, o governo mostra que tem instrumentos para fazer valer a opinião da maioria. O PIB tem tudo para ficar acima da média mundial, de 2,5%. “Neste contexto global, a retomada certamente é mais difícil”, diz o presidente do BNDES, Luciano Coutinho. “Mas isso não significa que o Brasil não terá capacidade de enfrentar a atual conjuntura.”

O pacote, porém, não gerou unanimidade. Alguns especialistas argumentam que, em 2008, havia demanda reprimida por bens duráveis, mas hoje as famílias estão altamente endividadas e a inadimplência aumentou. Na avaliação da economista e sócia da Galanto Consultoria, Mônica Baumgarten de Bolle, o estoque da dívida dos consumidores ainda é baixo. Equivale a apenas 22% do PIB e um estudo recente do BIS (o Banco de Compensações Internacionais) mostra que a dívida das famílias só passa a afetar o crescimento quando supera 85% do PIB. “O que é alto no Brasil, mas sempre foi, é a dívida em proporção da renda. Mas com a queda dos juros haverá um alívio”, diz a economista. Além disso, a Fazenda avalia novas medidas para reestruturar a dívida dos consumidores.

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